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Montadoras
Linha de produção da Fiat Toro em Goiana (PE): Stellantis, dona da marca, programa investimentos de R$ 30 bilhões até 2030.| Foto: Divulgação/Stellantis

Um novo ciclo de investimentos das montadoras está em curso. Desde o início do ano, foram anunciados R$ 66 bilhões a serem aplicados até 2032, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). O total divulgado desde o fim do ano passado chega a R$ 86 bilhões (veja detalhes no tópico "Os investimentos que as montadoras anunciaram para o Brasil", mais abaixo).

A prioridade das empresas será a incorporação de novas tecnologias, especialmente veículos eletrificados, híbridos e movidos a biocombustíveis, além do desenvolvimento de novos modelos. "Abriu-se um horizonte ensolarado para a indústria", destaca o diretor de incentivos fiscais da PwC, Frederico von Ah.

Segundo ele, o Brasil adentra plenamente nas novas tendências para a indústria automobilística, que incluem a descarbonização, veículos mais "verdes" e a eletrificação. É um novo cenário para o segmento, que enfrentou momentos difíceis nos últimos anos, marcados pela postergação de anúncios de investimentos em meio a um cenário de inflação e juros altos.

A estratégia das empresas tem como base o programa Mover, lançado pelo governo no fim do ano passado com o objetivo de incentivar a modernização dessa indústria no país. "Fornece mais previsibilidade às empresas e reflete o otimismo das montadoras com o país", destaca o presidente da Anfavea, Márcio Leite.

O Mover foi criado por medida provisória, e dias atrás o governo encaminhou ao Congresso um projeto de lei para substituí-la.

Tecnologias verdes podem impulsionar as montadoras brasileiras

O sócio-líder do setor automotivo da KPMG no Brasil, Ricardo Roa, afirma que o conjunto de investimentos anunciado nos últimos meses impulsiona a indústria brasileira em direção à transformação energética e tecnológica: "É uma tentativa de demonstrar que o país pode ser protagonista nesse cenário".

Um dos marcos desse processo é a eletrificação. Outro é a utilização de combustíveis alternativos, como o etanol e o hidrogênio verde. "Abre-se uma janela de oportunidade para o país", destaca Roa.

Isso ocorre em um momento em que, segundo os especialistas consultados pela Gazeta do Povo, há uma tendência à consolidação do setor e à concentração da produção em poucos países. Também é esperado um maior desenvolvimento de veículos mais globais, a partir de plataformas únicas.

Para Von Ah, as maiores oportunidades do Brasil estão justamente no desenvolvimento de veículos com combustíveis verdes. O país possui uma forte tradição na área desde os anos 1970, com o desenvolvimento do Proálcool e dos motores a combustão movidos a etanol, e, mais recentemente, no início do século 21, com o desenvolvimento do motor flex.

Um estudo feito pela LCA Consultores e MTempo Capital calcula que o país pode ter ganhos de aproximadamente R$ 2,3 trilhões até 2050 caso prevaleça uma rota de descarbonização puxada por motores híbridos, que combinam combustíveis e eletricidade.

Por outro lado, segundo o mesmo estudo, uma aposta em carros totalmente elétricos seria prejudicial ao país e causaria perdas da ordem de R$ 5 trilhões no mesmo período. Isso porque esses veículos não agregam tanto valor no ciclo de produção, e o país não tem uma cadeia produtiva para fabricação de baterias e equipamentos intensivos em insumos básicos e componentes nacionais.

Pressionadas por chinesas, montadoras voltam a olhar para o Brasil

O desenvolvimento das tecnologias de combustíveis alternativos no Brasil fez com que a indústria automotiva voltasse novamente os olhos para o país. "Ele volta a ser protagonista", destaca Roa. Atualmente, o Brasil é o oitavo maior produtor mundial de veículos.

Além da tradição no desenvolvimento de tecnologias para biocombustíveis, uma ajuda extra para estimular a indústria automobilística no Brasil veio da China. Duas montadoras de lá estão entrando com força total no país, a BYD e a Great Wall Motors (GWM). "As empresas já instaladas no país 'balançaram' com o anúncio desses investimentos", diz Marcelo Frateschi, líder da EY para o setor automotivo.

As duas empresas vão ocupar instalações deixadas por montadoras que encerraram a produção de veículos para passageiros no Brasil: a BYD vai construir sua fábrica no antigo terreno da Ford em Camaçari (BA), e a GWM ficará no lugar da Mercedes-Benz em Iracemápolis (SP).

A BYD pretende investir R$ 5,5 bilhões na fábrica baiana. A meta é colocá-la em operação no fim de 2024. Na primeira etapa, a empresa começará com uma capacidade instalada de 150 mil veículos. Inicialmente, serão montados com kits importados da China e a expectativa é que tenham, pelo menos, 25% dos componentes produzidos no Brasil. A intenção é empregar cerca de 10 mil pessoas.

Até 2026, a GWM pretende investir R$ 4 bilhões no país. O dinheiro faz parte de um pacote mais amplo, de R$ 10 bilhões, que deve ser aplicado até 2032. A aplicação de recursos abrange a compra da fábrica da Mercedes, a criação de uma rede de concessionárias, contratação de profissionais especializados e o desenvolvimento e teste de veículos voltados para a realidade brasileira.

