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No começo do século, a revista Vice determinava o que era bacana e o que não era no universo dos descolados. Inicialmente uma publicação punk canadense nascida nos anos 1990, ela foi realocada em Nova York pelos seus três sócios e cresceu enormemente, ao ponto de ser tratada como “a nova MTV”. Mas uma série de decisões erradas, incluindo deixar os estagiários de cabelos coloridos ditarem as regras, fez o negócio falir pouco após o seu auge.
A história completa está contada em Vice Is Broke, documentário lançado pela plataforma Mubi após alguns meses de atraso, o que gerou até especulações sobre o material ter sido engavetado. Não foi. O autor da obra é Eddie Huang, um quarentão de ascendência asiática que já fez de tudo, desde abrir restaurante em Manhattan até publicar livro que virou seriado de TV. Por muito tempo, ele foi parceiro da Vice, comandando programas e curtindo festas com a diretoria. Huang defende que o conglomerado de comunicação que a revista virou deve dinheiro para ele. Muito dinheiro. O filme é uma forma de cobrar essa dívida.
Huang vai atrás de uma porção de funcionários que trabalharam na revista. Desde gente que esteve lá nos primórdios, como o canadense David Macklovitch, que se afastou da redação quando seu duo de música eletrônica, o Chromeo, começou a dar certo, até o jornalista Simon Ostrovsky, que produziu muito material para a Vice na Rússia e na Ucrânia em 2014 e 2015, capturando a gênese do que seria o conflito entre os dois países que dura até hoje. Foi pelos documentários produzidos pelo veículo que muita gente viu as primeiras cenas do que rola de verdade na Coreia do Norte ou em comunidades paupérrimas africanas. A Vice teve o seu valor, entende quem assiste a Vice Is Broke.
Entrevista no pedalinho
O ponto de ebulição do documentário é a entrevista com Gavin McInnes, co-fundador da revista, cujos artigos e estilo de editar moldaram a linguagem do veículo até 2007. Hoje, McInnes é mais conhecido por liderar a organização de direita Proud Boys, que foi implicada na invasão do Capitólio. Hoje, sua figura mítica fascina quem trabalhou ao seu lado na revista, incluindo o próprio Eddie Huang, que termina a interação com o ex-editor disputando um braço de ferro.
Aliás, descontração é o que não falta em Vice Is Broke. Huang chega a entrevistar uma colaboradora num lago, andando de pedalinho, e outro num restaurante, trajado como Guy Fieri, o empolgado apresentador de programas de gastronomia. O documentário não é indicado para menores de 18 anos por trazer muita linguagem explícita, menção ao consumo de drogas pesadas e exibição de partes íntimas – incluindo as dos donos da Vice.

Mas o que mais chama a atenção é como a revista se perdeu quando estava no topo da influência, permitindo que jovens imberbes ditassem os novos rumos. Isso se deu bem no momento em que a cultura woke começava a fazer estragos e a Vice embarcou com tudo nessa onda. A revista iconoclasta que flertava com o perigo encampou ideias repressivas equivocadas, enquanto os cabeças da operação perderam a chance de faturar alto vendendo o negócio quando ele ainda era atrativo. A maré baixou e a Vice quebrou.
- Vice Is Broke
- 2024
- 101 minutos
- Indicado para maiores de 18 anos
- Disponível no Mubi
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