
Concluída no ano passado, a nova ponte entre as cidades de Xambioá (TO) e São Geraldo do Araguaia (PA) é uma “miragem” na paisagem do rio Araguaia, na divisa entre os estados de Tocantins e Pará. A obra está pronta, mas o governo federal prevê que os acessos para os veículos sejam concluídos apenas no segundo semestre de 2025, adiando as melhorias na infraestrutura do transporte de cargas e na mobilidade urbana.
Até lá, o transporte na região, que integra o corredor logístico da agricultura e do setor de minérios no Norte do país, continuará a depender das balsas para travessias de cargas e de passageiros. Em agosto do ano passado, o governo Lula (PT) e a gestão do governador paraense Helder Barbalho (MDB) comemoraram a conclusão da obra, que foi iniciada durante a presidência de Michel Temer (MDB) e completa aproximadamente dois anos de atraso para entrega.
Seis meses após o anúncio do governo petista, a ponte de 1.727 metros - orçada em mais de R$ 200 milhões - ainda não foi liberada para o trânsito pela falta de acessos rodoviários e ausência de rampas nas cabeceiras que não foram construídas para a ligação “seca” entre os estados. Segundo o governo federal, os acessos terão a extensão de 2.010 metros, sendo 310 metros de extensão no lado do Pará e outros 1.700 metros de extensão no lado do Tocantins, com plataforma de 12 metros de largura de pista e acostamento, além da implantação de vias marginais.
A falta de infraestrutura logística se agravou com a queda da ponte Juscelino Kubitschek, na BR-226, entre as cidades de Aguiarnópolis (TO) e Estreito (MA), no dia 22 de dezembro. A estrutura desabou e deixou 14 pessoas mortas, com a abertura de uma sindicância para apurar a responsabilidade pela falta de manutenção da estrutura construída na década de 1960. Durante o processo de reconstrução, o transporte de passageiros e cargas também será feito por meio de balsas entre o Tocantins e o Maranhão.
O presidente do Sindicato das Indústrias de Mineração do Tocantins e da Associação dos Produtores Rurais do Sudeste, Carlos Wagno Maciel Milhomem, avalia que o setor produtivo vive um bom momento no estado com investimentos para o desenvolvimento econômico, mas o poder público não tem conseguido acompanhar a produção privada com oferecimento de infraestrutura no setor de transporte.
Ele calcula que o Tocantins tem potencial para produção de 8 milhões de hectares de lavouras, o que amplia a participação do estado na agricultura dentro do Matopiba, grupo formado pelos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. “Existe um déficit muito alto de investimentos em infraestrutura na região. Nós temos uma relação importante com os estados que estão no Matopiba e também com o próprio Pará, o que faz do Tocantins a nova fronteira de desenvolvimento do agronegócio no país”, disse Milhomem em entrevista à Gazeta do Povo.
Atraso na abertura da ponte prejudica transporte de cargas de minérios
O presidente da associação rural ainda ressaltou a posição estratégica do estado no transporte por meio da Ferrovia Norte-Sul, considerada uma espinha dorsal do sistema ferroviário pela ligação do Norte com as regiões Centro-Oeste e Sudoeste. Entre as conexões, está a ligação entre os portos de Itaqui (MA) e de Santos (SP). Ou seja, a produção agrícola de estados do Norte e Nordeste do país pode ser escoada pelo sistema ferroviário a partir do Tocantins, que recebe os carregamentos pela malha rodoviária.
O transporte de cargas de minérios também está sendo prejudicado pelo atraso na abertura da ponte entre Xambioá e São Geraldo do Araguaia. De acordo com Milhomem, o calcário produzido no Tocantins é responsável pelo abastecimento da região sul do estado vizinho.
“A mineração do Pará sempre teve um peso grande no desenvolvimento da região com ferro, ouro e outros minérios. O Tocantins também intensificou os investimentos e as pesquisas para o desenvolvimento do setor mineral”, comentou.
Milhomem lembrou que uma frente de entidades com articulação da Federação das Indústrias do Estado do Tocantins (Fieto) foi organizada para reivindicar os investimentos públicos na infraestrutura para o desenvolvimento do estado. “Não entendemos por que a resolução desse problema não é uma prioridade para o poder público. O Pará e o Tocantins compartilham as atividades econômicas e podem atrair investidores para a região e o atraso na entrega da ponte atrapalha a produção”, cobrou.
Procurado pela Gazeta do Povo, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) respondeu que a ponte sobre o rio Araguaia, na BR-153, está com 95% concluída e possui contrato separado para obras de construção de acessos. Segundo o órgão do governo federal, a edificação da ponte está sob responsabilidade do Consórcio A. Gaspar/Arteleste/V. Garambone, com investimento de R$ 204,2 milhões.
