Bolsonarista ferrenho, o governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), tem expandido relações bilaterais com governos do espectro da direita. Em julho, teve um encontro com o presidente argentino, Javier Milei, durante o CPAC (Conservative Political Action Conference), em Balneário Camboriú. Para setembro e outubro, tem outras agendas internacionais marcadas com o ministro da Economia de Portugal, Pedro Reis, e com o ex-presidente da Espanha José María Aznar, respectivamente.
O governo catarinense tem histórico de política internacional, que culminou, em 2003, com a criação de uma secretaria específica para tratar o assunto, com o objetivo, principalmente, de expandir parceiros comerciais e atrair investimentos para o estado. Com isso, conseguiu abrir mercados asiáticos para a carne suína, atrair a BMW para SC em negociações diretas com a Alemanha e construir os 14 centros de inovação do estado em cooperação com a Espanha.
Agora, os encontros bilaterais de Jorginho Mello com outros líderes estrangeiros buscam não só parcerias, como fazem contraponto à política internacional do governo federal, segundo especialistas. “Santa Catarina tem agenda externa própria”, diz o secretário de Articulação Internacional e Projetos Estratégicos, Paulo Bornhausen, que tomou posse em 4 de julho.
O objetivo dessa política é “aumentar a intensidade das agendas de Santa Catarina com outros países, regiões, estados e cidades, que sejam importante e complementares para o estado no comércio internacional de exportação e importação”, explica o secretário, acrescentando que não é possível “esperar políticas públicas do Brasil quando elas não me favorecem e não estejam no meu plano de desenvolvimento”.
Para Clarissa Franzoi Dri, professora de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o estado passou a representar um lugar de resistência e aglutinação dessa ideologia política. Diz, ainda, que esses encontros “tentam chamar os holofotes internacionais para uma diplomacia subnacional contrária às diretrizes nacionais”.
Esse movimento, explica a professora, não é novidade na história brasileira: teve o Fórum Social Mundial de Porto Alegre em 2001, a diplomacia empresarial de atração de investimentos do estado de São Paulo a partir de 2011 e a compra de vacinas da Covid-19 pelo Consórcio do Nordeste em 2021.
Os olhares se voltaram ainda mais para a diplomacia catarinense com a vinda do presidente da Argentina para o estado no início de julho. A visita foi a primeira de Milei ao Brasil como chefe do Executivo - sendo que até o momento ele não se reuniu com o presidente Lula (PT). Esse encontro bilateral entre Jorginho e Milei vem de “um contexto político ideológico de se manter a força desse crescimento da direita”, contextualiza o professor de Administração Pública e pesquisador da área de Cultura Política da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) Daniel Moraes Pinheiro. Ele ressalta que esse movimento é do “jogo do cenário político”.
As relações internacionais, pontua, são movimentos estratégicos para o governo do ponto de vista comercial, “porque abrem portas diversas e abrem possibilidades diversas”, permitindo investimentos e parcerias no estado. A maioria dos estados brasileiros, no entanto, entende que essa área deve ser de responsabilidade apenas do governo federal, por isso há poucos estados com secretarias focadas em assuntos internacionais.
Brasil tem poucos estados dedicados à política internacional
A Gazeta do Povo analisou a estrutura de governo de todos os estados brasileiros e constatou que apenas outros três possuem secretarias voltadas para as relações internacionais: Alagoas, Ceará e Amapá. A pesquisa foi feita nos sites dos governos estaduais e considerou como secretaria voltada ao assunto àquelas que, no nome, deixam evidente que são focadas em relações internacionais.
O professor da Udesc explica que há dois tipos de relações internacionais que podem ser feitas no âmbito de uma federação como o Brasil:
- A política internacional nacional: acontece num nível macro e concilia os interesses da nação, seja para relações comerciais, seja para políticas.
- A política internacional estadual e municipal: na qual interesses econômicos regionais são priorizados.
“Se a gente olhar para o comércio e a produção, é muito difícil que os interesses internacionais sejam coordenados somente pela federação, porque estados têm vocações distintas. Então, eles não tem só capacidade de poder entrar (nessa área), como é do jogo das relações comerciais atrair investimentos no estado para suas vocações. Então é super estratégico que governos estaduais tenham, sim, um setor de relações internacionais”, explica Pinheiro.
Agendas da política internacional de Jorginho Mello
Julho: Jorginho Mello se reuniu com o presidente da Argentina, Javier Milei, em Balneário Camboriú (SC). Houve um encontro bilateral entre eles e, ainda, uma reunião com empresários catarinenses. Essa foi a primeira visita de Milei ao Brasil desde que tomou posse na Casa Rosada.
Setembro: ministro da Fazenda Pedro Reis virá para Santa Catarina. Ainda não tem data confirmada para a visita. Antes desse encontro bilateral, em 3 de setembro, uma comitiva de Portugal - com autoridades, imprensa e lideranças do setor turístico - estará no estado catarinense para o primeiro voo da TAP entre Florianópolis e Lisboa.
Outubro: ex-presidente da Espanha José María Aznar estará em Santa Catarina em 1º de outubro, para participar de uma reunião na Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc) com o governador Jorginho Mello, de acordo com o secretário Paulo Bornhausen. “Somos um campo ideológico parecido com o da Europa e ele é um líder importante para que Santa Catarina continue mantendo portas abertas na Espanha”, explica Bornhausen.
O Itamaraty foi procurado pela Gazeta do Povo para comentar as agendas bilaterais de Santa Catarina, mas não retornou os questionamentos até a publicação desta matéria.
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