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Caso a proposta de reforma tributária, aprovada na Câmara dos Deputados no dia 7, passe também no Senado, um dos setores mais impactados com aumento de carga tributária deve ser o de serviços. Preços praticados por companhias que atuam por meio de plataformas digitais, como os provedores de streamings Netflix, Spotify, Amazon Prime e Disney+, e de aplicativos de transporte, como Uber e 99, e de delivery, como iFood, poderão aumentar.
O eixo central da reforma é a adoção de um sistema de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual. Passam a vigorar o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) no lugar do ICMS estadual e do ISS municipal; e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que substitui três tributos federais: PIS, Cofins e IPI.
Atualmente, as alíquotas médias pagas pelas empresas do setor de serviços digitais são de até 5% de ISS, dependendo do município, e de 3,65% de PIS/Cofins. Embora precise ser definida por meio de lei complementar, a previsão é que a alíquota de referência do IBS e do CBS seja inferior a 30%. Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), braço do Ministério do Planejamento, estima a alíquota em 28%.
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“Essa reforma foi predominantemente para a prestação de serviços, que vai ser de longe o setor mais afetado”, diz Mariana Ferreira, advogada tributarista do Murayama Affonso Ferreira e Mota Advogados.
Ela ressalta, no entanto, que a discussão não está encerrada, uma vez que tanto na tramitação no Senado pode haver inclusão dos serviços digitais no rol de setores com redução de 60% na alíquota do IVA.
É o que pedem associações e federações ligadas ao setor de serviços digitais, TI e internet. Um manifesto foi divulgado por entidades como a Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro), Associação Brasileira de Internet (Abranet), Federação Nacional das Empresas de Informática (Fenainfo), Associação Catarinense de Tecnologia (Acate) e Sindicato de Empresas de Internet do Estado de São Paulo (Seinesp).
“Supondo uma alíquota de referência de 25% de IBS e CBS, a aprovação da reforma, representaria uma elevação de 189% da carga tributária do setor no melhor cenário – visto que milhares de empresas do setor estão sediadas em municípios que tem a alíquota de ISS fixada em 2% (o que representaria uma elevação da carga tributária em 342%) e que a alíquota final de referência pode de vir a ser mais elevada”, dizem as entidades.
Já a Câmara Brasileira de Economia Digital (camara-e.net) publicou nota em que defende a adoção de um teto para o aumento de carga tributária do setor de serviços como forma de “assegurar a sua competitividade e empregabilidade, sem criar complexidades na estrutura do IVA”.
“A camara-e.net reforça a importância de que as demais proposições legislativas da reforma tributária permitam a amenização do impacto do IVA sobre o setor de serviços, seja por uma política ampla que desonere o emprego ou pela criação de possibilidades adicionais de créditos tributários”.
Principal entidade brasileira a reunir empresas da chamada economia digital, a camara-e.net representa as principais empresas de tecnologia e varejo digital do país, o que inclui representantes de Google e Facebook, Amazon, iFood, Mercado Livre e OLX, por exemplo.
O Ministério da Fazenda diz que a reforma tributária pode ter impacto em serviços digitais como streamings e aplicativos de transporte e entrega de comidas, mas que a redução do preço da energia elétrica, que seria gerada pela mesma emenda constitucional, compensaria os aumentos, resultando em pouco impacto para o consumidor final.
Assespro, Abranet, Fenainfo, Acate e Seinesp, no entanto, afirmam que o aumento de carga tributária impactará negativamente o crescimento do setor de serviços digitais, TI e Internet nacional, ao enfraquecer e retirar competitividade das empresas que operam e contribuem para levar o país para um futuro tecnológico, “muitas delas fadadas à extinção, ocasionando a perda de empregos diretos e indiretos, um prejuízo que não é apenas econômico, mas também social”.
“Além disso, a alta tributação sobre folha de pagamentos (insumo que não gera crédito) se colocará como um desestímulo à produção e ao desenvolvimento de softwares, serviços domésticos, inovação, contratação de funcionários celetistas, além e demissões em larga escala, gerando, inclusive, prejuízos à previdência social”, diz um trecho do manifesto assinado pelas entidades.
Eduardo Nehme, advogado tributarista do Caputo, Bastos e Serra Advogados, acredita que, ainda que o efeito econômico final da reforma seja neutro para os consumidores, alguns setores devem sair favorecidos e outros prejudicados ao final da reforma.
“O debate que se apresenta é se o Brasil pretende aumentar a tributação sobre os serviços online – um setor estratégico, intimamente ligado à inovação e com tendência de se tornar cada vez mais presente no cotidiano, especialmente com a popularização do acesso à internet e com o crescente número de produtos físicos com serviços de internet integrados”, diz Nehme.
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