• Carregando...
Política protecionista Donald Trump
Relação com a China imposta por novo governo Trump volta a influenciar agronegócio no Brasil.| Foto: Justin Lane/EFE

A política protecionista imposta pelo governo Donald Trump no início do segundo mandato na presidência dos Estados Unidos colocou o agro brasileiro em estado de alerta. A taxação de produtos estrangeiros e as relações comerciais entre os americanos e o governo da China devem impactar o setor agrícola, caso o presidente republicano confirme as promessas de campanha.

Especialistas do agronegócio brasileiro ouvidos pela Gazeta do Povo afirmam que o setor precisa procurar novos mercados para diversificação dos negócios, sem perder o foco na exportação aos chineses, principal parceiro comercial brasileiro. Além disso, o governo Lula deve manter o tom diplomático na discussão de temas sensíveis com a gestão Trump, evitando danos colaterais para o agro, principal protagonista da balança comercial brasileira.

Apesar de o agro ter sido beneficiado pela postura protecionista do republicano no primeiro mandato (2017-2021) em relação ao mercado chinês, que possibilitou a maior entrada das commodities brasileiras no país asiático, o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado federal Pedro Lupion (PP-PR) avalia que Trump deve trabalhar pela ampliação do mercado na China para os produtos norte-americanos. Ou seja, a tendência é de forte concorrência entre Brasil e Estados Unidos, principalmente pela fatia chinesa na exportação de soja e milho.

“Estamos entre as três maiores potências produtivas do mundo ao lado da China e dos Estados Unidos. Disputamos os mesmos mercados em uma concorrência extremamente importante. A disputa de mercado com os Estados Unidos é muito agressiva e forte, mas até agora não existia uma participação efetiva dos americanos nas negociações diretas com a China. A situação era mais pró-Brasil com o mercado chinês aberto com possibilidade do agro brasileiro entrar”, avalia.  

“No meu entendimento, o cenário não continuará assim. O Trump vai chamar a China para a mesa: ou aumenta a cota americana ou terá problemas com os Estados Unidos em outras áreas. Isso é normal, está dentro do previsto”, completa o presidente da FPA.

Lupion comentou que ainda é cedo para avaliar como a China responderá à compra de soja e milho norte-americano, mas ressaltou a necessidade de priorizar as relações comerciais com o mercado chinês. “A gente não pode perder essa ponte. A gente fala muito da União Europeia, fica muito preocupado com o bloco europeu, mas a China representa a maior parte das exportações. Temos que ficar de olho nos nos dois lugares, tomando muito mais cuidado para não ter nenhum melindre com os asiáticos".

Ele pontua que não são somente commodities. "Também estamos falando de carne, produto acabado e proteína com o esmagamento de soja e milho que temos aqui. É toda uma cadeia produtiva que não podemos perder o protagonismo”, alerta.

Seguindo o bordão “Make America Great Again”, a política trumpista tende a colocar os Estados Unidos, novamente, como uma potência exportadora, de acordo com Lupion, com medidas para o avanço da industrialização norte-americana. “As tarifas impostas à China são para garantir mão de obra para os americanos e diminuir a entrada de produtos industrializados chineses nos Estados Unidos para fortalecimento da indústria local”, pontua.

Conforme a balança comercial brasileira de 2024, a China se manteve como o principal parceiro do agronegócio com a compra de US$ 49,7 bilhões, o que representou 30,2% das exportações do setor no ano passado. No comparativo com 2023, a participação chinesa no agro brasileiro caiu 17,5%.

O principal produto vendido para a China foi soja a granel, totalizando US$ 31,5 bilhões com 72,6 milhões de toneladas de grãos. O montante representa 63% das exportações, sendo que os chineses compraram 73,4% do estoque de soja brasileira destinado ao mercado internacional.

Os Estados Unidos ocupa a segunda posição entre os países parceiros em 2024, quando comprou US$ 12,1 bilhões de produtos do agro nacional, o que representa um acréscimo de 23% em relação ao ano anterior. Os principais produtos exportados foram café verde, celulose, carne bovina e suco de laranja.

Trump deve acelerar medidas protecionistas no agro  

Analista do Departamento Técnico e Econômico (DTE) da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep), Luiz Eliezer Ferreira lembra que o primeiro mandato de Trump também foi marcado pela promessa do “tarifaço” para os produtos agrícolas e manufaturados de vários países e regiões. As medidas não foram colocadas em prática, com exceção da China.

