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Para o Ministério da Economia, a “ajuda” da inflação é apenas um dos fatores que explicam a melhora das contas públicas e a queda da dívida.
Para o Ministério da Economia, a “ajuda” da inflação é apenas um dos fatores que explicam a melhora das contas públicas e a queda da dívida.| Foto: Hoana Gonçalves/ME

O Ministério da Economia publica nesta quinta-feira (30) uma nota informativa que aponta como a dívida pública brasileira tem ficado abaixo das projeções do mercado desde o início do governo, em 2019. A divulgação é parte de um esforço da equipe econômica para mostrar que a situação atual e as perspectivas para as contas públicas do país são melhores que as apontadas por muitos economistas.

O documento é publicado no momento em que o Congresso discute, a menos de 100 dias das eleições, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para reconhecer estado de emergência no país e permitir despesas de quase R$ 39 bilhões fora do teto de gastos, principal regra fiscal do país. Articulada com o Executivo, a PEC eleva em 50% o valor do Auxílio Brasil, dobra o vale-gás e cria um voucher mensal de R$ 1 mil para caminhoneiros autônomos.

Em notas e declarações públicas e reservadas, integrantes da pasta têm enfatizado desde o ano passado a diferença entre as projeções do mercado e os resultados efetivos das finanças do governo. Em fevereiro, por exemplo, o ministério apontou que alguns dos principais indicadores fiscais vêm superando as projeções mais otimistas feitas pelo "dream team" econômico do governo de Michel Temer.

"Ajuda" da inflação não é o fator mais importante, diz Economia

Um outro foco de "disputa" com os departamentos econômicos do setor privado está nas causas da evolução do endividamento público, que tem sido mais favorável que a projetada.

Muitos especialistas em finanças públicas afirmam, desde 2021, que a forte alta da inflação é a principal responsável pela redução da dívida em comparação ao tamanho da economia brasileira. O argumento é de que a alta de preços, além de inflar a arrecadação de impostos, tem feito o PIB nominal crescer mais que a dívida, o que leva a uma queda nessa relação dívida/PIB.

Entre 2020 e 2021, a dívida bruta do governo geral aumentou 5,3% em termos absolutos, chegando a R$ 7 trilhões. O PIB nominal, enquanto isso, avançou 16,2%, para R$ 8,7 trilhões – desse avanço, 4,6% foi de crescimento real e o restante, devido à inflação. Com isso, de um ano para o outro a relação dívida/PIB caiu de 88,6% para 80,3%.

O Ministério da Economia, porém, argumenta que a "ajuda" da inflação é apenas um dos fatores que explicam a melhora fiscal, e não o mais determinante.

Segundo o chefe da Assessoria Especial de Estudos Econômicos, Rogério Boueri, há uma "nova dinâmica da dívida", que vem sendo incorporada gradativamente pelas projeções de mercado, e que está relacionada a dois fatores principais.

"Um é o aumento das receitas, e tem vários motivos para isso, como o aumento da massa salarial. Outro fator são as reformas e outras medidas tomadas ao longo dos últimos anos que estabilizaram o gasto e fizeram ele decrescer em relação ao PIB", disse Boueri nesta quinta, em conversa com jornalistas.

"Os novos ganhos de receita não são materializados em novas despesas ou em despesas maiores. E isso tem um efeito sobre o endividamento do país", prosseguiu. Boueri citou a reforma da Previdência, aprovada em 2019, e a redução no quadro de servidores entre as principais medidas de contenção de gastos do governo.

Reportagem da Gazeta do Povo mostrou que, com a não reposição de funcionários que se aposentam, o número de servidores civis do Executivo federal diminuiu em quase 60 mil desde o início do governo de Jair Bolsonaro, uma queda de 9% em relação ao quadro de pessoal que ele herdou de Temer.

Segundo outra reportagem, a redução no quadro de pessoal e o congelamento de salários nos três primeiros anos de governo derrubaram o gasto com pessoal em relação ao PIB ao menor nível em pelo menos 25 anos. E as projeções do governo são de que as despesas com folha e Previdência vão continuar caindo pelos próximos anos.

