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História trágica

Em “A Virgem Vermelha”, mãe marxista não aceita que filha fuja da cartilha

Aurora e Hildegart Rodríguez: mãe e filha que marcaram a Espanha na década de 1930
Aurora e Hildegart Rodríguez (ao centro): mãe e filha que marcaram a Espanha na década de 1930 (Foto: Divulgação Prime Video)

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A filmografia de Paula Ortiz confirma, entre outras coisas, que, além de boa diretora, a espanhola é uma cineasta culta. Adaptou García Lorca em A Noiva, Ernest Hemingway em Across the River and into the Trees, e Juan Mayorga e Santa Teresa em Teresa. Agora, Ortiz mergulha numa figura histórica – a jovem intelectual Hildegart Rodríguez – naquele que é provavelmente o seu melhor filme até hoje: A Virgem Vermelha, disponível no Prime Video.

Em 1933, em plena segunda república espanhola, Hildegart foi assassinada pela mãe, Aurora Rodríguez. Hildegart tinha 18 anos, mas já era uma intelectual famosa que escreveu e publicou vários ensaios sobre o feminismo e a revolução sexual. Aurora, uma defensora da eugenia, concebeu a sua filha para que ela encarnasse o seu ideal de mulher livre e os seus valores de esquerda. “Freud no sexo, Marx na cabeça e Nietszche no coração” é a única oração que Aurora permite que Hildegart “reze”, e sua filha compartilha o erudito credo. Até que, um dia, a jovem se apaixona, realidade que a mãe não tolera.

É preciso reconhecer que o acontecimento recriado por Ortiz contém todos os elementos de uma tragédia grega. Existe amor, existe ciúme, existe sangue, existe medo e existe loucura. Mas, como já fez em Teresa, Paula Ortiz é capaz de entrar num drama passado para dialogar com ele a partir do presente. E, nesse sentido, A Virgem Vermelha é uma radiografia inteligente e crua de quão perigosas as ideologias podem ser quando desencarnadas. Quando você esquece que, acima das ideias, existe a realidade e existem as pessoas. “Em nome das ideias podem ser cometidas grandes atrocidades”, repetiu a cineasta em inúmeras entrevistas após a estreia do filme no Festival de San Sebastián, e também apontou as contradições que o filme explora em relação à liberdade: por um lado, a mãe defende a liberdade como ideal máximo e, por outro, canibaliza a filha, trata-a como uma possessão e, no primeiro momento em que Hildegart faz um exercício de liberdade, mata-a. É uma intolerância radical ao mesmo tempo que defende o respeito e a tolerância. Algo infelizmente atual.

O poder dramático e discursivo da história está envolto em uma linguagem cinematográfica marcante. Visualmente, o filme é lindo, com um tratamento de luz, dos planos e da cor muito expressivo. Tal como a música original: uma aposta eclética e muito arriscada, mas perfeitamente enquadrada na narrativa. Quanto às atuações, e como aconteceu com Teresa, Ortiz acerta na escalação e direção dos atores. Assim como foi difícil pensar em uma Teresa que não fosse interpretada por Blanca Portillo, a partir de agora será quase impossível dar vida a uma Aurora com rosto diferente do de Najwa Nimri. O que a atriz faz com seu personagem sombrio e complexo é magistral.

Em suma, baseada em uma história muito sombria (e apesar disso), Paula Ortiz conseguiu criar um filme para contemplar, pensar e discutir.

© 2025 Aceprensa. Publicado com permissão. Original em espanhol.

  • A Virgem Vermelha
  • 2024
  • 114 minutos
  • Indicado para maiores de 16 anos
  • Disponível no Prime Video

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