Contardo Calligaris joga nas onze. Escritor, psicanalista, dramaturgo e colunista do jornal Folha de S. Paulo, o italiano radicado no Brasil diz que está atrasado para uma consulta antes de falar com a Gazeta do Povo sobre a segunda temporada da série “PSI”, da qual ele é diretor geral.
Como é trabalhar no consultório e no set ao mesmo tempo?
Intenso, mas sou uma pessoa relativamente ativa. Durante a produção da segunda temporada era pesado. Foram 17 semanas de filmagens, e eu tinha umas 13 horas de atendimento por dia que não podia suspender. Era duro. As noites eram curtas. Porque ficava pensando no set, e aí relia diálogos em casa, decidia se haveria alterações ou não, recebia e-mails do assistente de direção, do responsável pelo figurino, do elenco etc.
Eu gosto muito de histórias em quadrinhos. A estrutura é próxima da decupagem do cinema.
Assiste a séries?
Todas as séries. No sentido de colocar o meu nariz, ver um episodio ou outro, são quase todas mesmo. Gosto muito. Acho que ninguém deveria fazer ou produzir alguma coisa do qual não gosta de fruir. Um romancista que não lê romance, por exemplo: reprovado. Eu gosto muito de histórias em quadrinhos. A estrutura é próxima da decupagem do cinema.
A violência será algo presente na segunda temporada de “PSI”. Ela pode ser explicada pela invisibilidade momentânea de algumas pessoas e a necessidade que elas têm de serem vistas?
A violência é uma das grandes maneiras pelas quais alguém que se considera invisível tenta se tornar visível. Uma das explicações possíveis, em grande parte verdadeira, da violência urbana do Brasil, é o corolário da invisibilidade. Há uma maneira violenta de impor a minha visibilidade ao outro. Não é por acaso que esse tema aparece no primeiro episódio.
HBO tira a série “PSI” do consultório
Nova temporada, com direção do psicanalista Contardo Calligaris, estreia no próximo domingo (4)
Leia a matéria completaNo Brasil isso é um problema maior?
Sim. Quando você tem menos invisibilidade social, não há necessariamente menos roubos ou furtos. Mas o cara que rouba carro na Europa, vai abrir, fazer o contato e ir embora. No Brasil, ele tem competência para fazer isso, mas prefere te esperar para enfiar uma arma na sua cara. Ele não precisa da chave, mas sim desse gesto, que o torna visível. Acaba sendo mais importante do que roubar o carro.
Os diálogos da série são muito precisos, com termos técnicos da psicanálise. Como eles são construídos?
Eu escrevo os roteiros e os diálogos. Todos eles, mesmo os que não têm vinculo direto com a experiência clínica, são realmente trabalhados com extrema precisão. O espaço para mudança é muito pequeno. Às vezes um ator “planta um caco”, isso pode até ser divertido, mas a regra no set é a seguinte: se eu não estiver presente, não haverá alteração. É chato dizer isso, parece que sou um tirano, mas é assim que funciona. Porque o roteiro não cai do céu. As mudanças de última hora, sobretudo no diálogo, são muito delicadas. Os fatores que entram em jogo mudam o caráter do personagem.
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