Com um detector de metal na mão, Mateus Natan da Silva e o pai, Edésio da Silva, percorrem as praias de Santa Catarina em busca de tesouros perdidos. O hobby começou como uma curiosidade em descobrir o que as areias escondem e serviu para aproximar os dois. Essa prática tem se expandido por litoral, praças e parques de todo o Brasil. Dados da Minelab, empresa líder mundial em tecnologia de detectores de metal com sede em Florianópolis (SC), mostram que a procura por esses equipamentos cresceu 2.000% em cinco anos.
Moradora de Balneário Camboriú (SC), a família Silva comprou o primeiro detector em 2013 e desde então desbravou as principais praias catarinenses. Eles saem de casa por volta das 4h para buscar tesouros, ou então no fim da tarde, quando as praias começam a esvaziar. Nessas buscas, já encontraram de tudo. Em um canto da Praia do Atalaia, em Itajaí, Mateus desenterrou um saco com 30 moedas antigas. No meio delas, duas de prata: uma comemorativa da Independência do Brasil, com a data de 1922, e outra com o rosto de Duque de Caxias esculpido, de 1935.
Na coleção de tesouros, há também óculos da marca Ray-Ban, pingente de pandora, anéis de ouro e prata. O mais curioso, destaca Mateus, é um relicário que esconde um fio de cabelo. “Presumi que seria de uma avó que guardava o cabelo do neto, já que era [um fio] bem fininho. Tentei achar o dono, mas nunca consegui”.
Mateus compartilha nas redes sociais vídeos da expedição e dos objetos encontrados. Tem quase 45 mil seguidores no TikTok. O objetivo dele é chegar ao R$ 1 milhão com a prática, meta que ele admite não ser fácil. “Tem que ter paciência e persistência. Às vezes, ficamos cinco horas caminhando para poder encontrar alguma coisa”.
90% dos achados são lixo
Ao ser questionado sobre a principal dificuldade do detectorismo, Mateus não titubeia: “a quantidade de lixo na praia; 90% do que achamos é lixo”. Toda vez que percorrem as areias catarinenses, ele e o pai recolhem cerca de um quilo e meio de lixo cada. “Teve um dia que chegamos a desenterrar um ferro de 20 quilos”, revela.
A sujeira das praias catarinenses não é só uma percepção de Mateus e do pai. Uma iniciativa da Route Brasil, um observatório socioambiental, recolheu 117.146 resíduos em 61 ações nas areias, realizadas entre 2012 e 2020. Essa sujeira também é enfrentada por detectoristas em outros espaços. A professora Carol Tabarelli, 36 anos, pratica o hobby em parques e praças de Curitiba e é categórica ao afirmar que tira muito lixo desses locais. “Não só o lixo escondido, mas também os jogados na grama”, ressalta.
A conscientização da limpeza e do meio ambiente é o que mais motiva Carol a seguir na prática de detectorismo, além dos amigos. “É um trabalho pensado na natureza”, resume. O hobby mexe com o emocional, físico e psicológico do participante, conta a professora. “É sempre uma surpresa. Não tem como explicar: você gosta de estar lá, de encontrar o lixo, as moedas. Todo sinal do detector é uma surpresa. Você desenterra e tira esse objeto que está lá há 100, 200 anos, e é gostoso ter essa sensação”.
Detectorismo como resgate histórico
Além do detectorismo de limpeza, Carol exerce o detectorismo histórico, geralmente em fazendas nos arredores de Curitiba. Nesses locais, é comum encontrar fechaduras, moedas e joias antigas. Ela conta que muitos dos achados não são de valor, como peças que eram usadas em carroça e em cavalos e até ferramentas que datam décadas passadas.
O objeto mais antigo que consegue datar é uma moeda de 1818, que encontrou em uma propriedade privada, onde fica uma casa antiga, no bairro Pilarzinho, na capital paranaense. “Já encontrei objetos mais antigos, mas não consigo datar especificamente”, conta ela, que menciona o berimbau de boca ou harpa de judeu, que localizou em um caminho de tropeiro, no bairro Umbará, também em Curitiba. É um instrumento musical pequeno e simples, que consiste em um arco de metal, com uma língua de aço no meio.
