Um dos elementos mais tradicionais do período eleitoral brasileiro terá sua largada nesta sexta-feira, dia 26: o horário político com transmissão em cadeia de rádio e televisão. Neste ano de 2022, as propagandas serão exibidas até 29 de setembro, no primeiro turno, e de 7 a 28 de outubro, no segundo turno.
Os programas eleitorais chegam ao período atual sob questionamentos em torno de sua relevância, já que o Brasil é um país cada vez mais pautado pela internet e menos por emissoras de rádio e TV. Por outro lado, candidatos e especialistas ainda enxergam peso no horário eleitoral e o consideram como algo que não pode ser deixado de lado.
A veiculação da propaganda partidária obrigatória acontece no Brasil desde a década de 1960. De lá até os dias atuais, foram muitas modificações no formato. Por um período dos anos 1970, durante a ditadura militar, as propagandas se resumiam a mostrar a foto e um breve currículo do candidato. Após a redemocratização, elas chegaram a ter mais de uma hora de duração. O formato atual contempla sessões de 25 minutos e propagandas "isoladas" exibidas durante a programação regular das emissoras.
A eleição de 2022 definirá os ocupantes dos cargos de presidente da República e vice, governadores e vices, senadores e deputados federais, estaduais e distritais. Todos os cargos terão as candidaturas exibidas no horário eleitoral. As campanhas de presidente e de deputado federal serão veiculadas às terças, quintas e sábados. Já as dos demais cargos, às segundas, quartas e sextas. No domingo não haverá exibição do horário eleitoral em bloco, apenas as propagandas em meio à programação.
"Conflito" com internet não é novidade
O quadro em que a relevância do horário eleitoral é discutida por conta da ascensão da internet não é exatamente novo. Há cinco anos, em 2017, o então senador Paulo Bauer (PSDB-SC) apresentou um projeto de lei sugerindo a extinção do horário eleitoral gratuito. O ex-parlamentar justificava que a sistemática não fazia mais sentido em um mundo cada vez mais influenciado por smartphones, redes sociais e serviços de streaming.
A eleição de 2018 acentuou a impressão. Na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro foi eleito tendo para sua campanha um espaço quase nulo no horário eleitoral – enquanto Geraldo Alckmin, então no PSDB, contou com tempo de sobra e somou menos de 5% dos votos válidos no primeiro turno.
Neste contexto, a disputa de 2022 pode resgatar parte da importância do horário eleitoral que parecia perdida em anos anteriores. A campanha de Bolsonaro, que tentará a reeleição, é prova disso. O PL planeja profissionalizar as propagandas do presidente e dar ao horário eleitoral uma abordagem bem distinta da utilizada por Bolsonaro em 2018.
Além disso, a composição das coligações partidárias tem o horário eleitoral como um dos fatores levados em conta pelos partidos. Candidatos buscam legendas com mais acesso à TV para "encorpar" os programas e assim garantir mais uma arma na disputa política.
O publicitário Marcelo Vitorino, especializado em campanhas eleitorais, reconhece que o horário eleitoral já teve mais peso, mas não descarta sua importância. "O horário político perdeu um pouco de seu protagonismo para uma parcela considerável da população, que hoje utiliza mais a internet como meio preferencial para se informar, mas ainda assim tem muita relevância, por ser o meio mais abrangente e democrático, chegando a quase todos os domicílios brasileiros. É seguro afirmar que a televisão é o melhor meio para dar conhecimento e a internet o melhor para engajar", explicou.
O caso de Bolsonaro em 2018, segundo Vitorino, não pode ser interpretado apenas como uma "vitória da internet". Na avaliação do publicitário, Bolsonaro "usou a mídia tradicional para gerar conteúdos que foram explorados na internet". Além disso, para Vitorino, a facada sofrida pelo então candidato em Juiz de Fora fez com que seu nome fosse muito citado pelos jornais de maior audiência, o que garantiu a divulgação de seu nome.
O que candidatos pensam sobre horário eleitoral na TV
O candidato do PL ao governo da Bahia, João Roma, aposta mais na força da internet para 2022. "Com a popularização dos smartphones, as redes sociais estão na palma da mão. É nelas onde mais se concentra atualmente a atenção das pessoas. Muitas vezes o conteúdo do rádio e da TV não é visto da forma tradicional, mas na telinha do celular, circulando na rede", disse.
"O fenômeno Bolsonaro em 2018 se deu pelas redes sociais e ele hoje é o presidente da República", acrescentou Roma, que é apoiador do chefe do Executivo. O candidato, porém, ressalvou que "rádio e a TV têm certo peso ainda".
Já o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), que é candidato à reeleição, vê no horário eleitoral uma demonstração da força das candidaturas. "O tempo em rádio e TV reflete o apoio partidário de cada coligação. Esse tempo é importante para que as candidaturas cheguem ao maior número de pessoas possível, já que existe uma parcela da população que tem esses meios como principais formas de acesso à informação", destacou.
Casagrande concorre a mais um mandato apoiado por uma coligação que une 10 partidos, além do seu PSB: MDB, PP, Pros, Podemos, PT, PCdoB, PV, PSDB, Cidadania e PDT.
Membro do PSDB e candidato ao governo do Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel avalia como "difícil" quantificar a importância do horário eleitoral para as campanhas atuais. "Ainda assim, considero que não há risco de as redes sociais esvaziarem o horário político de rádio e TV, porque há um hábito muito arraigado entre nós de assistir ao noticiário televisivo e radiofônico. De qualquer forma, quanto mais canais de comunicação os candidatos têm com o eleitor, melhor para a democracia", ressaltou.
Gratuito para quem?
O "gratuito" que faz parte do nome completo do horário eleitoral diz respeito ao fato de que os partidos políticos não pagam para veicular seus programas nas emissoras de rádio e televisão. O modelo concede o horário de graça aos candidatos, e é assim de modo exclusivo: ou seja, existe o direito de ocupar de graça a cadeia de rádio e TV, e é proibido pagar para ter mais espaço do que o previsto em lei.
"Mas isso não é gratuito para todos. Porque quem paga, no fim das contas, é a própria população, por meio dos impostos, já que existe isenção e dedução tributária por parte das emissoras que fazem essa veiculação desse conteúdo", explicou o advogado Renato Ribeiro, especialista em direito eleitoral.
A legislação brasileira determina a veiculação da propaganda em emissoras abertas de rádio e TV, mas a obrigatoriedade não é expandida aos jornais e nem a veículos que operam exclusivamente pela internet, o que inclui rádios e televisões online. O motivo, segundo Ribeiro, é o sistema de concessões que vigora no Brasil – aqui, as ondas de rádio e TV são administradas pelo poder público, que pode conceder frequências a interessados.
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