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Economistas liberais ouvidos pela Gazeta do Povo celebraram a vitória de Javier Milei à presidência da Argentina, destacando o acerto da população em apoiar as propostas liberalizantes do candidato vitorioso, em oposição às do peronista Sergio Massa.
Adolfo Sachsida, ex-secretário de Política Econômica e ministro de Minas e Energia no governo Jair Bolsonaro, destaca a mudança da orientação política econômica da Argentina. "A principal proposta de Milei, de extinção do Banco Central chama atenção para a implementação de uma política econômica de menos intervenção estatal e mais livre comércio", afirma.
No entendimento do economista, durante a campanha eleitoral ficou muito clara a solidez teórica de Milei, que vem do pensamento da escola austríaca de economia, elaborada por Ludwig von Mises e Friedrich Hayek. "Na minha avaliação, Hayek foi o maior economista do século 20. É um referencial fabuloso", avalia Sachsida.
Fernando Ulrich, da Liberta Investimentos e mestre em Economia da Escola Austríaca pela Universidad Rey Juan Carlos, destaca que Milei se embasa nos "clássicos" e nos fatos que a experiência econômica demonstra que funcionam.
"O que realmente faz países saírem da pobreza e alcançarem a riqueza, o que elimina a miséria das sociedades são as ideias de redução do Estado, liberdade econômica, empreendedorismo, menos impostos, menos regulações. Não é a concepção do Estado empreendedor, mas das privatizações. Milei quer seguir a receita utilizada em países ricos ao longo dos últimos 100 anos", afirma.
Ulrich, que também é influencer de economia com um canal de mais de 600 mil inscritos no Youtube, conheceu Milei no ano passado, num seminário promovido pelo Fórum da Liberdade, em Porto Alegre.
"Apesar de seu jeito efusivo, intenso e combativo, às vezes agressivo, ele bateu nas causas fundamentais, na raiz dos problemas, com argumentos sólidos, sem bravatas nem caretas. Pessoalmente, é uma pessoa educada, cordial e acessível como outra qualquer, com muita bagagem intelectual", descreveu.
Ronald Otto Hillbrecht, professor de economia e relações internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e especialista do Instituto Millenium, também ressalta a base teórica de Milei. "Ao contrário da maioria dos políticos, ele já leu muita coisa da área liberal, tem boa formação, não só em economia, mas de princípios. As propostas mostram uma visão integrada de sociedade com premissa de liberdade. O jeito extravagante faz parte do teatro político. o que importa é o que ele pensa", acredita.
Na avaliação de Otto, não está claro se o argentino entende ou aprova integralmente as propostas de Milei. "O que se tem certeza é que o povo se convenceu, após 70 anos de fracasso confirmado, que o peronismo não dava mais", resume.
Desafio de Milei será implementar as propostas junto a Congresso hostil
Na avaliação do economista Claudio Shikida, do Instituto Millenium, mais importante que a consistência das ideias de Milei será sua habilidade para implementar um projeto liberal junto a um parlamento hostil. "A eleição representou uma esperança para os argentinos e para a região, mas ele precisa ter habilidade e convencer o Congresso a ajudá-lo, sem renunciar a princípios", diz.
Fernando Ulrich acredita que o programa de Milei é plenamente viável em termos econômicos, mas politicamente vai exigir enorme esforço. "Colocar as propostas de pé para reduzir o tamanho do estado vai esbarrar em dificuldades variadas, entre elas a resistência de grupos privilegiados. O presidente eleito foi o primeiro disposto a enfrentar este desafio".
Shikida acredita que se tomar uma posição mais equilibrada, Milei pode até convencer os peronistas e kirchneristas a apoiá-lo como forma de sobrevivência política. "O Congresso sabe que não pode continuar fazendo mais do mesmo que levou à Argentina a situação de miséria atual", diz.
Estabilidade macroeconômica deve ser prioridade do novo governo
Entre os economistas há consenso que o primeiro passo deve ser a estabilização macroeconômica, com ataque à inflação que chega a mais de 142% ao mês. Neste ponto entra a dolarização e a extinção ou readequação do Banco Central, que vão exigir planejamento e competência na execução.
Em relação à dolarização, Ulrich explica que o processo depende de um diagnóstico a ser dado pelo Banco Central: "Não se sabe quantas de reservas em dólares o BC tem de fato. É preciso ver se tem viabilidade. O BC teria de resgatar a base monetária e todo o passivo do país para converter em dólares, ou seja, usar seus ativos para pagar os passivos e fazer o peso deixar de circular. Não é tarefa simples".
Sachsida diz que não está claro que tipo de dolarização será feita. "Não sabemos como isso será operacionalizada. Até agora só tivemos o debate de ideias. Tudo isso deverá ser materializado num projeto de lei, num regulamento para levar as ideias ao plano concreto".
O que se sabe é que não poderá ser feita como no passado, com câmbio fixo. "Num primeiro momento, a conversão do peso enriqueceu todo mundo. Quando o cambio foi ajustado, o efeito foi inverso", lembra Sachsida. "A dolarização de Milei, certamente será mais sofisticada."
A extinção do Banco Central é vista com ceticismo pelos especialistas. "O provável é que ele adote um sistema de BC independente, como no Brasil, para blindar o órgão da classe política", acredita Otto.
Liberais, libertários e anarcocapitalistas
Milei se define como "liberal libertário", o que gerou estranhamento entre os grupos. "Foi a primeira pessoa que vi se definir assim", diz Ulrich. "Acho que foi uma forma de deixar mais claro que ele é liberal no sentido clássico e não americano do termo". Nos EUA, os democratas e progressistas são identificados como liberals.
Sachsida explica que liberais e libertários têm uma base comum de valores, entre eles a liberdade individual, a propriedade privada, o livre comércio. "O liberal clássico vai perseguir as pautas liberais de maneira mais gradativa. Controlar a inflação por meio do Banco Central e da taxa de juros para impedir o déficit público", explica.
Para o libertário, controlar o deficit publico é importante, mas querem fazer por meios mais rápidos. "Por exemplo, acabando com o monopólio do governo da emissão de moeda", explica. Já os anarcocapitalistas consideram a existência do Estado como amoral, por princípio. Algumas correntes são mais pragmáticas e defendem o Estado mínimo, chamadas minarquistas.
Para os adversários, no entanto, Milei tem outros rótulos, entre eles, "ultradireitista" "extremista de direita" "ultraliberal de direita" e "radical de direita". Na imprensa, as alcunhas também são utilizadas. "A imprensa tem o hábito de rotular pessoas, sobretudo quando ela não consegue entender do que se trata. Nunca vi a imprensa chamar um candidato de 'ultraesquerdista', mesmo pertencente a partidos radicais."
Para Ulrich, existe uma simplificação dos conceitos geralmente para "ridicularizar ou classificar como alguém mais radical. Geralmente quem usa a alcunha ultra radical é quem não entende as consequências lógicas da teoria libertária", salienta.
Shikida diz que os adjetivos são uma forma de "estigmatizar os adversários por parte de uma esquerda que não admite o contraditório".
Otto também considera os rótulos pejorativos. "Na minha época, minhas referencias de extrema-direita eram nazismo e fascismo; Sistema onde o governo é forte, domina os sindicatos, diz aos empresários o que fazer, faz política industrial. Tudo ao contrário do que prega Milei. Aliás, quem tem origem fascista é o peronismo", resume.