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Trabalho

Por que o desemprego não é o melhor indicador para avaliar a retomada do mercado de trabalho

Contingente na população ocupada será melhor termômetro para mercado de trabalho no pós-pandemia
População ocupada será melhor termômetro para mercado de trabalho no pós-pandemia. (Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas)

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Um dos piores efeitos da pandemia da Covid-19 no Brasil foi sobre o mercado de trabalho. Em um país onde grande parte da população sobrevive graças ao mercado informal, as restrições sanitárias fizeram esse setor derreter. É verdade que nos últimos meses o mercado formal, com carteira assinada, vem reagindo, conforme apontam os dados do Caged, do Ministério da Economia. Mas, de outro lado, a taxa de desemprego e o número de desalentados – aquelas pessoas que desistiram de procurar oportunidades – batem recordes na série histórica do IBGE.

Outro dado que ilustra a profundidade da retração do mercado de trabalho no Brasil em 2020 é o da população ocupada. A quantidade de brasileiros com alguma ocupação – independentemente do setor – retrocedeu 14 anos e está no mesmo patamar de 2006, de acordo com levantamento de Tiago Cabral, pesquisador da consultoria IDados.

A saída de brasileiros da força ocupada é o que mais preocupa analistas, que recomendam a observação desse indicador para entender os movimentos do mercado de trabalho no período pós-pandemia. Segundo eles, esse dado reflete de forma mais apropriada as mudanças na atividade econômica do que o desemprego, que, por questões metodológicas, reage com mais defasagem.

Taxa de desemprego recorde e aumento do desalento

De acordo com dados da última edição da Pnad Contínua, divulgados pelo IBGE em 27 de novembro e referentes ao trimestre móvel de julho a setembro, a taxa de desocupação no país ficou em 14,6%. É o nível mais elevado da série histórica do instituto, iniciada em 2012. Vale frisar que há dados anteriores, mas com metodologias diferentes. Por isso, para a comparação mais apropriada, o próprio IBGE usa essa delimitação temporal.

De acordo com o IBGE, 14,092 milhões de brasileiros estão sem trabalhar – ou, mais especificamente, estão procurando emprego. Esse número está no mesmo patamar registrado no trimestre móvel encerrado em março de 2017, quando havia 14,105 milhões de desocupados, na esteira da pior recessão já vivida pelo país. O que é mais preocupante em relação aos números de 2020 é a escalada do indicador, que vem crescendo mês a mês, sem sinal de arrefecer.

As incertezas em relação à evolução da pandemia – se esta segunda onda provocará novamente tantas restrições de circulação e como será a retomada da economia – fizeram crescer o número de pessoas desalentadas. São as que desistiram de procurar trabalho.

Por questão de metodologia, as desalentadas não entram na estatística de desemprego, pois esta abrange apenas as que estão buscando emprego. Assim, quanto maior o número de desalentados, menor é o espaço para avanço do indicador de desemprego.

Esse grupo, dos desalentados, alcançou o maior patamar da série histórica da Pnad Contínua: no trimestre móvel encerrado em setembro, eram 5,866 milhões de brasileiros nessa condição.

Uma explicação para esse crescimento passa pela concessão do auxílio emergencial a trabalhadores informais e população vulnerável. Inicialmente em parcelas de R$ 600 e com prorrogação até o fim de 2020 em R$ 300, o benefício deu fôlego financeiro a milhões de brasileiros, que viram sua renda média inclusive aumentar. Essa ajuda, associada à diminuição da atividade econômica, acabou fazendo com que muita gente nem sequer procurasse por trabalho.

Todo esse cenário culminou em um número recorde da população fora da força de trabalho, que engloba aqueles que não estavam trabalhando nem procurando ocupação. Esse contingente chegou a 78,6 milhões no trimestre móvel encerrado em setembro, maior nível da série histórica. São 13,7 milhões de pessoas a mais nessa categoria que no mesmo período de 2019.

Reação do mercado de trabalho será medida pela força ocupada

Esse retrato do mercado de trabalho demonstra quão frágil é a situação atual. Mas, para analistas, o melhor termômetro para avaliar futuras projeções é o número de pessoas ocupadas.

O Banco Fibra, por exemplo, fez esse alerta em relatório enviado em meados de novembro. A explicação é simples: a tendência é de que a taxa de desemprego "real" já seja bem superior à oficial, justamente porque esta última não incorpora as pessoas que desistiram de buscar trabalho – e que eventualmente podem voltar a buscar quando acabar o auxílio emergencial, "inflando" tardiamente o índice de desocupação.

“Esperamos que a recuperação do mercado de trabalho não se refletirá imediatamente na taxa de desemprego, pois parte significativa da população atualmente desempregada deve procurar emprego com a flexibilização do distanciamento social e redução do auxílio emergencial”, diz o relatório, assinado pelo economista-chefe do Fibra, Cristiano Oliveira.

Para o Fibra, “a melhor métrica para monitorar o mercado de trabalho em 2021 será a evolução da população ocupada e não a taxa de desemprego, que reagirá com defasagem”.

O pesquisador Tiago Cabral, da consultoria IDados, já havia feito análise semelhante em artigo no início de novembro. “A intensa movimentação de trabalhadores para a inatividade e queda na taxa de participação nos últimos meses foi um dos principais fatores que evitaram um aumento maior do desemprego durante o período de auge da pandemia”, escreveu.

Na avaliação dele, o melhor retrato da situação do mercado de trabalho está na população ocupada, que está situada em níveis muito inferiores à média da última década. O pesquisador compilou dados desde 1992, que usam informações de pesquisas do IBGE (Pnad Contínua, Pnad e da Pesquisa Mensal de Emprego), e que mostram que esse contingente retrocedeu aos patamares de 14 anos atrás: o dado de agosto de 2020, quando 81,6 milhões de pessoas compunham a força ocupada, é o pior desde 2006.

Porém, o trimestre móvel encerrado em setembro registrou uma leve reação: a população ocupada subiu para 82,5 milhões, de acordo com o IBGE. Ainda é um patamar historicamente muito baixo. O nível de ocupação, que ficou em 47,1% da população em idade de trabalhar, também foi o mais baixo da série.

A analista da pesquisa no IBGE, Adriana Beringuy, observou que a elevação de taxas de desemprego também reflete que, com a flexibilização de medidas de isolamento, mais pessoas estão saindo em busca de uma ocupação. Com isso, monitorar a evolução da população ocupada – que vai indicar quantas pessoas estão de fato conseguindo vaga no mercado – tende a ser um termômetro mais preciso para avaliar a retomada do mercado de trabalho.

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