Capacidade instalada não deve aumentar

A ampliação da capacidade instalada, por enquanto, está descartada. As empresas instaladas no Brasil podem produzir até 5 milhões de veículos por ano, mas boa parte desse potencial ainda está ocioso: o melhor desempenho foi registrado em 2019, quando foram produzidos 2,94 milhões de unidades.

Os especialistas apontam que, na prática, os novos investimentos vão mudar o perfil da capacidade produtiva. "O objetivo é atender à demanda global por novas tecnologias. A América Latina é um mercado interessante para o desenvolvimento de novas plataformas e, possivelmente, para outros países", destaca Frateschi, da EY.

Uma das intenções é aproveitar o excesso de capacidade ociosa para transformar as unidades em plataformas de exportação para outros países. No ano passado, o país vendeu 403,9 mil veículos para o exterior, de acordo com a Anfavea, 16% menos que em 2022.

Segundo Roa, um dos desafios para o Brasil será a realização de acordos comerciais para viabilizar as exportações. "É necessário impulsionar novas frentes além de Argentina, Colômbia e México, com os quais o Brasil já possui acordos", diz.

Outra frente interessante, na avaliação do executivo da KPMG, seria a Índia. "Lá há espaço para veículos híbridos movidos a etanol", diz Roa. O país é o segundo maior produtor mundial de cana-de-açúcar, atrás apenas do Brasil.

O cenário para um maior volume de exportações brasileiras de veículos não depende exclusivamente da implementação de acordos comerciais, destacam os analistas ouvidos pela Gazeta do Povo. Outra necessidade está relacionada à questão logística. "O que será feito quando o mercado voltar a se aquecer, especialmente no abastecimento do mercado?", indaga Von Ah.

É um panorama que começa a ganhar força diante da queda nos juros, que pode levar a uma retomada do segmento. A produção de veículos cresceu 8,9% no primeiro bimestre em relação ao mesmo período de 2023.

Renovação da frota é afetada por questões macroeconômicas

Outro desafio para a retomada da indústria automobilística brasileira, apontam especialistas, está relacionado à renovação da frota brasileira de veículos. "A redução da ociosidade das fábricas brasileiras também passa por medidas de estímulo à renovação da frota", destaca Roa, da KPMG.

Um estudo divulgado pelo Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) no primeiro semestre do ano passado mostra que, ao fim de 2022, a idade média da frota brasileira era de dez anos e sete meses. É uma situação que se arrasta desde 2012 e que ganhou força em 2019.

Fatores de natureza econômica são os principais responsáveis pela situação. Entre eles estão a redução do poder de compra e o aumento da inadimplência das famílias; aumento da taxa de inflação durante a pandemia e resiliência nos anos posteriores; elevação dos custos de produção; alta dos combustíveis até meados de 2022; e aumento da taxa Selic, que começou a cair somente em agosto do ano passado.

Os investimentos que as montadoras anunciaram para o Brasil

Confira a seguir os investimentos anunciados por montadoras para o Brasil desde o fim de 2023. Os desembolsos da lista abaixo somam R$ 86 bilhões até 2032.

BYD

  • Quanto: R$ 5,5 bilhões
  • Quando: não informado
  • O quê: produção de veículos híbridos e 100% elétricos na antiga planta da Ford, em Camaçari (BA)

Caoa (marcas Chery e Hyundai)

  • Quanto: R$ 4,5 bilhões
  • Quando: até 2028
  • O quê: incrementar a produção das marcas Chery e Hyundai na fábrica de Anápolis (GO) e em planos de eletrificação e produção de veículos híbridos

General Motors

  • Quanto: R$ 7 bilhões
  • Quando: até 2028
  • O quê: renovação da linha de produtos e modernização das fábricas

GWM

  • Quanto: R$ 10 bilhões
  • Quando: até 2032
  • O quê: produção de veículos híbridos na antiga unidade da Mercedes Benz em Iracemápolis (SP)

Hyundai

  • Quanto: R$ 5,5 bilhões
  • Quando: até 2032
  • O quê: desenvolvimento de novas tecnologias para carros híbridos, elétricos e movidos a hidrogênio verde

Nissan

  • Quanto: R$ 1,5 bilhão
  • Quando: até 2025
  • O que: produção de dois novos utilitários esportivos, um deles também destinado ao mercado externo

Renault

  • Quanto: R$ 2 bilhões
  • Quando: até 2027
  • O quê: desenvolvimento de utilitário esportivo de grande porte

Stellantis (marcas Fiat, Jeep, Peugeot, Citroën e RAM)

  • Quanto: R$ 30 bilhões
  • Quando: 2025 a 2030
  • O quê: produção de carros híbridos movidos a etanol

Toyota

  • Quanto: R$ 11 bilhões
  • Quando: Até 2030
  • O quê: reestruturação industrial com o fechamento da fábrica de Indaiatuba (SP) e ampliação da capacidade em Sorocaba (SP) e desenvolvimento de veículos híbridos flex

Volkswagen

  • Quanto: R$ 9 bilhões
  • Quando: até 2029
  • O quê: desenvolvimento de uma plataforma nova para a produção de veículos híbridos a etanol
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