A chamada "janela partidária" abre oficialmente no dia 3 de março, mas suas implicações já estão em ampla discussão entre os deputados federais. "A eleição começa a se resolver este mês com os quadros de filiação. O assunto principal de dez em cada dez deputados é para onde vai e com quem irá coligar. Ninguém trata de outro assunto", diz uma liderança do Centrão.
A janela partidária é o período para que deputados federais, estaduais e distritais possam mudar de partido sem risco de perder o mandato. Diferentemente de senadores, governadores e do presidente da República, que são eleitos pelo sistema majoritário e podem mudar de legenda a qualquer momento sem ônus eleitoral, deputados são eleitos pelo sistema proporcional e seus mandatos são do "partido".
O prazo para que os deputados decidam se permanecem ou deixam seus partidos se encerra em 1º de abril e toma muito a atenção dos parlamentares. É o momento que eles têm para escolher um presidenciável para apoiar, avaliar o melhor arranjo eleitoral em suas bases e, assim, negociar seu capital político e mandato com outras siglas ou apresentar uma "contraproposta" à sigla atual.
Com 33 partidos existentes e 513 deputados só no Congresso Nacional, a "oferta e demanda" provoca uma intensa articulação nos bastidores. Contudo, é comum que as legendas com representatividade na Câmara, sobretudo as mais numerosas, se sobressaiam durante a janela partidária.
Por isso, os holofotes estarão sobre as legendas que, atualmente, têm 25 ou mais deputados federais. Ao todo, 11 se enquadram nesse perfil e, somadas, elas têm 406 assentos na Câmara, ou seja, quase 80% de toda a Casa: PSL, PT, PL, PP, PSD, MDB, PSDB, Republicanos, PSB, DEM e PDT.
Ao fim da janela partidária, a expectativa natural é de que algumas legendas cresçam mais do que outras, embora a grande maioria das 11 principais entendem que vão manter, ao menos, seus números atuais.
Como ficarão os partidos da base do governo após a janela partidária
Com 43 deputados federais, o PL, partido do presidente Jair Bolsonaro, é, atualmente, a terceira maior bancada na Câmara. Ao fim da janela partidária, a meta é filiar até 25 deputados federais. A cúpula do partido considera a meta ambiciosa, mas possível, por ter Bolsonaro como principal ativo eleitoral.
Por sinal, 25 é equivalente ao número de aliados da base "raiz" de Bolsonaro que ainda estão filiados ao PSL e deixarão a sigla. A maioria dos aliados afirma que acompanhará o presidente, mas alguns ainda sondam outras ofertas de partidos que compõem a base, a exemplo do PP, comandado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, e o Republicanos.
Outros deputados da base governista também podem vir a integrar o PL, o que leva o partido a fazer as contas de chegar a 68 deputados. A avaliação na legenda é de que, após a desfiliação do deputado Marcelo Ramos (PSD-AM), vice-presidente da Câmara, o partido não terá muitas baixas na janela partidária, o que leva a cúpula a esperar por um saldo final acima de 65 deputados.
O PP, que tem 42 deputados, também tem expectativa de crescimento. Não ao patamar do PL, mas deputados próximos de Ciro Nogueira afirmam que o partido possa filiar seis deputados federais, o que levaria a bancada a 48 deputados. A deputada federal Margarete Coelho (PP-PI) crê que, à exceção de São Paulo, não há expectativa de desembarques do partido.
A eleição do deputado Guilherme Mussi (PP-SP) para mais um mandato à frente do diretório paulista não agradou alguns quadros do partido no estado, como Fausto Pinato e Capitão Derrite. Pinato quer que o partido apoie localmente a candidatura do ex-governador Márcio França (PSB) e Derrite deseja apoiar a candidatura do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas. Já Mussi quer apoiar o atual vice-governador paulista Rodrigo Garcia (PSDB).
Existe uma expectativa de que Nogueira busque acalmar os ânimos e dialogar com a bancada do PP em São Paulo. "Acho que, até lá, o Ciro contorna isso porque são colegas muito queridos, o problema deles é só de viabilizar chapa", afirma Margarete. Um outro deputado do partido analisa que um acordo é possível, mas acha difícil Nogueira atropelar a decisão final de Mussi.
Republicanos tenta controlar racha sobre decisão de apoio à reeleição de Bolsonaro
Integrando a base do governo no Congresso há pelo menos dois anos, o Republicanos enfrenta um racha interno sobre o apoio à reeleição do presidente Bolsonaro. Integrantes da cúpula trabalham para contornar possíveis debandadas durante a janela partidária e não descartam optar pela neutralidade no primeiro turno da disputa presidencial.
Ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, o Republicanos conta atualmente com 31 deputados. A expectativa, segundo o presidente do partido, deputado Marcos Pereira (SP), é que este número chegue a 40 parlamentares em 2022.
Para evitar possíveis debandadas, o partido deve liberar seus diretórios estaduais. Isso porque alguns nomes da sigla, principalmente no Nordeste, pretendem apoiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), enquanto outros parlamentares sinalizam apoio ao ex-ministro e ex-juiz Sergio Moro (Podemos). Chefe de gabinete de Marcos Pereira e ex-presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Guto Ferreira, por exemplo, irá integrar a equipe de campanha de Moro.
“O partido não deve dar nenhum apoio oficialmente a nenhum candidato à Presidência, ou seja, não daria tempo de televisão e de rádio para ninguém. Agora em fevereiro o partido vai iniciar um debate sobre as eleições de 2022", defendeu o deputado Silvio Costa Filho (PE).
Qual é a expectativa em torno dos partidos independentes na janela
A janela partidária vai evitar que o União Brasil, o partido que surge da fusão entre PSL e DEM, seja a maior legenda do país. Juntos, eles começariam a janela com 81 deputados, 55 do PSL — a maior bancada da Casa — e 26 do DEM.
Mas com uma debandada prevista de 25 a 30 deputados no PSL e de dez no DEM, o União Brasil vai encolher significativamente segundo os cálculos do deputado Júnior Bozzella (PSL-SP), vice-presidente do partido. A expectativa dele é de filiar em torno de dez deputados, o que deixaria o União com um saldo final entre 51 e 56 parlamentares.
Se atingir o objetivo, é possível que o União fique com a segunda ou terceira maior bancada da Câmara, atrás de PL e, talvez, o PT. Nas eleições, ela credita que seja possível eleger uma bancada de mesmo tamanho, mas pondera que, para a próxima legislatura, poderia fazer até 70 deputados, caso a legenda conseguisse filiar Sergio Moro (Podemos), pré-candidato à Presidência da República.
"Se ficarmos sem a candidatura do Moro e neutros na eleição, a expectativa seria, ao menos, manter esse número. Sem um candidato competitivo, não acredito que vamos fazer 70 deputados, então, entre 50 a 60 deputados é um número factível", pondera Bozzella, que capitaneia as negociações pela filiação de Moro.
O vice-presidente do PSL afasta a possibilidade de uma federação partidária com o MDB e sustenta que o foco do partido é ter uma lista partidária única. "Conversa com o MDB sempre existiu, a gente juntou as fundações para fazer um programa de país, o [Luciano] Bivar [presidente do PSL e do União Brasil] falou com o Baleia [Rossi, presidente do MDB], mas nenhum partido grande vai fazer federação", crava Bozzella.
O líder do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões Jr. (AL), diz que o diálogo sobre uma possível federação com PSDB e União Brasil é embrionário e o partido mantém articulações internas para elevar a bancada. "Federação todos podem conversar com todos, é uma construção mais complexa que depende dos arranjos nos estados e a questão de ideologias dos partidos", pondera. "Estamos trabalhando para ampliar a bancada, devemos ter novas adesões e, logicamente, podemos ter novas baixas", reconhece.
Entre baixas e novas adesões, o saldo final previsto para o MDB, que tem 34 deputados, é de crescimento, avalia o líder emedebista. "Eu acho que a bancada ficará maior, mas ainda está cedo para trabalhar com número. Essas decisões são tomadas aproximando ao limite do prazo. Como já temos alguns nomes que estão definidos no partido, três a quatro deputados que devem aderir, estamos conversando no dia a dia", explica.
Ser o partido com maior capilaridade nos municípios e ter uma pré-candidata, a senadora Simone Tebet (MDB-MS), também leva Bulhões Jr. a crer que o partido possa ser beneficiado na janela partidária. "Não tenho dúvidas que sim, tanto pelo comportamento da direção nacional e das direções interiormente, respeitando as realidades regionais, mas sem dúvida nenhuma a capilaridade faz com que sejamos, agora na janela, uma das opções a ser avaliada por vários parlamentares", pondera.
