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Produção da indústria do Brasil caiu 1,1% em 2019, após dois anos de avanços.
Produção da indústria do Brasil caiu 1,1% em 2019, após dois anos de avanços.| Foto: Gazeta do Povo

A economia brasileira patinou em 2019, mas conseguiu escapar do vermelho. Projeções do Banco Central estimam que a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) do país no ano passado deve ficar entre 0,9% e 1,2% (os números finais ainda não foram divulgados). O fraco desempenho é resultado de uma série de fatores, entre eles o recuo de um setor fundamental para a retomada do crescimento: a indústria nacional.

Depois de três anos seguidos (2014 a 2016) em que as engrenagens industriais do país pareciam ter sido desmontadas, o setor ensaiou uma reação em 2017 e 2018, com tímida expansão (veja gráfico abaixo). Mas o motor voltou a falhar em 2019 e terminou o ano enguiçado, com queda de 1,1%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística recém-divulgados.

O desastre causado pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG) afetou em cheio a indústria extrativista e foi apontado, em grande parte, como responsável pelo resultado industrial negativo. Somente em dezembro, a atividade industrial caiu 0,7% na comparação com novembro, retração maior que o de 0,5% esperado pelo mercado. Na comparação com o mesmo período de 2018, houve queda de 1,2%. Com essa performance nada boa, a produção da indústria do país ficou 18% inferior à do maior nível alcançado pelo setor, em maio de 2011. O setor voltou ao mesmo patamar de 15 anos atrás, em junho de 2004, segundo análise do banco Goldman Sachs.

A disparidade entre o desempenho da economia como um todo na comparação com a indústria isoladamente evidencia que a máquina industrial do Brasil, ao contrário de alguns argumentos, não depende exclusivamente dos outros setores para acelerar. Demostra que, depende sim de uma série de fatores conjunturais – a recuperação da economia e aumento do nível de emprego, por exemplo, estão na base desses fatores –, mas fica claro também que o setor precisa apertar os seus parafusos internos e reconfigurar seus circuitos produtivos.

O tombo da indústria evidencia ainda que, com o setor manufatureiro pressionando as correias de transmissão da economia em sentido contrário, dificilmente o PIB brasileiro conseguirá saltos elevados nos próximos anos.

Ao alternar períodos no vermelho com alguns anos de crescimento modesto, o setor tem perdido cada vez mais espaço na economia do país. Se em 2004 a participação da indústria representava 28,6% na economia brasileira, em 2018 ficou com apenas 21,2%.

O que provocou o tombo da indústria

“A situação da indústria brasileira é resultado da combinação das incertezas dos últimos anos com um histórico de problemas de competitividade”, diz Marcelo Azevedo, economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Ele cita que, mesmo no período de forte expansão da economia nacional, como em 2010, a indústria não conseguiu competir com o que vinha de fora. “Nós tínhamos capacidade para atender a demanda, mas a importação era muito grande porque o parque industrial nacional não conseguia competir em alguns setores. A indústria do país cresceu naquele período, mas poderia ter crescido mais”, observa.

Para Rafael Cagnin, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento da Indústria (Iedi), uma série de fatores ajuda a explicar o recuo da indústria no ano passado. “Tivemos duas intempéries em 2019. Uma foi no ramo extrativo, devido a Brumadinho, além de problemas climáticos no norte do país. Outro fator importante foi o comércio internacional, com crise na Argentina e a escalada de conflitos internacionais e o crescimento de medidas protecionistas envolvendo principalmente EUA e China, mas também outros países. Houve ainda a saída da Inglaterra da União Europeia”, aponta ao citar a queda do ritmo de crescimento do comércio internacional, que desacelerou de 4% em 2018 para 1,4% no ano passado.

O que precisa ser feito

Para que o motor industrial brasileiro acelere, na avaliação de Marcelo Azevedo, há uma agenda longa a ser percorrida. Entre os itens de destaque dessa agenda, ele cita a reforma tributária – eleita como prioridade número um pelos industriais –, alteração da lógica regulatória, melhorias na infraestrutura e modernização do parque industrial de vários setores que estão ultrapassados, além de avanços na questão dos acordos comerciais internacionais.

“É preciso intensificar a desburocratização, buscar a simplificação. Muitas vezes uma regulação está lá e não tem mais sentido, está lá só para atrapalhar. É necessário haver uma revisão permanente do sistema regulatório. Outro problema é a questão de infraestrutura, de logística. O governo precisa passar o bastão porque não tem condições fiscais para fazer os investimentos necessários nessa área”, defende o economista da CNI.

Na avaliação de Rafael Cagnin, algumas medidas para a indústria encontrar a retomada já foram feitas, mas falta muito. Entre os pontos positivos ele enumera a reforma da Previdência, a queda dos juros e a taxa de câmbio competitiva para quem produz no Brasil. E o que mais precisa fazer? “A reforma fiscal, resolver problemas de infraestrutura e uma agenda industrial que acompanhe o que o resto do mundo está fazendo”, responde.

“Veja a quantidade de vezes que temos queda de energia em São Paulo, por exemplo. Isso aumenta os custos das empresas. A questão da infraestrutura pode alavancar investimentos privados e com isso colocar a economia para girar rapidamente”, explica.

Quanto à agenda industrial, o economista do Iedi defende um reforço nos setores de ciência, tecnologia e inovação. “E aí tem muito o que fazer, desde melhorar a educação, com uma reforma do ensino, acompanhar as tecnologias de ponta – incorporando essas tecnologias ao nosso parque industrial –, além de participar da criação dessas tecnologias. E tem que criar condições para um grupo de indústrias que hoje ainda estão no nível da indústria 2.0 ou 3.0 passem para o nível 4.0. Traduzindo, é a modernização do parque produtivo nacional”, resume ao acrescentar a estratégia de exportação, com foco em produtos manufaturados, os quais tem valor tecnológico mais complexo e maior valor agregado.

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