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Reforma tributária

Hora das contas: o que está sendo feito para evitar que o Brasil tenha o maior imposto do mundo

Deputados que integram grupo de trabalho sobre a regulamentação da reforma tributária: Hildo Rocha (MDB-MA), Augusto Coutinho (Republicanos-PE), Reginaldo Lopes (PT-MG), Claudio Cajado (PP-BA), Moses Rodrigues (União-CE) e Luiz Gastão (PSD-CE) (Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados)

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As alterações feitas por deputados no substitutivo do projeto que regulamenta a reforma tributária, conduzem, de maneira geral, a uma redução na alíquota padrão dos futuros Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Com isso, o grupo de trabalho que modificou a proposta encaminhada pelo governo espera evitar que a alíquota total de IBS e CBS, somados, seja a mais alta do mundo entre os 174 países que adotam o modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA).

No fim de abril, quando enviou a versão original do projeto de lei complementar (PLP) 68/2024, o Ministério da Fazenda estimou uma alíquota de referência de 26,5% (17,7% do IBS e 8,8% da CBS), com uma margem de variação entre 25,7% e 27,3%

A maior alíquota de IVA praticada hoje é de 27%, na Hungria, segundo dados atualizados em outubro de 2022 pelo Bureau Internacional de Documentação Fiscal (IBFD, na sigla em inglês). 

Com as modificações feitas no substitutivo do PLP, os integrantes do grupo de trabalho estimam que a alíquota pode ficar entre 22% e 25%, afirmou o deputado Hildo Rocha (MDB-MA), antes da apresentação do texto. 

Augusto Coutinho (Republicanos-PE) argumentou ainda que a redução na sonegação de impostos promovida pela mudança no sistema tributário também contribuirá para a redução na carga. 

“Você precisa entender que à medida que a gente conseguir reduzir a sonegação no Brasil, só aí se baixa quatro a cinco pontos percentuais nessa taxa básica. E nós entendemos que o que foi apresentado, com as amarrações que foram feitas, vai ocasionar com que isso aconteça”, disse. “A gente tem a certeza de que a base de arrecadação vai aumentar substancialmente.” 

Entre as inovações trazidas no relatório estão mudanças nas regras do split payment, mecanismo que permitirá a quitação e a distribuição automática da CBS e do IBS a União e entes federativos a partir da efetivação do consumo. 

O substitutivo do grupo de trabalho criou três modalidades para o sistema – “inteligente”, “simplificado” e “manual” –, de modo a compreender todas as formas de pagamento, tanto eletrônicas quanto em dinheiro ou cheque. 

No mês passado, o secretário extraordinário para a Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, já havia defendido que o split payment poderia reduzir em até três pontos porcentuais a alíquota de referência da CBS e do IBS.

Isso porque, além de garantir o crédito ao adquirente do produto ou serviço, o split payment teria papel relevante na queda da fraude, da sonegação e da inadimplência – que compõem o chamado hiato de conformidade, a diferença entre o que deveria ser recolhido e o que de fato vai para os cofres públicos – e, por consequência, no aumento da arrecadação.

O projeto de regulamentação ainda prevê que montante equivalente a até 0,05% da arrecadação do IBS e da CBS possa ser destinado a financiar “programas de incentivo à cidadania fiscal por meio de estímulo à exigência, pelos contribuintes, da emissão de documentos fiscais”. 

O dispositivo, segundo o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), permite a criação de sorteios com premiação em dinheiro para consumidores que exigirem a nota fiscal em seus produtos, como já ocorre hoje em diversos estados. 

“É o velho debate: quando todos pagam, todos pagam menos carga tributária. Nós criamos a cidadania fiscal, 0,05% de prêmio. Vai ser o maior prêmio da loteria brasileira para quem pedir nota fiscal, quem ajudar a combater a sonegação. [Serão] R$ 800 milhões por ano, só da parte da CBS”, disse Lopes. 

