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Em “Lazzaro Felice”, a pureza e o bem existem, resistem e persistem

Lazzaro Felice Netflix
Disponível na Netflix, "Lazzaro Felice" é uma fábula sobre a persistência da bondade. (Foto: Reprodução)

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Lazzaro Felice é uma obra que é pura poesia visual e um soco no estômago do cinismo moderno. Este longa-metragem italiano de 2018, escrito e dirigido pela talentosa Alice Rohrwacher disponível na Netflix, é mais do que um filme – é uma parábola moderna sobre a bondade que atravessa o tempo, um conto de realismo mágico que lhe rendeu o prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Cannes.

O filme nos apresenta Lazzaro, um jovem camponês que vive em uma comunidade explorada no interior da Itália. Ele é descrito como um rapaz tão bondoso que chega a ser ingênuo, com um coração desarmado e uma pureza absoluta. Todos ali exercem funções – desde colher plantações até cuidar de animais e preparar tabaco – mas Lazzaro sempre assume as tarefas que ninguém mais quer fazer. É o subalterno entre os oprimidos.

O mais fascinante em Lazzaro é sua completa ausência de questionamento e sua boa vontade. Na base da pirâmide social, ele obedece a todos e é movido unicamente pelo desejo de fazer o bem e ajudar o próximo.

Essa comunidade, que vive em condições precárias com pouca comida e higiene, é oprimida pela marquesa Alfonsina De Luna. A marquesa sustenta a crença trágica de que todo ser humano explora os outros e deve ser explorado por alguém, em uma pirâmide social hierárquica e abusiva. É neste cenário que Lazzaro estabelece uma amizade improvável com Tancredi, um jovem nobre envolto em fantasias.

Lazzaro Felice se desdobra em duas partes

A bondade singular de Lazzaro, que não possui pai nem mãe, confere a ele um caráter quase bíblico, transformando-o em um sujeito transcendental e quase idealizado. O nome, inclusive, remete ao Lázaro da Bíblia, que foi ressuscitado por Jesus.

A atuação de Adriano Tardiolo contribui imensamente para esse misticismo, mantendo expressões e trejeitos imutáveis ao longo do filme. Lazzaro raramente deixa transparecer sentimentos, emanando uma quietude que expressa inocência e ingenuidade.

O filme se desdobra em duas partes cruciais: a primeira, rural e bucólica, é marcada pela opressão, enquanto a segunda, urbana, confronta os personagens com a dureza da modernidade.

Após uma tragédia, a narrativa dá um salto: Lazzaro retorna à vida, mas no século XXI, sem compreender a lógica do mundo moderno. Ele atravessa o tempo e chega a uma cidade desolada, mas sua lealdade permanece, e ele não é afetado pela passagem dos anos.

Lazzaro nos lembra que a bondade sempre insiste em existir

As paisagens rurais são vívidas, praticamente pinturas em movimento, e ajudam a contar uma história permeada de temas relevantes como o desemprego e a violência. O filme aborda o quanto indivíduos da mais baixa classe social, sejam camponeses no passado ou moradores de rua no presente, são invisíveis aos olhos de todos.

A mistura entre o verdadeiro e o imaginário, embora possa não agradar a todos, deixa uma marca duradoura: as belíssimas imagens filmadas, os comentários sociais entrelaçados e, acima de tudo, os olhares enigmáticos e puros de Lazzaro. Ele é a lembrança de que a bondade, mesmo sendo invisível e frágil, insiste em resistir e florescer, mesmo em um mundo onde ela não tem seu devido lugar e reconhecimento.

Se a maldade se organiza como uma pirâmide social, como sugere a marquesa, Lazzaro nos lembra que a bondade, embora isolada, é uma força silenciosa que desnuda a crueldade e insiste em existir.

  • Lazzaro Felice
  • 2018
  • 127 minutos
  • Indicado para maiores de 12 anos
  • Disponível na Netflix

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