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Comércio internacional

Como a alta nas tarifas anunciada por Trump pode afetar o Brasil

Mesmo antes de se eleger, Trump havia anunciado possíveis alta nas tarifas sobre o México, Canadá e China
Mesmo antes de se eleger, Trump havia anunciado possíveis alta nas tarifas sobre o México, Canadá e China (Foto: Aline Menezes com Leonardo AI)

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Desde sua eleição em novembro, Donald Trump tem gerado expectativas globais sobre a adoção de tarifas comerciais. China, México e Canadá se preparam para reagir, enquanto o Brasil avalia os possíveis impactos nas exportações. Os Estados Unidos são um dos principais destinos das exportações brasileiras.

O mais recente alerta veio nesta semana. Segundo o Wall Street Journal (WSJ), o governo Trump pode considerar a elevação das tarifas para países que utilizam o sistema judiciário para perseguir oponentes políticos. O Brasil poderia ser diretamente afetado por essa medida.

Fontes próximas à equipe do presidente eleito ouvidas pelo WSJ afirmam que a futura administração não viu com bons olhos a demora na resposta de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), ao pedido do ex-presidente Jair Bolsonaro para reaver seu passaporte e comparecer à posse de Trump. A solicitação foi negada nesta quinta-feira (16).

“A pior maneira de o governo Lula iniciar sua relação com a administração Trump é instrumentalizar o governo contra um adversário político”, disse ao WSJ uma fonte próxima ao presidente eleito dos EUA. O Brasil parece ir de encontro a essa visão. Antes da decisão do ministro do STF, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, manifestou-se contrário à ida de Bolsonaro aos EUA, afirmando que a viagem visava atender a um "interesse privado" e não era imprescindível.

Trump se identifica como uma vítima de perseguição judicial nos EUA e vê semelhanças entre sua trajetória e a de Bolsonaro. O WSJ informa que o novo presidente americano está disposto a "usar tarifas comerciais para pressionar o Brasil e outros países" que ele considera estarem usando o sistema judicial para perseguição política.

Cautela diante do risco de possíveis tarifas por parte de Trump

O presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, aponta que o momento é incerto e que é necessário aguardar o início do governo Trump, que toma posse na segunda-feira (20), para diferenciar o que é retórica do que será concreto.

A cautela também está presente entre analistas internacionais. Dani Rodrik, professor de Economia Política Internacional da Harvard Kennedy School, avaliou em artigo para o Project Syndicate que o impacto do aumento das tarifas dependerá não apenas do “escopo e magnitude das tarifas, mas também do propósito para o qual elas são colocadas”.

Mesmo diante da imprevisibilidade das ações de Trump, Castro avalia que, pela relação histórica entre Brasil e Estados Unidos, é pouco provável que o tarifaço seja estendido até o Brasil.

Além disso, essa estratégia seria, a princípio, contraproducente para os EUA, já que teria pouco impacto nos negócios da maior economia global. O saldo da balança comercial entre os dois países, quando não é equilibrado, é superavitário para o lado americano. Em 2024, as exportações brasileiras para os Estados Unidos cresceram 9,2%, chegando a US$ 40,33 bilhões, enquanto as importações aumentaram 6,9%, totalizando US$ 40,583 bilhões. O saldo favorável para os americanos foi de US$ 253 milhões.

Durante o anúncio dos resultados da balança comercial brasileira de 2024, a secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Tatiana Prazeres, afirmou que o saldo favorável aos EUA contribuiria para que o Brasil fosse poupado do aumento tarifário de Trump.

Diante desses resultados, caso elevasse as tarifas para o Brasil, Trump teria impactos pouco expressivos para combater o déficit comercial, um dos principais objetivos que motivariam sua política protecionista. Somente em novembro de 2024, o déficit comercial norte-americano foi de US$ 78,2 bilhões, segundo dados do US Census Bureau e do US Bureau of Economic Analysis.

Dani Rodrik questiona o uso de tarifas elevadas para combater o déficit, argumentando que, como qualquer barreira ao mercado, elas geram ineficiência. As tarifas combinam uma taxa sobre o consumo de bens importados com um subsídio às indústrias locais, podendo ter efeitos ambíguos: enquanto beneficiam algumas indústrias, prejudicam outras que dependem de insumos importados.

Além disso, ele aponta que não há garantia de que os lucros gerados serão direcionados a investimentos, empregos ou maior atividade econômica. Tarifas altas sobre produtos importados geralmente são repassadas ao consumidor, causando inflação. O CEO do J.P. Morgan Chase, Jamie Dimon, comentou recentemente que as atuais e futuras demandas de gastos nos EUA tendem a se refletir nos preços, podendo prolongar a inflação.