“Nós vamos, durante oito anos, anualmente revisitar a alíquota padrão. Depois, de cinco em cinco anos. Eu aposto que nós vamos reduzir já no segundo ano”, afirmou.

Mais itens no “imposto do pecado” e poucas inclusões na alíquota zero

Para evitar uma elevação na tributação geral, o grupo de trabalho que analisou a proposta do governo resistiu a pressões de setores econômicos e optou por não incluir produtos como carnes e sal na cesta básica, que terá isenção dos impostos. Segundo Cláudio Cajado (PP-BA), um dos integrantes do grupo de trabalho, o acréscimo de proteínas animais na cesta elevaria em 0,57 pontos porcentuais a alíquota padrão. 

Como a reforma pretende manter a arrecadação ao fim do processo de transição, quanto maior o número de categorias com alíquota reduzida ou nula, maior tende a ser a cobrança do imposto médio para os demais contribuintes.

A decisão gerou controvérsia. “Já era a esperado que, diante da aplicação de alíquota zero, o número de itens alimentícios escolhido pelo Executivo Federal fosse reduzido. Não obstante, a lista revisada pelos parlamentares também ficou bem aquém do esperado para uma alimentação saudável, sem observância da diversidade regional e cultural da alimentação da população brasileira”, diz Arthur Gurgel, advogado na área tributária do Lavocat Advogados. “A redução de 60% não é adequada para posicionar as carnes e peixes”, avalia.

Os parlamentares cederam em demandas de menor impacto, incluindo entre os bens ou serviços isentos o óleo de babaçu, produtos de saúde menstrual (absorventes íntimos, tampões higiênicos, calcinhas absorventes e coletores menstruais) e a atividade de venda direta com faturamento de até R$ 40,5 mil, os chamados “nanoempreendedores”. 

Por outro lado, foi ampliada a relação de produtos que serão sobretaxados com o Imposto Seletivo (IS), voltado a desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais a saúde ou ao meio ambiente. O relatório agora prevê a taxação com o chamado “imposto do pecado” também de jogos de azar (descrito no texto como “concursos de prognósticos”), fantasy games e veículos elétricos.

A inclusão dos itens também deve gerar polêmica no Congresso. “O legislador ordinário pode escolher quais desses bens ou serviços ele quer tributar, mas não pode tributar aqueles que não se enquadrem dentro desses conceitos [incidência do IS sobre bens ou serviços nocivos à saúde ou ao meio ambiente]”, diz Bruno Teixeira, sócio tributarista de TozziniFreire Advogados. 

“Mesmo assim, o substitutivo incluiu concursos de prognósticos e fantasy games como ‘produto nocivo à saúde ou ao meio ambiente’. Qual é o critério?”, questiona. “Não há problema em o legislador querer tributar algo, mas deve fazê-lo dentro do espectro constitucional. Já na partida estamos errando feio”, comenta.

Economistas como Bráulio Borges, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), defendem a utilização do IS como forma de conter a alíquota padrão do IBS e da CBS. Em estudo publicado em agosto do ano passado, ele destaca que o Brasil arrecada pouco com as chamadas excite taxes na comparação com outros países. 

Enquanto a arrecadação brasileira com tributos de natureza regulatória foi equivalente a 0,9% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019, economias com renda per capita semelhante recolheram mais do que 2%, segundo dados agrupados pelo Banco Mundial.

Definição das alíquotas será feita em um segundo momento

A taxação padrão final a ser praticada no Brasil será estabelecida apenas em um segundo momento. No caso da CBS, caberá ao Congresso aprovar lei ordinária fixando a alíquota base. 

Para o IBS, a definição do porcentual de referência ficará a cargo do Senado Federal e do Comitê Gestor do IBS, formado por representantes dos estados e dos municípios. Os entes federativos, no entanto, ainda terão a prerrogativa de majorar ou minorar o patamar por meio de legislação local.

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