Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Conta de luz

Brasileiros podem ter de pagar até R$ 61 bilhões para terminar construção de Angra 3

Angra 3
Estudo aponta que conclusão da usina nuclear pode pesar na conta de luz dos brasileiros por 40 anos. (Foto: PAC/Agência Brasil)

Ouça este conteúdo

Este conteúdo foi atualizado

A conclusão da usina nuclear de Angra 3, em Angra dos Reis (RJ), pode gerar um impacto de até R$ 61,5 bilhões nas contas de luz dos brasileiros ao longo de 40 anos, segundo estudo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). O levantamento, a que o Estadão teve acesso e publicou nesta segunda (13), comparou o custo da energia gerada pela usina com outras fontes disponíveis no Brasil e revelou que, em todas as simulações, o consumidor pagaria valores adicionais significativos.

O estudo projeta que o custo da energia de Angra 3 será de R$ 653,31 por Megawatt-hora (MWh), valor calculado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com base nos gastos acumulados e nos recursos necessários para a conclusão da obra. Comparando com outras fontes, o impacto financeiro varia de R$ 21,09 bilhões, no caso de termelétricas a gás, até R$ 61,55 bilhões no mercado livre de energia.

A EPE foi procurada pela reportagem, mas afirmou que não poderia se pronunciar por conta do sigilo do documento. Já o Ministério de Minas e Energia (MME) confirmou que a construção da usina estará na pauta da próxima reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), ainda neste mês.

Em nota à Gazeta do Povo nesta quarta (15), a EPE contestou as informações apuradas pelo Estadão e afirmou que “a abordagem do relatório final do grupo de trabalho de Angra 3 é abrangente e estratégica e não apenas sobre os custos da eletricidade a ser gerada por Angra 3 em comparação a outras fontes”. (veja mais abaixo)

Apesar do alto custo para os consumidores, o ministro Alexandre Silveira defendeu a finalização da usina. “Minha posição é uma defesa intransigente da continuidade de Angra 3. Não vamos carregar aquele mausoléu para servir de visitação pelo mundo enxergando aquilo como fracasso de gestão do governo brasileiro”, disse em uma entrevista em agosto do ano passado.

Segundo o estudo a que o Estadão teve acesso, os impactos nas contas de luz foram comparados aos de outras fontes de geração:

  • Termelétricas a gás: R$ 21,09 bilhões;
  • Ambiente regulado: R$ 34,69 bilhões;
  • Angra 1 e Angra 2: R$ 34,83 bilhões;
  • Leilões de reserva: R$ 39,81 bilhões;
  • Planejamento energético: R$ 42,37 bilhões;
  • Mercado livre: R$ 61,55 bilhões.

Uma das alegações do BNDES para tocar adiante a construção da usina de Angra 3 é o custo estimado da obra – de R$ 23 bilhões – enquanto que o abandono dela geraria perdas em torno de R$ 21 bilhões.

Este montante, segundo a apuração, inclui R$ 9,2 bilhões em financiamentos já concedidos, R$ 2,5 bilhões em rescisões contratuais, R$ 1,1 bilhão em devolução de incentivos fiscais, R$ 940 milhões para desmobilização de obras e R$ 7,3 bilhões em custo de oportunidade sobre o capital investido.

Além dos custos, o estudo da EPE aponta benefícios indiretos, como a geração de empregos qualificados, o estímulo à indústria nuclear, a segurança energética e a ausência de emissões de gases de efeito estufa.

“Fiz quase que uma dezena de reuniões esse ano com o BNDES. É uma obra de Estado e não de governo. Nenhum governo tem o direito de enterrar R$ 20 bilhões de brasileiros que estão naquela obra”, completou Silveira em relação à conclusão de Angra 3.

De acordo com a apuração, Angra 3 já teve aproximadamente 65% do projeto executado. Se estima uma potência instalada de 1,4 GW a partir de 2028, segundo o governo.

EPE contesta dados

De acordo com a EPE, o relatório do grupo de trabalho para a conclusão de Angra 3 aborda não apenas os custos de geração da usina, mas também aspectos estratégicos e sistêmicos, como confiabilidade e resiliência do sistema elétrico.

“Os valores destacados na matéria são aqueles avaliados pela EPE como de baixa comparabilidade com a UTN Angra 3, pois ou são baseados em geração renovável variável (serviços distintos) e não incluem custos sistêmicos de back-up, estabilidade e rede/conexão (os quais podem superar US$ 50/MWh em cenários com 75% de renováveis variáveis na matriz elétrica, de acordo com a OCDE) ou não incluem externalidades (custos externos) como os custos de abatimento de carbono após 2031 (diversos estudos internacionais apontam para preço de carbono em torno de US$ 100/tCO2eq, o que adicionaria US$ 34/MWh em UTE a gás natural, por exemplo)”, disse na nota.

O relatório também aponta que abandonar o projeto Angra 3 geraria custos elevados, avaliados pelo BNDES, além de comprometer a segurança energética e a descarbonização da matriz elétrica nacional. Segundo a EPE, os preços da eletricidade calculados pelo BNDES atendem aos princípios de modicidade tarifária, sendo similares aos valores aprovados pelo CNPE em 2018, após atualização econômica.

A abordagem da EPE, diz a nota, é respaldada por experiências internacionais e por discussões técnicas de órgãos como a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, conhecida como “clube dos ricos”), NEA (Agência de Energia Nuclear) e IEA (Agência Internacional de Energia).

“Essa também é a abordagem que fez a Suécia, recentemente, decidir alterar a decisão de considerar apenas renováveis e passar a considerar energias limpas, retomando a construção de plantas nucleares para atingir a neutralidade climática em 2050, com segurança energética e confiabilidade do sistema (concluiu que sem nuclear ou não seria possível ou seria muito mais caro assegurar esses objetivos). Mesma decisão que vem sendo buscada pela Itália”, pontuou.

Além dos benefícios energéticos, a EPE destaca que Angra 3 contribui para o domínio tecnológico, a inserção nas cadeias globais de valor e o fortalecimento da cadeia produtiva nacional. Apesar da importância desses aspectos, a EPE reconhece que ainda não há consenso internacional sobre metodologias para mensurar todos os custos e benefícios estratégicos, o que limita a abordagem quantitativa no Brasil.

“Em resumo, o Relatório da EPE é bem mais amplo do que a matéria aborda e conclui que a construção de UTN Angra 3 evita custos elevados de abandono, ajuda a moderar custos sistêmicos, provê segurança energética e confiabilidade para o sistema, e contribui para aumentar a descarbonização e a resiliência climática da matriz energética nacional”, completou.

Atualização

A reportagem foi atualizada após posicionamento da EPE à Gazeta do Povo.

Atualizado em 15/01/2025 às 10:15

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.