O PSD, partido que tem 35 deputados, acredita que possa encerrar a janela partidária com um saldo de 40 parlamentares, diz o deputado Darci de Matos (PSD-SC), vice-líder do partido e vice-líder da maioria na Câmara. Ele destaca que o presidente do partido, Gilberto Kassab, busca emplacar uma candidatura de terceira via e, com isso, estimular uma filiação grande de deputados e a eleição de uma bancada maior para a próxima legislatura.
"A única certeza que temos é que não há a possibilidade de apoiarmos o Lula no primeiro turno. Ou vamos ter a terceira via, ou é possível que o partido libere as bancadas nos estados. O PSD tem tudo para crescer na janela e queremos eleger, no mínimo, 50 deputados e até 20 senadores. Muitos querem vir para o PSD, que é um partido equilibrado, de centro, que tem defendido a agenda do governo e o Brasil", destaca.
O que esperam os partidos de oposição na janela partidária
No campo da oposição, o PT, que tem 53 deputados e a segunda maior bancada da Câmara, e o PSB, que tem 30 deputados, estão mais engajados em discutir uma federação partidária. É um dos motivos pelo qual não se fala em projetos pessoais em ambas as legendas.
O líder do PSB, Bira do Pindaré (BA), por exemplo, diz que a sigla ainda não tem um balanço sobre o saldo que o PSB pode atingir entre novas adesões e possíveis desfiliações ao fim da janela partidária.
A previsão no PT também é de começar a planejar suas listas partidárias somente após findadas as tentativas de construir uma federação partidária. O principal objetivo do partido com a o instrumento eleitoral é retirar a concorrência dos demais partidos de esquerda e sacramentar a candidatura do ex-prefeito paulistano Fernando Haddad (PT) ao governo de São Paulo.
Nos próximos dias, o PT vai promover um encontro entre a atual bancada da Câmara, com membros de movimentos petistas. O objetivo é engajar os atuais parlamentares com possíveis candidatos do partido que, a partir de 2023, poderão reforçar a bancada. A meta é ampliar o número de alianças na Câmara e garantir governabilidade para uma possível gestão Lula.
Já no PDT, que tem atualmente 25 deputados, a previsão é de encerrar a janela partidária com um saldo de queda. O deputado Eduardo Bismarck (PDT-CE) diz que irão se desfiliar os deputados Alex Santana (BA), Flávio Nogueira (PI) e Marlon Santos (RS) e acredita que mais outros três podem deixar a sigla. "Vamos ficar com algo entre 19 e 20 deputados dos eleitos em 2018", diz.
Contudo, Bismarck acredita que outros deputados possam se filiar ao PDT pelo projeto em torno da candidatura de Ciro Gomes à Presidência. A perspectiva é de eleger algo em torno de 27 ou 28 deputados, a mesma eleita há quatro anos, e de aumentar a bancada no Ceará, a base de Ciro.
"A perspectiva é de fazer bancada na mesma proporção que fizemos na eleição passada. Se a candidatura do Ciro emplacar no primeiro turno, há possibilidade de se fazerem ainda mais deputados, ultrapassar os 30. Mas acredito que possamos começarmos o ano que vem com 28 deputados, podendo chegar a 30, e aqui no Ceará mesmo vamos aumentar. Elegemos seis, em 2018, e vamos eleger oito este ano", diz.
Janela partidária pode reduzir pela metade o PSDB
Rachado desde as prévias que declarou o governador de São Paulo, João Doria, como pré-candidato á presidência, o PSDB pode perder metade da sua bancada de 32 deputados durante a janela partidária. Nos cálculos, integrantes da sigla acreditam que o ninho tucano terá entre 12 e 17 deputados.
Entre as baixas, a deputada federal Rose Modesto (MS) vai se filiar ao União Brasil para se candidatar ao governo do Mato Grosso do Sul. Modesto pleiteava ser a candidata à sucessão do governador Reinaldo Azambuja (PSDB), mas acabou sendo preterida pelo partido. “Estou saindo pela porta da frente do PSDB”, garantiu a deputada.
Além disso, parlamentares ligados ao governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, candidato derrotado nas prévias tucanas, também devem deixar o PSDB na janela partidária. Leite chegou a receber convite para se filiar ao PSD e entrar na disputa pelo Palácio do Planalto, o que ajudaria na movimentação dos parlamentares gaúchos.
Paralelamente, Doria tem buscado quadros de outros partidos como Podemos e do MDB nos estados do Sudeste. O objetivo, de acordo com aliados do tucano, é filiar parlamentares do dois partidos e recompor a bancada do partido. Em outra frente, a cúpula do PSDB negocia com o Cidadania a criação de uma federação.
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