Desde o início do regime de metas de inflação, em 1999, o instrumento clássico para combater a alta de preços é elevar a taxa básica de juros. Quando isso não funciona ou não é politicamente interessante, o governo recorre a alternativas menos convencionais. De um tempo para cá, passou a represar aumentos de itens administrados, como combustíveis e transporte público. Uma vez que a pressão inflacionária persiste, o Planalto decidiu abrir uma nova frente de batalha: a administração da taxa de câmbio.
Muitos economistas acreditam que o governo optou por abandonar o modelo de câmbio flutuante e tem trabalhado para manter a cotação do dólar relativamente baixa, pouco acima de R$ 2,20. Assim, evita o encarecimento de produtos importados ou que contenham matérias-primas produzidas no exterior e, por tabela, inibe reajustes nos produtos brasileiros.
O Banco Central renovou no fim de junho um programa de intervenções no mercado cambial que teve início em agosto do ano passado e já é o maior desde 2002. Diariamente, o BC oferece até US$ 200 milhões em contratos de swap cambial, que equivalem à venda de dólares no mercado futuro e contribuem para manter ou baixar a cotação da moeda. A justificativa para os leilões é que eles oferecem proteção e liquidez ao mercado, evitando variações muito bruscas nas cotações.
A questão é que, na teoria, a ferramenta deveria ser usada apenas em momentos de estresse e muita volatilidade, o que não parece ser o caso. "Em momentos de crise, quando há grande quantidade de divisas saindo do país, cabe ao Banco Central garantir liquidez. Mas se não há grandes problemas de liquidez e ele faz isso constantemente, é porque está tentando conter a taxa", diz José Kobori, professor de finanças do Ibmec e estrategista da JK Capital.
Desde fevereiro, quando se aproximou de R$ 2,40, a cotação média do dólar recuou cerca de 6%, o que pode ter colaborado para a deflação no atacado, captada nos últimos dois meses pelo IGP-M. Sensível à oscilação do câmbio, o índice caiu 0,13% em maio e 0,74% em junho, na maior queda mensal dos últimos 11 anos.
Mas o efeito sobre a inflação pode ser limitado, avisa Régis Augusto Ely, professor de Economia da Universidade Federal de Pelotas. "Há evidências de que o repasse da variação do câmbio para a inflação tende a ser mais forte quando o real se desvaloriza. Quando ocorre uma valorização, o repasse não ocorre na mesma magnitude", diz.
Em outras palavras: quando o dólar fica mais caro, os preços no Brasil sobem de elevador; quando a moeda norte-americana recua, descem pela escada. "Por isso, não acredito muito nesse tipo de gestão. Contra inflação, o que funciona é controlar gasto do governo e aumentar os juros."
Exportações vivem a pior fase em três anos
A tentativa de impedir uma valorização mais forte do dólar contraria um dos princípios da "nova matriz econômica" do governo Dilma Rousseff, que por algum tempo tentou conciliar expansão do gasto público com queda na taxa de juros e uma taxa de câmbio competitiva para as exportações.
Até fevereiro deste ano, o Planalto chegou a tolerar que o dólar passasse de R$ 2,40, mas agora prefere cotações mais baixas. Exportadores afirmam que, no nível em que está, o câmbio corrói a competitividade dos produtos brasileiros, em especial os industrializados.
"A participação da indústria nas exportações está no nível mais baixo desde 1977. Estamos voltando ao Brasil Colônia", diz José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). "O governo está atuando para não deixar o dólar subir. Inflação tira votos e as exportações não são uma prioridade. O objetivo é claramente o de controlar a inflação."
No primeiro semestre, as exportações brasileiras recuaram 3%, para US$ 110,5 bilhões o valor mais baixo para o período desde 2011. Mesmo com o dólar relativamente barato, as importações caíram 4%, para US$ 113 bilhões, em claro sintoma do desaquecimento da economia brasileira.
Valorização
A chamada "taxa de câmbio real" também sugere que o real está sobrevalorizado. Esse índice, que é calculado pelo Banco Central e considera a variação da inflação no Brasil e nos Estados Unidos, indica que a moeda brasileira está mais valorizada do que há 20 anos um sinal de que a situação dos exportadores é mais complicada hoje do que nos primeiros tempos do Plano Real.