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Paz, amor e raiva

“Woodstock 99” relembra festival que terminou com piscinas de urina e incêndios

O Woodstock 99 reuniu bandas agressivas e não ofereceu estrutura condizente com sua grandeza
O festival reuniu bandas agressivas e não ofereceu estrutura condizente com sua grandeza (Foto: Divulgação HBO Max)

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A HBO Max exibe o documentário Woodstock 99: Peace, Love, and Rage, de Garret Price, sobre o malsucedido festival de música que, criado para celebrar os 30 anos do pioneiro festival de Woodstock de 1969, um marco da contracultura e da era hippie, terminou em violência e quebra-quebra.

O filme é bem feito e traz inúmeras entrevistas interessantes com artistas que participaram do festival, como Moby, Jonathan Davis (Korn), Noodles e Dexter Holland (Offspring), Jewel e Dave Mustaine (Megadeth), além de relatos dos organizadores do evento, Michael Lang e John Scher, e de jornalistas e apresentadores da MTV que cobriram o festival.

A pergunta central do filme – “por que Woodstock 99 foi um fiasco?” – suscita duas discussões distintas e interessantes. A primeira diz respeito à própria logística do evento, que foi completamente equivocada. Juntar, por três dias inteiros, 400 ou 500 mil pessoas numa antiga base aérea desativada, sem árvores e coberta de asfalto, sob o calor de 38 graus do verão nova-iorquino, não foi uma boa ideia. A precariedade dos serviços de higiene, de venda de bebida e comida e do atendimento médico colaborou para o que um entrevistado chama de “o gradual esfacelamento da infraestrutura e civilidade”.

A escolha dos artistas também foi uma receita para o desastre, privilegiando bandas agressivas de um gênero então em evidência, o nu metal de Korn, Limp Bizkit e Kid Rock, além de outros grupos pesados como Metallica, Rage Against the Machine, Red Hot Chili Peppers e Megadeth. O line-up trouxe um público predominantemente masculino, branco e jovem, resultando num tsunami de testosterona que, misturado ao calor e às condições sanitárias sub-humanas, com piscinas de urina e excrementos invadindo a área de camping, resultou numa explosão de violência, com palcos incendiados e relatos de agressões sexuais a mulheres.

Em 1969 já não foi lá essas coisas

A segunda discussão é mais complexa: seria possível repetir, em 1999, o mesmo clima de paz e amor do festival de 1969? Em primeiro lugar, essa tão falada placidez do Woodstock original é uma falácia. O evento, eternizado num documentário um tanto idílico e numa trilha sonora antológica, com Jimi Hendrix, Santana, The Who, Grateful Dead, Janis Joplin, Sly and the Family Stone, Crosby, Stills, Nash & Young e muitos outros, não foi nem de longe o fim de semana dos sonhos celebrado por aí, mas um caos absoluto, com destruição de cercas, invasão de público (era um festival pago que “virou” gratuito porque ninguém conseguiu conter os invasores), incontáveis overdoses e brigas a rodo. Mas a imagem que ficou foi a de uma pacífica celebração hippie.

Em 1999, o mundo era outro e a música era outra. Um dos pontos mais curiosos do filme é lembrar como havia, naquele período, uma polarização imensa na música pop e na programação da MTV: de um lado, as boy bands e astros adolescentes como Backstreet Boys, N’Sync e Britney Spears; do outro, uma geração de bandas agressivas e sombrias como Korn, Limp Bizkit, Deftones, Slipknot, Marilyn Manson, Kid Rock e System of a Down, entre outras. Numa das cenas mais emblemáticas do filme, o Offspring começa seu show em Woodstock 99 destruindo, com tacos de beisebol, bonecos com os rostos de integrantes do Backstreet Boys.

O cantor do Limp Bizkit, Fred Durst, uma das atrações mais aguardadas do eventoO cantor da banda Limp Bizkit, Fred Durst, uma das atrações mais aguardadas do evento (Foto: Divulgação HBO Max)

A tensão no local era evidente. Moby conta que planejava ficar por todo o fim-de-semana, mas quando chegou e sentiu no ar um estranho clima de animosidade e misoginia, com rapazes passando a mão nos peitos de mulheres e se comportando como hooligans, fugiu dali assim que terminou seu show. “Como pudemos ir de artistas sensíveis e inteligentes, como Kurt Cobain e Michael Stipe, à brutalidade misógina de um Limp Bizkit, em tão pouco tempo?” se pergunta Moby.

  • Woodstock 99: Peace, Love, and Rage
  • 2021
  • 111 minutos
  • Indicado para maiores de 16 anos
  • Disponível na HBO Max

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