“A obra de construção dos acessos à ponte, km 151,56 ao km 151,87 (PA) e km 1,20 ao km 2,90 (TO), está com os projetos hidrológico e geológico em fase de aprovação. A previsão de entrega é o segundo semestre de 2025”, acrescentou o Dnit. A empresa contratada para execução dos acessos foi a Teto Construtora S. A. em um contrato no valor de R$ 28,6 milhões.
Sem abertura de ponte, transporte de cargas depende de balsas
O presidente do Conselho Temático de Infraestrutura (Coinfra) da Federação das Indústrias do Estado do Pará (Fiepa), José Maria Mendonça, classificou a ponte do rio Araguaia como crucial para a logística e lembrou que o setor produtivo ainda depende de travessias fluviais e balsas, o que encarece o transporte de cargas com impacto na cadeia de produção. “Com a ponte, o transporte terrestre se torna mais rápido e seguro, reduzindo custos e melhorando a competitividade dos produtos da região”, ressalta.
Além do custo e da lentidão, segundo Mendonça, o serviço pode sofrer interrupções por condições climáticas, como cheias ou secas, o que resulta em atrasos nas entregas e limitações na capacidade de carga. “A entrega da ponte vai gerar a nova rota Belém-Brasília, economizando cerca de 200 quilômetros. Essa melhoria na infraestrutura de transporte pode atrair novos investimentos, aumentar a eficiência logística e impulsionar o comércio regional, beneficiando a economia como um todo”, projeta.
De acordo com o presidente do Coinfra, a ponte na cidade paraense de São Geraldo do Araguaia passará a receber a carga de minérios, em alta na região, além de grãos, como soja e milho, produtos da pecuária, como carne e leite, e itens provenientes da agricultura familiar.
Reconstrução de ponte agrava problemas de infraestrutura no Tocantins
Assessor técnico da Federação da Agricultura e Pecuária do Tocantins (Faet), Luiz Claudio Faria Cruz afirma que a falta de infraestrutura para escoamento da produção agrícola se agravou com a queda da ponte Juscelino Kubitschek, na BR-226, na divisa com o Maranhão. Sem a abertura da ponte do rio Araguaia, o transporte de grãos depende das travessias fluviais tanto na ligação do Tocantins com o Pará como no acesso ao Nordeste pelo Maranhão, na integração da rede Matopiba.
Segundo ele, o Tocantins está entre os 10 maiores produtores de grãos do país, com estimativa de crescimento de 10% na safra 2024-2025 com cerca de 8 milhões de toneladas. “Essa situação das pontes atrapalha muito o setor. Estamos em fase de colheita e já temos um grande problema, não só no Tocantins, mas no Brasil no que diz respeito ao armazenamento [dos grãos]. Quem já colheu a soja, tem que escoar e comercializar o mais rápido possível. Em seguida, temos que iniciar a produção da safrinha [do milho]. Isso está virando uma grande bola de neve”, criticou.
Para o assessor técnico, o impasse entre a construção da ponte sobre o rio Araguaia e os acessos deveria ter sido resolvido antes do início das obras ou durante a execução para acelerar a entrega da estrutura para o tráfego de veículos. “Não entendemos o motivo da morosidade em uma obra que recebeu um investimento tão grande. Neste momento de dificuldade, a ponte já poderia ser uma realidade”, opinou.
Para a reconstrução da ponte JK na divisa entre o Tocantins e o Maranhão, o governo federal contratou, com dispensa de licitação, o consórcio formado pelas empresas Construtora A. Gaspar S.A e Artes Leste Construções Limitadas com custo de quase R$ 172 milhões. Em fevereiro, a estrutura remanescente da ponte foi implodida para início da obra com entrega prevista até o final de 2025.
Governo do Tocantins cobra antecipação de cronograma para entrega da ponte
Em nota enviada à Gazeta do Povo, a gestão do governador do Tocantins, Wanderlei Barbosa (Republicanos), afirma que cobrou o ministro dos Transportes, Renan Filho, sobre a necessidade de celeridade para conclusão dos acessos à ponte do rio Araguaia, na ligação com o estado do Pará. “O ministro garantiu que as obras de acesso serão finalizadas em até dois meses, antecipando a entrega prevista inicialmente apenas para o segundo semestre de 2025”, diz a nota, que ressalta que a responsabilidade pela obra é do Dnit.
O governo estadual avalia que a estrutura deve “desafogar o tráfego na região”, beneficiando o escoamento da produção e o transporte de passageiros. “Além disso, a nova ponte ajudará a minimizar os impactos causados pela queda da ponte da BR-226, entre Aguiarnópolis e Estreito, que tem afetado diretamente as cidades da região do Bico do Papagaio”, completa.
O governo do Pará também foi procurado, mas não respondeu os questionamentos da Gazeta do Povo até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto para o posicionamento.
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