Sobre o impacto da inflação na redução da dívida pública, a equipe econômica informa que fez uma análise baseada nas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) para as 20 maiores economias do mundo e concluiu que não há correlação entre "surpresa inflacionária" e "surpresa da dívida/PIB".

"Caso no Brasil a revisão de projeções fiscais fosse devida à surpresa inflacionária, seria razoável supor que, nos outros países, se observaria o mesmo. Mas, olhando para dados internacionais, não se verifica esse tipo de correlação", diz o texto do Ministério da Economia.

O chefe da Assessoria Especial de Estudos Econômicos não quis comentar a PEC que está em discussão no Congresso, que amplia gastos em quase R$ 39 bilhões. Disse apenas que os analistas do mercado estão "olhando para essas possibilidades" e que mesmo assim estão melhorando suas projeções para o quadro fiscal. No entanto, a última coleta de projeções para as contas públicas, publicada no relatório Prisma Fiscal, data de 5 de junho, antes do anúncio do pacote de benefícios.

Contas do setor público consolidado voltaram ao azul em 2021; União ainda tem déficit

Tanto a União quanto os estados e municípios melhoram seus resultados primários, isto é, a diferença entre receitas e despesas, sem contar gastos com juros. Esse movimento contribui para conter o endividamento público, uma vez que o superávit primário é usado justamente para pagar os juros da dívida.

O governo federal apresentou sucessivos déficits primários desde 2014. Os saldos negativos explodiram com os gastos extraordinários da pandemia, chegando a quase 10% do PIB no fim de 2020, mas na sequência recuaram fortemente, e a União conseguiu fechar 2021 com déficit primário de 0,41% do PIB. Embora ainda no vermelho, foi o melhor número em oito anos.

Estados e municípios, por sua vez, tiveram superávit de mais de 1,1% do PIB no ano passado, de forma que o setor público consolidado encerrou 2021 com saldo positivo de 0,75% do PIB – nesse caso, foi o primeiro balanço no azul desde 2013.

No acumulado de 12 meses até abril, as contas primárias estavam no azul tanto para o governo federal, que acumulava um discreto superávit de 0,04% do PIB, quanto para as administrações regionais, que exibiam saldo positivo de 1,41% do PIB. O superávit primário do setor público consolidado era de 1,53% do PIB, segundo o Banco Central.

Dados mais recentes, porém, indicam que o governo central voltou ao vermelho. Segundo o Tesouro Nacional, o resultado de 12 meses até maio foi de déficit primário de 0,26% do PIB.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, prometia zerar o déficit primário da União ainda em 2019, no primeiro ano de gestão.

As projeções do mercado e os resultados efetivos da dívida pública

Em janeiro de 2019, a estimativa mediana do relatório Prisma Fiscal, que coleta projeções do mercado para as contas públicas, indicava que a dívida bruta fecharia aquele ano correspondendo a 78% do Produto Interno Bruto (PIB). Porém, em dezembro o indicador efetivo correspondeu a 74,4% do PIB, segundo o Banco Central.

No início de 2020, antes do início da pandemia, o mercado previa que a dívida chegaria a 78% do PIB em dezembro daquele ano. Com os gastos de combate ao vírus, as projeções dispararam e chegaram à casa dos 95% do PIB no segundo semestre, mas o resultado efetivo em dezembro acabou sendo de 88,6%, conforme o BC.

Em 2021, a diferença foi ainda maior. As projeções reunidas no Prisma Fiscal apontavam, no início do ano, para uma dívida de 91% do PIB em dezembro, mas o resultado efetivo foi quase 11 pontos porcentuais menor, de 80,3%.

As projeções para a dívida bruta em 2022 tiveram forte redução em poucos meses. No começo do ano, o mercado projetava uma dívida de aproximadamente 84% do PIB em dezembro. Agora, a expectativa é de 79%. Segundo o último dado oficial do Banco Central, referente a abril, a dívida pública correspondia a 78,9% do PIB.

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