“Quando encontrei, parecia ser um prego de alguma carroça, mas quando fui pesquisar vi que era um instrumento musical e com certeza deve ter mais de 200 anos. É uma peça que guardo com muito carinho. Só encontraram dois iguais no Brasil, já que é um objeto raro”, conta.
Carol pratica detectorismo desde 2013. Um ano depois, ela e quatro amigos criaram um clube dedicado à prática em Curitiba. Cerca de 100 pessoas participam do grupo. Eles tentam praticar o detectorismo juntos e compartilham e pesquisam sobre os achados. A professora estima que, no Paraná, cerca de mil pessoas pratiquem o hobby.
Detectorismo se expandiu na pandemia
O crescimento na venda de detectores de metais impressiona o diretor comercial da Minelab Brasil, Regis Oliveira. Desde que a empresa se instalou em Florianópolis, há cinco anos, atraída pela viabilidade financeira e contábil do estado e pelo polo de startups - são 17 mil empresas de tecnologia em Santa Catarina, segundo levantamento do Sebrae -, a Minelab registrou crescimento de 2.000%. “É um número bem expressivo e que se dá pela ambientalização, por esse produto ser mais próximo ao usuário”, explica Oliveira.
O diretor comercial entende que o “crescimento exponencial das vendas veio com a pandemia”. Como o hobby é feito ao ar livre e pode ser realizado sozinho, o número de praticantes do detectorismo aumentou durante o período de distanciamento social. Além de envolver lazer e saúde, já que é necessário caminhar por horas para encontrar objetos escondidos, o detectorismo permite às pessoas reviver e contar histórias.
É um hobby que reúne diferentes grupos: tem os que praticam apenas para se divertir, outros com o objetivo de encontrar peças perdidas na fazenda da família, e aqueles que são motivados pela curiosidade. Há, ainda, os que buscam retorno financeiro e querem transformar o detectorismo em fonte de renda, e os que estão na atividade por buscas históricas, ou seja, localizar objetos antigos e de séculos passados.
Como funciona o detectorismo
O detector de metal lembra uma vassoura, mas ao invés das cerdas na ponta inferior tem uma bobina, com rolamento de fio de cobre, que envia conduções eletromagnéticas para o solo. “Tem uma tecnologia que envolve o que chamamos de frequência. Todo metal, quando recebe uma frequência, devolve uma imagem”, explica Oliveira.
Ele compara o funcionamento do detector com o ato de jogar uma bolinha no solo. Se o chão é duro, a bolinha volta bem alta. Se jogar na areia, volta mais baixa. E se for na água, talvez nem volte. Com os metais é semelhante. “Você dá um impulso para o solo e ele vai detectar o metal, que devolve o impulso para o detector”.
O equipamento consegue identificar o tipo de metal encontrado: alumínio, cobre, zinco, bronze, prata, chumbo. “Conseguimos deduzir também pelo som do equipamento qual o metal que está enterrado”, diz Carol.
Detectores mais tecnológicos conseguem até isolar as frequências de metais que o praticante não quer encontrar, conta Oliveira. Assim, dá para deixar as frequências apenas de ouro e prata, por exemplo.
Ao encontrar o objeto, o detectorista faz um buraco no solo e cava até localizá-lo. Por isso, Carol e Mateus destacam que é imprescindível ter um pinpointer, um minidetector que cabe na mão e dá a localização mais precisa de onde o objeto está enterrado. “Você usa o maior para identificar o local e, então, pega o detector menor e passa ele por esse local. Ao esfregar no solo, vai achar certinho onde o objeto está enterrado”, explica Carol.
Além disso, é preciso levar ferramentas para escavar, que variam de acordo com o local da prática. Na praia, se utiliza a sand scooper, uma espécie de pá, mas cheia de furinhos, que peneira a areia. Na grama, é necessário uma faca de escavação. Em locais maiores, como fazendas, é utilizada uma pá de jardineiro.
Luva para proteger as mãos e fone para ouvir o som do detector de metal também estão na lista, assim como saco plástico, para recolher o lixo encontrado. O preço de um detector de metal varia de R$ 499, o mais simples, até R$ 47 mil, o mais sofisticado.
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