Influência chinesa pode aumentar com eventual imposição de tarifas por Trump

O fortalecimento da influência chinesa reduz as chances de tarifas mais altas para o Brasil. “Como maior economia da América do Sul, não interessa aos EUA perder espaço comercial para a China”, avaliou Castro, da AEB.

O gigante asiático é, atualmente, o primeiro parceiro comercial do Brasil. Em novembro, os dois países celebraram 50 anos de parceria comercial. Em 1981, a China era apenas o 38º maior parceiro comercial brasileiro. Chegou à primeira posição em 2009, onde se mantém até hoje.

Ao contrário do que ocorre com os EUA, o saldo da balança comercial com a China é superavitário. A diferença favorável ao Brasil foi de US$ 30,83 bilhões em 2024. Atualmente, as exportações para a China correspondem a 28,1% dos embarques brasileiros e as importações vindas do país asiático, a 24,2% do total comprado pelo Brasil. Já os EUA são destino de 12% das exportações nacionais e a origem de 15,5% das importações.

A consultoria Datagro estima que os embarques de soja e milho brasileiros para a China podem até crescer, caso os EUA elevem as tarifas para o país asiático. São produtos em que os dois países das Américas são concorrentes. Uma das principais preocupações, entretanto, é com a desaceleração do ritmo de expansão do PIB chinês.

A China é um dos principais alvos das políticas de Donald Trump. O país asiático teve, em 2024, o maior superávit da história em todo o mundo: US$ 990 bilhões. O país exportou US$ 3,58 trilhões e importou US$ 2,59 trilhões. Trump ameaçou aumentar a taxação sobre produtos chineses em até 60%.

Uma das avaliações é que a alta na balança chinesa no ano passado já seja reflexo das expectativas do mercado em relação às futuras tarifas para o país asiático, já que cerca de um terço do superávit chinês veio do comércio com os EUA.

Hudson Bessa, professor da Fipecafi, explica que a China baixou o preço de suas exportações, estimulando a ampliação de embarques de mercadorias. Além disso, o país quer expandir o mercado interno, a fim de criar uma dinâmica econômica mais forte.

Impacto das tarifas de Trump: reações globais e estratégias do Brasil

No final de novembro, Trump ameaçou aplicar tarifas de 100% sobre os Brics, caso adotassem uma nova moeda para substituir o dólar nas transações comerciais. Rodrik avalia que países como a China e também a Índia tendem a não mudar seu comportamento frente a essas ameaças, dado os riscos de parecerem fracos no cenário global.

A presidente do México, Claudia Sheinbaum, disse que também aumentaria suas tarifas para produtos americanos, caso os bens e serviços mexicanos fossem sobretaxados por Trump. Ele ameaçou elevar as tarifas para México e Canadá em 25%.

As estimativas são de que a medida traria impactos significativos tanto para a economia americana quanto para a mexicana, devido às amplas relações comerciais entre os países. Atualmente, os EUA exportam US$ 300 bilhões para o México e, em 2023, o estoque de investimentos americanos no país era de US$ 144 bilhões. As análises convergem também para um fortalecimento das relações mexicanas com a China.

A entrada de bens e serviços chineses no México é limitada por regras do Acordo Estados Unidos-México-Canadá (USMCA), que podem vir a ser questionadas em resposta às medidas protecionistas de Trump.

Segundo a Bloomberg, os países têm se adiantado aos anúncios do governo Trump de três formas distintas: esperando as medidas para agir, contra-atacando ou buscando arrefecer a situação. A agência especializada em notícias econômicas e financeiras coloca o Brasil no grupo dos que “esperam para ver”, ou seja, que estão aguardando as medidas para se adaptarem a elas.

A expectativa é de que, caso realmente haja uma alta nas tarifas com o Brasil, os exportadores brasileiros possam redirecionar as vendas para outros mercados, incluindo os asiáticos.

Castro, da AEB, tem ressalvas acerca dessas esperanças e afirma que, na teoria, pode funcionar, mas que, na prática, não necessariamente. “Na teoria, se bloqueia o comércio com um país, abre espaço para outro país. Mas a gente sabe que isso aí é uma coisa de curto prazo. Geralmente acontece, no curto prazo, logo volta ao comércio normal ou deixa de ter uma continuidade”, afirmou.

Bessa, da Fipecafi, afirma que, em um primeiro momento, cada país vai começar a buscar uma saída e que, em um segundo momento, começarão a formar novas alianças e parcerias. Ele avalia que as tarifas mais altas dos Estados Unidos irão reduzir o dinamismo do mercado global, que poderá se recompor a partir de novas relações comerciais, mesmo que não nos níveis atuais.

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