Há 20 anos, quem diria que os restaurantes por quilo e churrascarias serviriam peixe cru no bufê? O que hoje é comum, naquela época seria o cúmulo da excentricidade. A popularização da culinária japonesa, com seus sushis e sashimis, é só um exemplo de como os hábitos alimentares mudam com o tempo, assim como o próprio conceito de comida exótica. “A ideia do que é exótico ou não é muito pautada pelo que é tradicional em uma cultura e até mesmo pelas preferências pessoais”, explica Ricardo Maranhão, professor de História da Gastronomia da Universidade Anhembi Morumbi.
Cada cultura tem uma definição do que é exótico. Um prato com foie gras – uma iguaria francesa bem comum na Europa – pode ser completamente estranho aos orientais. Por outro lado, países como a China ou a Malásia têm costumes alimentares considerados inaceitáveis para muitos ocidentais. “Certamente um brasileiro iria achar exótico ser convidado por um amigo para tomar cerveja e comer espetinhos de gafanhoto. Na China, esse convite seria absolutamente normal”, afirma Flávia Quaresma, chef do Carême Bistrô, no Rio de Janeiro.
Em época de multiculturalização, em que as distâncias são curtas e as tradições se misturam, a tendência é que muitos alimentos exóticos se popularizem. É por isso que, com o tempo, pratos que eram desconhecidos viram moda. É o que acontece principalmente nas grandes cidades. “São Paulo é um exemplo, há restaurantes de todas as partes do mundo. É bem fácil encontrar até mesmo os pratos mais excêntricos. Isso não significa, porém, que essas culinárias deixaram de ser exóticas para muita gente. Tem pessoas que nunca vão experimentar peixe cru”, diz Maranhão.
Descobrimento
Nos dicionários, o significado de exótico está diretamente relacionado à ideia de estrangeiro. “A culinária exótica para um brasileiro deveria ser aquela que vem de fora”, afirma Flávia. Porém, na maioria das vezes, isso não acontece. A dimensão continental do Brasil e as diferenças culturais entre regiões fazem com que produtos nacionais sejam desconhecidos para os próprios brasileiros. “O tucupi do Norte pode ser exótico para um gaúcho, assim como o popular guaiamum do Nordeste pode ser um ilustre desconhecido para um carioca”, diz Flávia.
O chef baiano Beto Pimentel, do restaurante Paraíso Tropical, em Salvador, é conhecido por usar em suas receitas uma grande variedade de frutas do Norte e do Nordeste, a maioria colhida no pomar de seu restaurante. “As comidas regionais não podem ser chamadas de exóticas. É o que acaba acontecendo. O Brasil tem de conhecer melhor o Brasil. Não precisamos procurar o exótico em outros países, o novo está aqui”, diz ele, citando algumas frutas de seu pomar. “Biri-biri, bacumixá, maturi, achachairu, bacuri, atamóia, lichia, abiu, ingá, cambucá, jabuticaba branca, jabuticaba amarela. Que país tem isso?”. Beto usa as frutas em pratos doces e salgados, em geleias, molhos, caldos, vinagretes para saladas ou mesmo na grelha. As combinações rendem sabores desconhecidos que podem ser reproduzidos em casa. Algumas dessas frutas chegam no Sul e Sudeste. No Mercado Municipal de Curitiba, por exemplo, encontra-se umbu, abiu, jambo rosa e cruá, frutas consideradas exóticas pela maioria dos paranaenses. “Se a França fosse aqui, teríamos milhares de receitas de geleias e caldos maravilhosos.”
Misturas ousadas
Não é preciso inventar muito para fazer um prato exótico. Às vezes, combinações de ingredientes comuns podem render receitas inusitadas. “Na cozinha tailandesa, o exótico está em misturar em um mesmo prato o doce, o salgado, o azedo, o picante e o amargo”, diz Yuri Ferrari, chef do Soto Asian Cuisine.
De legumes fortes, como o jiló, os orientais conseguem o amargor. O azedo vem do limão, do tamarindo ou de outras frutas cítricas. A pimenta é essencial para deixar o prato picante. O açúcar e o molho de peixe adoçam e salgam. “Isso gera uma grande riqueza de sabores em um único prato. É possível trazer esses sabores para a nossa cozinha. Não precisamos nos preocupar com ingredientes muito diferentes”, afirma.
Uma ideia é experimentar temperos orientais, as especiarias indianas – açafrão, coentro em pó, cominho, cardamomo – e as pastas de curry tailandesas, feitas com ervas frescas: coentro, hortelã, pimenta, gengibre, alho e cebola. “O tempero é a peça chave. Alguns temperos já têm uma mística, o açafrão é um deles. Essas especiarias podem até ser usadas em doces”, explica Tarciso Lopes, chef do restaurante Cais da Ribeira, do Hotel Pestana Curitiba.
Com os temperos, as sobremesas ficam com um toque de exótico sem que o sabor fique muito diferente. “Estou testando a noz moscada, o anis estrelado e o kummel, uma semente muito usada na culinária germânica. Acho que esses três ingredientes podem render bons doces.”
Carnes exóticas
O hábito da caça é tão antigo quanto a história do homem, então como essas carnes podem ser consideradas exóticas? “Nossos avós caçavam para comer, mas depois a história inverteu e as carnes de caça passaram a ser incomuns ou mesmo proibidas”, diz Alexandre Bressanelli, chef e professor do Curso de Chef de Cuisine e Restaurateur do Centro Europeu.
De dez anos para cá, as carnes exóticas voltaram a se popularizar. Surgiram criadores certificados e a produção nacional aumentou. “Há 15 anos eu só encontrava carne de avestruz ou de javali importada da Nova Zelândia. Outro dia encontrei no supermercado”, afirma Bressanelli. Mesmo estando acessíveis, esses cortes não deixaram de ser incomuns. “Ninguém come avestruz ou javali todos os dias. Para mim, exótico é o que não faz parte do nosso cotidiano, é quando fugimos da rotina. Pato, coelho, jacaré ou mesmo peixes amazônicos, tudo isso é exótico. A boa notícia é que podemos encontrar facilmente.”
Apesar da popularização, poucas pessoas se arriscam a provar, muito menos a preparar em casa. “São carnes muito saborosas e até mais saudáveis do que a carne de boi ou de porco. O único problema é que é preciso saber fazer”, afirma Bressanelli.
Cada corte tem um ponto certo. O avestruz, o pato e o cordeiro precisam ser servidos mal passados. O coelho, a rã, o javali e o jacaré devem ser deixados ao ponto. “Se cozidas demais, qualquer uma das carnes exóticas fica rígida”, explica Andréa Kammers Pleti, chef e proprietária do restaurante Petit Château.
Para temperar, a chef usa uma marinada à base de vinho branco, alho, pimenta, azeite, louro e alguns temperos específicos para cada corte. “O avestruz e o carneiro, como têm um sabor forte, combinam com alecrim e estragão. O javali pode ser marinado com ervas de provence. Já o coelho harmoniza com o sabor do manjericão e da sálvia”, afirma Andréa. Algumas combinações são tradicionais, como o pato com molho de laranja. “O javali e o pato caem muito bem com sabores adocicados. Já o avestruz ou coelho, mais fortes, devem ser servidos com elementos marcantes.”
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Serviço:
Produtos
Porto a Porto, (41) 3018-7393.
As porcelanas das páginas 8 a 10 são da Germer Porcelanas Finas. O catálogo de produtos pode ser consultado no site www.germer.com.br. Informações pelo 0800 414 343.
Restaurantes
Soto Asian Cuisine, (41) 3317-6404.
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Interatividade
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