Sistemas para gestão de obras, sensores para detecção de umidade no solo e drones para monitoração das obras são algumas das tecnologias oferecidas por startups de construção civil (construtechs) para solucionar as “dores” das empreiteiras e estimular a recuperação do setor — bastante afetado pela crise econômica que atingiu o país entre 2014 e 2016 e pelo escândalo da Lava Jato. Segundo o IBGE, no segundo trimestre, o setor operava no ritmo de 10 anos atrás.
Segundo a aceleradora Construtech Ventures, o Brasil possui 562 construtechs, a maioria delas nas áreas imobiliária e manutenção e decoração predial. Com um enorme potencial de mercado, mais de US$ 7,3 bilhões foram investidos nessas empresas no mundo apenas em 2018.
A Lógica-e é uma das startups que encontrou na estagnação da construção civil uma oportunidade de negócio em inovação. Lançada em 2012 pelo especialista em sistemas digitais Bruno Bichels, a empresa oferece coletores de dados com IOT (Internet das Coisas) que ajudam a identificar problemas de impermeabilização, grau de umidade do solo e maturidade do concreto (tempo para o material atingir sua máxima resistência).
“Colocamos um sensor dentro do concreto que monitora a mistura a cada 30 minutos e monta um gráfico sobre sua rigidez. Com a tecnologia, a obra ganha, pelo menos, um dia de produtividade”, garante Bichels.
Com soluções disruptivas e um crescimento de 25% ao ano em receita, a Lógica-e recebeu um aporte de R$ 200 mil de investimento da aceleradora Darwin em 2017 e R$ 100 mil da Vedacit, companhia brasileira de impermeabilizantes. O capital acumulado, segundo o empreendedor, foi utilizado em mão de obra e pesquisa e desenvolvimento.
Investir em construtechs como a de Bichels, na avaliação de Luiz Fernando Guggenberger, head de inovação e sustentabilidade da Vedacit, é um atalho para ampliar as soluções tecnológicas da empresa e atender às mudanças de consumo dos brasileiros.
“A tecnologia foi bastante aplicada em outros segmentos do país, como saúde e segurança, mas acabou negligenciada na construção civil”, argumenta o executivo.
Construtechs tentam estimular setor que é termômetro da economia
De acordo com Bruno Loreto, cofundador da Terracotta Ventures, que levanta fundos de venture capital para construtechs da América Latina, a construção civil atua como um termômetro do desempenho econômico. Se o segmento colhe bons resultados, é indício de que o país está em crescimento. “O setor é o segundo pior em adoção de tecnologia. Por este motivo, seus índices de produtividade ficaram estagnados nos últimos 20 anos. As startups, por outro lado, mostraram que é possível fazer diferente”, explica ele.
Os números corroboram as afirmações de Guggenberger e de Loreto. Relatório “ConTech Report 2018-2019” elaborado pela JBKnowledge aponta que 46% das empresas de construção civil de vários países do mundo gastaram menos de 1% da receita em tecnologia em 2017 e 2018. Ou seja, não houve evolução.
Na avaliação da consultoria, a construção ainda está atrasada em relação a todos os outros setores, apesar das previsões da Gartner de um aumento mundial de 6,2% nos gastos com TI em 2017. Entre os fatores que dificultam a adoção de novas tecnologias, segundo o estudo, estão carência de profissionais para dar suporte às soluções, dinheiro e resistência da equipe.
Após estudar a percepção de consumo das classes C e D, o engenheiro civil Régis Chrystian da Silva, 35, descobriu que a tecnologia poderia reduzir o déficit habitacional deste público. Foi então que ele criou em 2016 a Doce Lar, construtech de gerenciamento e execução de obras para baixa renda que opera em modelo de franquia. “Temos um sistema que calcula desde os custos com mão de obra e material de construção até o potencial de crédito do cliente”, explica.
De acordo com o engenheiro, as obras gerenciadas pela construtech custam, em média, R$ 5 mil e podem ser financiadas pelo Banco do Empreendedor ou pelo Banco Original, parceiros da startup.
Atualmente, a Doce Lar possui 10 franquias no país e contabiliza 310 obras. No primeiro semestre, a empresa faturou R$ 2 milhões. “As grandes marcas não conseguem chegar ao mercado de baixa renda e nós fazemos essa ponte. Trabalhamos com Vedacit, Tigre e Gerdau”, exemplifica o empreendedor.