A infinidade de novos aplicativos e serviços lançados a cada semana para smartphones e tablets tem empolgado não só os usuários destes dispositivos, mas também investidores de todo o mundo. Da noite para o dia e aqui não é figura de linguagem , desenvolvedores que trabalham em garagens ou quartos minúsculos recebem aportes milionários para levar suas ideias adiante, enquanto startups recém criadas são avaliadas em centenas de milhões de dólares pelo mercado. Há mesmo razão para tanto entusiamo? Pois há quem defenda que não e alerte que esta febre pode ter resultados catastróficos para a economia.
O risco de uma nova bolha envolvendo o mercado de tecnologia, como a vivida no início da década de 2000, tem estado presente com frequência na fala de analistas mais pessimistas nos últimos anos, mas ganhou força recentemente. Um dos grandes investidores dos Estados Unidos, o presidente da Greenlight Capital, David Einhorn, chegou a dizer em abril que "há um consenso claro de que estamos testemunhando a nossa segunda bolha de tecnologia em 15 anos". Para Einhorn, o que é incerto é o quanto mais essa bolha pode expandir e o que a fará estourar.
O alerta ganha eco na corrida de empresas do setor para listar papéis no mercado acionário em todo o mundo. Nos primeiros quatro meses do ano, foram feitas 23 ofertas públicas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) de empresas de tecnologia somente nos Estados Unidos, na Nasdaq.
Entre os estreantes está o Weibo, o microblog chinês que viu o valor de suas ações dispararem 19% no dia seguinte ao IPO, fazendo a empresa receber um valor de mercado de US$ 3,5 bilhões. A tese dos pessimistas também foi reforçada com as aquisições bilionárias de serviços com pouco tempo no mercado, como a compra do WhatsApp pelo Facebook, por US$ 19 bilhões, e da Nest, fabricante de termostatos, pelo Google, por US$ 3,2 bilhões valores considerados "duvidosos" por alguns.
Embate
Mesmo assim, dizer que há consenso sobre a existência da bolha está longe de ser verdade. Um grupo robusto de consultorias e investidores defendem que, mesmo havendo uma "empolgação geral" com startups e aplicativos, o que pode levar a avaliações de mercado superestimadas, o cenário atual está longe de lembrar o vivido no final da década de 1990, quando mais de 200 mil pessoas perderam o emprego nos EUA após o estouro da bolha em 2000, o número de IPOs de empresas de tecnologia chegou a 261, contra os 70 estimados até o fim deste ano.
"O otimismo ou oba oba já passou. Estamos num momento de ajuste, no sentido de termos mais empreendedores bons surgindo com grandes soluções realmente interessantes, em vez de vivermos aquele boom de qualquer coisa vale milhões", destaca Marcilio Riegert, CEO da aceleradora de negócios Start You Up.
App Yo não mostrou a que veio, mas ganhou milhões de dólares
O sucesso estrondoso de aplicativos lançados nos últimos anos, como o WhatsApp, Instagram e Uber, incentivou investidores privados a apostar boas quantias em serviços e produtos que prometem "revolucionar" a vida dos usuários. Somente no primeiro trimestre deste ano, fundos de venture capital investiram US$ 9,5 bilhões em 951 empresas norte-americanas, segundo a financiadora MoneyTree. Em geral, os investidores fazem aportes em startups em troca de uma participação no negócio, virando sócios dos empreendedores originais.
O app de mensagens Yo, lançado há cerca de três meses, recebeu US$ 1,5 milhão de investidores célebres, como o fundo Betaworks, que tem no portfólio o Airbnb e o BuzzFeed. O valor de mercado da empresa já é avaliado em US$ 10 milhões. Os aportes chamaram a atenção justamente pela função inusitada do aplicativo. Apesar de se tratar um app de comunicação, é possível enviar apenas uma única palavra, "Yo".
Para os críticos, a empolgação dos investidores com um produto que, à primeira vista, parece tão limitado, é uma prova de que muitas empresas de tecnologia estão sendo superestimadas. Mesmo assim, o número de investimentos continua sendo expressivo, inclusive no Brasil.
Levantamento da associação Anjos do Brasil divulgado nesta semana mostra que os 6.450 investidores anjos hoje existentes no mercado pretendem investir cerca de R$ 339 mil individualmente entre este e o próximo ano, totalizando R$ 2,6 bilhões em intenção. As startups na área de TI e de desenvolvimento de aplicativos são consideradas as mais atrativas.
"Tudo é uma questão de avaliar risco e retorno. Alguns empreendedores não apresentam um negócio, mas sim uma ideia solta. E essa ideia só vira um negócio se for apresentada uma solução para um problema, que pode gerar dinheiro", explica o co-fundador da rede de investidores-anjo Curitiba Angels, Leonardo Jianoti.