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Barreiras e tarifas

Disputas comerciais EUA x Brasil despencam no mesmo ritmo dos negócios entre os países

Aço e alumínio são os principais produtos alvo de disputas comerciais entre Brasil e Estados Unidos
Aço e alumínio são os principais produtos alvo de disputas comerciais entre Brasil e Estados Unidos (Foto: Antonio Costa/Arquivo Gazeta do Povo/Arquivo)

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Quanto maior o fluxo comercial entre dois países, maior a quantidade de disputas comerciais entre eles. Isso se aplica aos contenciosos entre Brasil e Estados Unidos. Os dois países já travaram longos embates, como o emblemático caso do algodão, mas hoje em dia a disputa é menor, reflexo da diminuição das parcerias de negócios.

Ainda que os americanos não imponham restrições especificamente contra os produtos brasileiros, alguns dos conflitos atuais pesam bastante por aqui. E, mesmo com a eleição de Joe Biden por lá, a preocupação com o mercado interno será crucial ao longo dos próximos anos, e sua proteção pode acarretar em novas disputas.

O comércio bilateral entre Brasil e Estados Unidos vem caindo nos últimos anos. Nos nove primeiros meses de 2020, chegou ao menor nível em 11 anos, de acordo com o Monitor de Comércio Brasil-Estados Unidos, organizado pela Amcham Brasil. Ainda assim, os Estados Unidos são o segundo principal parceiro comercial do Brasil (12,3% das trocas), atrás da China, que ampliou sua fatia para 28,8%.

O valor das trocas de janeiro a setembro deste ano foi de US$ 33,4 bilhões, redução de 25,1% em relação ao mesmo período de 2019 e menor corrente bilateral desde a crise de 2009. Segundo a Amcham, três fatores combinados explicam o desempenho comercial: os graves efeitos da pandemia da Covid-19, a queda do preço internacional do petróleo e restrições ao comércio bilateral em alguns setores, como o siderúrgico.

O peso das taxas sobre aço e alumínio

O impasse no caso do aço e alumínio vem se arrastando nos últimos anos. Em 2018, o presidente Donald Trump, estabeleceu uma sobretaxa de 25% sobre o aço e 10% sobre o alumínio importados pelos EUA, um dos maiores compradores mundiais desses insumos. A medida afetou vários países, inclusive o Brasil, que conseguiu reverter aquela decisão meses depois.

Porém, no fim de 2019, Trump disse que elevaria as tarifas para importação de aço e alumínio vindos do Brasil e da Argentina, alegando que os dois países estavam provocando a desvalorização das próprias moedas. Em janeiro deste ano, ele assinou decreto aumentando essas tarifas a 25% para aço e 10% para alumínio. O Brasil estava num grupo de países que ficou isento das tarifas adicionais sobre derivados de aço.

Qualquer sobretaxa nestes produtos, ainda que não direcionada especificamente ao Brasil, se torna um respingo com uma conta alta para o país. O levantamento da Amcham mostra que itens semiacabados de ferro ou aço representam quase 10% do total de exportações para os EUA. Em 2019, isso movimentou US$ 2,1 bilhões em nove meses. Em 2020, o montante recuou 30% e as exportações de janeiro a setembro somaram R$ 1,5 bilhão.

Outro embate que pode ganhar proporções maiores é o do etanol, ainda que esteja muito atrelado ao resultado da eleição. Em agosto, Trump ameaçou taxar importações brasileiras caso o país não reduzisse as tarifas impostas ao etanol americano. O governo brasileiro sinalizou que poderia zerar as taxas em troca de isenção para o açúcar.

Atualmente, a Coordenação-Geral de Antidumping, Salvaguardas e Apoio ao Exportador, da SDCOM, vinculada ao Ministério da Economia, acompanha três casos de disputas em curso envolvendo Brasil e Estados Unidos: molduras de madeira e produtos de carpintaria, certos cabos de aço para concreto armado e chapas de alumínio. Todas são ações antidumping, sendo que também há avaliação de medidas compensatórias para as chapas de alumínio. A lista de monitoramento de medidas em vigor soma 12 casos.

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Disputas comerciais fazem parte do jogo

Para o estrategista do Banco Ourinvest, Welber Barral, que já foi secretário de Comércio Exterior, essas disputas são naturais e fazem parte do dia a dia dos negociadores comerciais. Para ele, a chave é diferenciar as razões das disputas, que se dividem em três níveis principais: grandes contenciosos muito politizados, medidas de defesa comercial (notadamente ações antidumping ou compensatórias) ou ações ordinárias. “Tem de desdramatizar [essas disputas] porque isso faz parte da dinâmica do comércio internacional”, diz.

Atualmente, as disputas entre Brasil e EUA são mais simples do que no passado, o que se explica pela diminuição do fluxo comercial. O grande caso de uma briga politizada foi a do algodão, e o Brasil venceu um dos processos mais longos da Organização Mundial do Comércio, a OMC (de 2002 a 2014). Não era uma disputa para obter espaço no mercado americano, mas que mirava o mercado global, o que exigia redução dos subsídios dados aos produtores americanos. Outra disputa politizada que ocorreu nos anos 1990 foi a do suco de laranja, tema que voltou a ser alvo de questionamento no âmbito da OMC em 2007.

O cenário da disputa entre os dois países pode mudar nos próximos anos, mas não está tão vinculado assim ao resultado eleitoral. O economista da Funcex e professor da UERJ Mario Cordeiro frisa que para entender a política externa norte-americana é preciso olhar para o que está acontecendo dentro do país. A avaliação dele é de que os EUA vivem um momento de forte polarização política e de lutas identitárias, uma crise interna ocasionada pela pandemia e que impactou o emprego e uma grande disputa por hegemonia com a China – que atualmente é o principal parceiro comercial do Brasil.

“A dimensão maior é o comércio China-Estados Unidos. O Trump fez barreiras que acertaram tanto a China quanto outros países, como o Brasil”, observa. Para ele, isso foi um reflexo de um quadro externo em que houve baixa oportunidade de negócios internacionais, questionamento da dominância do dólar, enfrentamento militar e disputa hegemônica. Essa é uma situação com um ambiente novo, distinto do passado, que pode gerar mudanças nas relações comerciais, independentemente de quem for presidente nos próximos quatro anos.

Para Cordeiro, com Trump ou Joe Biden, ainda continuará a haver um tensionamento interno muito grande acompanhado de uma indefinição do cenário internacional, tanto em função da disputa entre americanos e chineses quanto pelos efeitos da pandemia. A tendência é que algumas questões técnicas permaneçam com o atual entendimento de defesa dos interesses americanos. “Num segundo governo Trump ou governo Biden, o Brasil precisa ter mais atenção à pauta que está sendo negociada em termos comerciais e, sobretudo, em termos culturais”, diz.

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