“Quando Donald Trump aplicou o ‘tarifaço’ sobre os produtos chineses, de certa forma o Brasil foi beneficiado nesse processo, uma vez que a China acabou se voltando para o Brasil para conseguir substituir os Estados Unidos na compra de diversos produtos agropecuários naquele momento”, analisa o técnico, que cita a exportação de soja e milho como beneficiários em decorrência da medida protecionista contra a China no primeiro mandato trumpista.

Nesta nova gestão, o presidente dos Estados Unidos adota uma postura mais agressiva e célere no primeiro mês após o retorno à Casa Branca. Trump chegou a declarar que o “Brasil precisa mais dos Estados Unidos” do que ao contrário. “Ele está correto. O mercado dos Estados Unidos é o segundo maior para exportações com 5,5% do total, principalmente com a venda de papel e celulose. Já o Brasil é o 18º parceiro comercial norte-americano”, compara Ferreira.

Segundo ele, quase metade das exportações brasileiras são de produtos do agronegócio, sendo que nos estados produtores agrícolas, o percentual de participação chega a 80%, como no Paraná, o que aponta para dependência do agro para bons resultados na balança comercial. “É um momento de apreensão pela tentativa de implementação das medidas de maneira célere e vai depender muito dessa relação entre Estados Unidos e China, os dois maiores players do mundo com os maiores mercados consumidores”, pondera.

Brasil deve adotar tom diplomático para negociações no agro com Trump

Na avaliação do técnico da Faep, o governo brasileiro deve adotar uma postura diplomática para evitar que questões políticas, como a deportação de imigrantes, possam influenciar as negociações comerciais com os Estados Unidos. A alta temperatura nas relações diplomáticas pode resultar em tarifas sobre os produtos dos países, assim como ocorreu em janeiro na resposta de Trump ao governo colombiano, que questionou a política de deportação dos latinos. 

A taxação de produtos para entrada no mercado americano também é vista como uma estratégia comercial para debater melhores condições para os Estados Unidos. “O Trump lança a questão tarifária para depois negociar no varejo com cada país”, comentou Ferreira.

O deputado federal Pedro Lupion lembrou da posição do governo mexicano, que se reuniu para discutir acordos com o presidente Trump, principalmente sobre as questões de segurança na fronteira dos países. “O México deixou claro o caminho que vai adotar. Acalmou as coisas com a presença maior do Exército na fronteira, evitando a entrada de drogas nos Estados Unidos, com mais segurança para evitar a entrada de armas no México. O resultado é que não tem mais tarifa. Entendo que ele [Trump] está forçando para chamar o pessoal para a mesa, colocar a bola no chão e começar o jogo de novo”, avalia o presidente da FPA.

Economista afirma que Brasil precisa buscar novos mercados

O economista e professor universitário Rui São Pedro defende que, além do tom diplomático para as negociações com o governo de Donald Trump, o agro brasileiro deve trabalhar na ampliação de consumidores nos países parceiros e na abertura de novos mercados internacionais para exportação.

“O Brasil aprendeu uma lição importante após a queda das Torres Gêmeas em 2001. O mercado americano fechou as portas e os Estados Unidos era o maior parceiro consumidor dos produtos nacionais. O Brasil saiu em busca de novos parceiros e os encontrou no mercado europeu e asiático, principalmente com a China”, recorda. Após mais de 20 anos, ele ressalta que o agro brasileiro se tornou uma referência no setor primário no mercado mundial e concorrente do próprio Estados Unidos.

Segundo o economista, o Brasil passou a disputar consumidores com os norte-americanos no milho e no suco de laranja, mercados antes dominados pelas empresas dos Estados Unidos. “Para as commodities brasileiras que atrapalham ou que incomodam o mercado americano, com certeza, o Trump deve criar ou aumentar o imposto sobre esses produtos. Entre eles, o suco de laranja que já foi dominado pelos americanos e hoje é liderado pelo Brasil”, comenta São Pedro.

O economista também destaca o domínio brasileiro na exportação da soja para mercados internacionais, assim como aumento na participação de fornecimento de milho. “O Brasil não tinha representatividade, mas passou a ter tecnologia no campo e aumentou a produtividade. Hoje, o milho é bastante significativo para o mercado brasileiro e internacionalmente, os Estados Unidos segue na liderança das exportações para outros mercados”, completa.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]