Com a previsão de aumento de consumo de eletricidade superior a 3% (3,4%) ao ano no Brasil até 2032, como apontou o Plano Decenal de Expansão de Energia, apresentado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) do Ministério de Minas e Energia no fim de 2022, e a recente ampliação do mercado livre de energia para pequenas e médias empresas no início deste ano, não faltam motivos na busca por inovação no setor elétrico.
A cada ano surgem mais e crescem os investimentos em ‘energytechs’ – startups focadas no desenvolvimento de soluções para o setor de energia. No primeiro trimestre de 2024 houve um crescimento de 172% na captação de recursos em comparação ao primeiro trimestre de 2023 nas energytechs brasileiras, ante 39% de aumento na média geral, segundo relatório da plataforma SlingHub, voltada à inteligência de dados sobre o ecossistema de startups latino-americano.
Justamente em busca de novas tecnologias para processos e produtos que possam melhorar os serviços prestados e até gerar novos negócios, a Companhia Paranaense de Energia lançou em 2021 a primeira edição do Copel Volt, programa de inovação aberta global para startups, desafiadas por diferentes áreas da empresa (Transmissão, Geração e Distribuição) para as chamadas provas de conceito, ou seja, demonstrar a possibilidade de validar o serviço ou produto em situações ou problemas existentes no ‘mundo real’ e avaliar se ele pode ser escalado para todo o setor elétrico.
“É um investimento considerado de risco, mas a natureza dele é de tentar prever o que será o setor de energia no futuro. O que a gente está buscando é algo para além da regulação, empresas mais jovens que estão criando novos formatos de negócios”, resume o diretor de Novos Negócios da Copel, Cassio Santana da Silva, sobre o Copel Volt e olhar da companhia para a inovação aberta, já mais consolidada em setores como o financeiro (fintechs) e até mesmo nos de saúde e educação, porém mais recente no mercado da energia, sobretudo no de energia elétrica.
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Santana conta que a inovação no setor de energia se confunde muito com o instrumento P&D (Programa de Pesquisa e Desenvolvimento) da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) existente desde o início do século. Na prática, a agência carimba uma parte do lucro das companhias de energia para investir em algumas áreas que ela julga prioritárias para estudar potenciais melhorias no setor. ”Por muito tempo as companhias deixaram de buscar com recurso próprio novos negócios e ficaram cumprindo a demanda da Aneel, que se aproximou muito da parte acadêmica. Elas ajudaram de fato, mas não criaram novos negócios”, analisa.
Foi para expandir o portfólio e dar agilidade para as inovações virarem realidade que o Volt surgiu. Depois de duas edições ou ‘voos’ concluídos com mais de 500 startups inscritas e o terceiro com novo formato (perene, sem prazos de inscrição) na fase final ganhou nova ferramenta. “Ao fim da primeira edição percebemos que precisávamos de algo mais adequado para investir nesses negócios ao invés de apenas os contratar como prestadores de serviço, acelerá-los e participar da gestão sem os afogar com processos e burocracia”, revela Santana.
Na evolução desse processo, a Copel tem desde o segundo semestre de 2023 um fundo de R$ 150 milhões para investimentos em energytechs selecionadas. A Copel Ventures I, primeiro fundo de Corporate Venture Capital (CVC) da Companhia, nasceu em paralelo ao segundo voo, quando a companhia contratou a empresa Vox, gestora de investimentos de impacto para criá-lo e dar o suporte para valuation (avaliação de preço) e due diligence (investigação e análise de informações) das startups. Ele foi registrado em 14 de agosto na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) como o primeiro ato oficial da empresa como corporação, após a venda do controle majoritário por parte do Governo do Paraná.
Até o presente são dois investimentos: o primeiro no fim de dezembro de 2023 na Move, startup catarinense que atua no mercado de gestão inteligente para sistemas de recarga de veículos elétricos – para controle de gestores de eletropostos, frotas e carregadores até o planejamento dos motoristas –, e em março deste ano na paulista Nextron Energia, que comercializa para geração distribuída unindo pequenas e médias usinas geradoras de energia solar aos consumidores finais, ambas com resultados preliminares bem satisfatórios, segundo a Companhia.
Outros ainda seguem fazendo suas provas junto à companhia como a Shipay, que possui um centro de pagamentos digitais que os leituristas usam como ‘último’ recurso de negociação com clientes inadimplentes antes de um eventual corte, propondo antes disso um acerto ou sinal com parcelamento via Pix na hora da visita para evitar a ‘execução’, o que tem reduzido os cortes.
Na prática, a Copel aloca recursos para o negócio ter liberdade para se desenvolver ao mesmo tempo em que conta com o corpo de engenharia e a musculatura da companhia para fortalecer as provas de conceito, o que o diretor chama de uma visão 'smart money'.
“A ideia é investir os R$ 150 milhões em cinco anos e do ano seis ao dez fazer desinvestimentos ou novas rodadas, quando já teremos elementos mais sólidos para investir ou sair. Investimos de R$ 2 a 10 milhões até 20% do market cap [valor de mercado] da startup para que ela não seja controlada pela Copel, não vire uma subsidiária, mas eu defendo meu mercado e posso avançar em outros em estados por meio dela. À medida que ela expande, tenho direito de preferência para defender ou expandir minha posição e até eventualmente comprá-la [neste caso sim virando parte da companhia]”, explica Santana, que não exclui a possibilidade da criação de mais um fundo similar ou até mesmo ‘abrir’ o atual para aportes de outros entes do setor elétrico.
Na terceira versão do voo, 85 entraram no ‘funil’ que tinha como foco prioritário desafios em inteligência climática e hidrogênio verde, com 44 passando da análise inicial, sobrando atualmente cinco em maio, que estão em análise mais avançada, podendo avançar para o comitê de investimento da Copel com a Vox. Três delas olham para a inteligência climática e tentam aprofundar previsões hiperlocais, para prever com mais antecedência que tipo de melhoria ou reforços precisam ser feitos nas redes e nos serviços.
Em paralelo à inovação aberta, a Copel segue com as demais iniciativas como hackathons focados em estudantes e o programa P&D que, entre várias pesquisas bem sucedidas, tem uma série de patentes. Um deles, um capacete com sensor elétrico desenvolvido ao longo de uma década que dá mais segurança aos trabalhadores, começou a gerar royalties no ano passado. Já entre as pesquisas em andamento está uma de produção de hidrogênio renovável a partir de biogás junto à UFPR (Universidade Federal do Paraná) e outra de desenvolvimento de carregadores de veículos elétricos com o Lactec (Instituto de Tecnologia para o Desenvolvimento), por exemplo.
“O que amarra todas essas iniciativas, sejam elas mais voltadas ao mundo acadêmico ou aos negócios, é a estratégia da companhia de continuar se desenvolvendo de maneira descarbonizada e prestando excelente serviço ao consumidor”, diz Santana.
Para ele, a ‘grande virada’ que a companhia e o setor elétrico precisam se atentar mais a frente – e a iniciativa com as startups ajuda – é virar o foco para o cliente, pois o cliente está cada vez mais livre para escolher de quem quer comprar energia. “O nosso aqui com essas iniciativas de criar novos serviços e produtos é fazer com que no momento que o cliente tenha a possibilidade de sair ele decida ficar, pois ele está sendo bem atendido e tem mais serviços associados. Entrar mais gente e quem está conosco tenha motivos para ficar, essa é a nossa visão”, finaliza.
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