Do filme original de 1989, só restou o sobrenome do protagonista. Essa é conclusão que se tira após assistir ao remake de Matador de Aluguel, que acaba de estrear no Prime Video. Jake Gyllenhaal vive Elwood Dalton, um ex-lutador de UFC que trabalha como leão de chácara de balada e em quase nada lembra James Dalton, personagem do finado Patrick Swayze no cult movie da década de 80. Swayze também interpretava um chefe de segurança, mas até mesmo pelo seu tipo físico, estava longe do padrão “atleta profissional”.
É verdade que a nova versão do experiente Doug Liman também manteve o titulo do filme dirigido há 35 anos por Rowdy Herrington. Road House significa taberna, bar de beira de estrada, nunca deveria ter sido virado Matador de Aluguel no Brasil. Até porque não vemos Swayze nem Gyllenhaal atuarem como capangas contratados para executar outrem. Eles são, sim, convidados a fazer a segurança de casas noturnas em que as tretas entre os frequentadores são mais corriqueiras do que as gorjetas no balcão. A taberna que emprega James Dalton fica numa cidadezinha no Missouri; a de Elwood Dalton fica na Flórida.
O Dalton de 1989 é mil vezes mais charmoso do que o de 2024. Formado em filosofia, controla as confusões no bar até o limite da gentileza, demite de forma discreta os funcionários corruptos, faz amizades com os comerciantes locais e pratica tai chi chuan na propriedade rural onde aluga um quarto. Domina um golpe que, quando aplicado, retira a garganta de seu oponente pingando sangue. O Dalton de Gyllenhall é mais irônico e audacioso. Sofre com pesadelos por conta de um adversário que assassinou no octógono. E tem um péssimo gosto para mulher.
Enquanto o personagem de Patrick Swayze se envolve a médica vivida por Kelly Lynch, uma loira estonteante com quem tem muita química, o “Dalton da nova geração” tem o teretetê com a doutora encarnada pela atriz portuguesa Daniela Melchior, uma magricela pouco atraente que precisa melhorar a pronúncia do inglês para os próximos trabalhos. Outras mudanças no casting não escondem que esse é um filme da era woke, em que tudo é guiado por “representatividade”. Com menos de dez minutos de filme, três personagens originalmente brancos já são representados por mulheres negras. O barman ladrão dá vez a uma barwoman gorda do bem. E o dono de uma loja de material elétrico é substituído por um livreiro. Preto.
Gladiadores do terceiro milênio
O próprio Gyllenhaal não foi a primeira escolha para o papel. Os estúdios MGM queriam a lutadora profissional Ronda Rousey estrelando o novo longa. No meio do caminho, boa parte do time envolvido foi trocado, mas inventaram um papel para encaixar outra estrela do UFC: o irlandês Conor McGregor vive Knox, que não tem equivalente no filme de 1989. Ele, sim, remete a um “matador de aluguel”, pois entra na história após um chamado do bandidão local, que está preso e precisa de alguém para enxotar Elwood Dalton da Flórida.
No quesito musical, o remake leva sua maior surra do filme original. O bar dos cafundós do Missouri tinha como banda da casa um trio capitaneado pelo canadense Jeff Healey, um talento do blues e do rock que morreu precocemente. Cego, Healey tem até falas no filme. Além de cantar e tocar guitarra em sua cadeira, o músico é quem alerta os locais sobre os feitos de James Dalton, por conhece-lo de outros carnavais. Já no novo filme, há um revezamento de bandas medíocres na taberna – e uma delas chega a tocar um reggae xexelento do Sublime numa cena.
Por essas e outras, esse Matador de Aluguel transforma a obra de 1989 em algo maior do que de fato ela sempre foi. Ver Patrick Swayze com seu mullet vistoso dar um pau nos folgados e ainda inspirar toda a cidade a se rebelar contra o mandão que atazana quem tem qualquer tipo de comércio vale muito mais a pena do que acompanhar as longas lutas entre Gyllenhaal e McGregor. A sorte é que o Prime também oferece o filme original em seu catálogo. Então, não tem como errar.
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