Candidato à prefeitura de Florianópolis nas eleições 2024, Rogério Portanova (Avante), 66 anos, defende uma democracia radical, que inclua plebiscito e referendo, para que a comunidade escolha onde quer aplicar os recursos públicos em sua própria região: na construção de uma escola, de um posto de saúde ou no calçamento de ruas, por exemplo.
“As pessoas vão participar de acordo com o orçamento que se tem para aplicação naquela região, naquele bairro. O que se faz hoje é 'nós vamos fazer 30 creches', sendo que acabam fazendo creche em lugar que já tem creche demais e não tem um posto de saúde. Então essa é a democracia radical: você não só escuta, mas deixa que a população delibere, sempre mostrando que também não é um plano populista, que tem uma limitação de orçamento e que no orçamento vão ter algumas escolhas que a população tem que fazer”, explica o candidato em entrevista à Gazeta do Povo.
Portanova é professor universitário e tem histórico de luta pelo meio ambiente e pela sustentabilidade. É um dos fundadores do Partido Verde no Brasil e chegou a presidir a legenda em Santa Catarina. Em entrevista à Gazeta do Povo, o candidato falou ainda sobre a proposta para a área da saúde pública, com foco na medicina da família e na prevenção, e para a mobilidade urbana, em que ônibus de qualidade e transporte por bicicletas serão prioridade.
Todos os candidatos à prefeitura de Florianópolis foram convidados pela reportagem da Gazeta do Povo para a entrevista.
Leia a entrevista com Portanova
Candidato, o senhor cadastrou no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma síntese inicial do plano de governo. O senhor tem algum plano de governo mais completo, em que explique suas propostas para a cidade?
Tenho e se quiser eu posso te passar. Ele está em (documento de) Word e agora ele foi para o pessoal que faz a arte, para deixar ele bonitinho, com símbolo do partido, colorido, mas ele está elaborado.
Nessa síntese de plano de governo, o senhor fala que um dos princípios do seu governo, se eleito, é de democracia radical. O que o senhor entende por democracia radical?
Nós poderíamos dizer que nós temos uma democracia que é chamada democracia material, que são os elementos dados para a participação democrática. Por exemplo, eleições a cada quatro anos, depois eleições a cada dois anos, e o funcionamento das instituições. Então quando isso tudo está funcionando é uma democracia formal, com eleições, pluralismo partidário, diferentes pensamentos, alternância de poder.
Aí nós entendemos que tem outros instrumentos que a gente chama de democracia radical. De certa forma, a democracia formal afastou a população dos reais interesses e acabou dando lugar para muito populista. Mesmo que o sistema seja democrático, há uma defasagem do sistema com relação às expectativas da população. Então a gente queria colocar outros instrumentos, como o plebiscito e o referendo, que são coisas que já foram feitas lá atrás do orçamento participativo e que nós queríamos um planejamento participativo onde, por exemplo, você tem os recursos para uma determinada atividade e colocar para aquela comunidade (escolher) se quer uma escola, se quer um posto de saúde, se quer uma creche.
Então dependendo de cada um desses lugares é que as pessoas vão participar de acordo com o orçamento que se tem para aplicação naquela região, naquele bairro. O que se faz hoje é: "nós vamos fazer 30 creches", sendo que acabam fazendo creche em lugar que já tem creche demais e não tem um posto de saúde. Então essa é a democracia radical. Você não só escuta, mas deixa que a população delibere, mostrando que também não é um plano populista, que tem uma limitação de orçamento e que no orçamento vão ter algumas escolhas que a população tem que fazer.
Nesse caso, vocês diriam para a população o valor disponível e dariam opções para a comunidade com o que pode colocar ali no bairro, com base no orçamento, por exemplo uma creche, um posto de saúde, uma praça? Ou a população seria livre para escolher o que ela quer?
Seria a primeira alternativa. Algumas (regiões), por exemplo, nós queremos calçar essas ruas, porque já tem creche, já tem escola básica e que já tem posto de saúde, porém tem muito barro. Por que eu vou fazer mais um posto de saúde onde já tem? É evidente que alguns orçamentos são carimbados, como é o caso da saúde, que você tem 21% para serem aplicados. Aí teria que fazer um trabalho de explicar que ao calçar uma rua vai ajudar na saúde da população. Então tem que ter uma visão integrada, que seja interdependente e transparente. Isso é o mais importante, porque a gente, muitas vezes, não sabe para onde é que vai um determinado fundo ou investimento.
Com a tecnologia é possível de as coisas ficarem mais claras: cada ato administrativo está em tempo real para o controle da população e da imprensa, mas infelizmente não é o que acontece hoje (em Florianópolis). Se você for tentar olhar as aplicações da prefeitura, não tem transparência, então, assim, essa é uma forma que tem de aprofundar a democracia. O que a gente está vendo é que a democracia muitas vezes está sendo colocada em risco porque não vê esse atendimento ou então as pessoas se afastam desse conceito de democracia e passam a ter uma visão meramente individual.
No debate da NSC, o senhor disse que é contra a direita extrema e a esquerda burocrática. Onde o senhor se encaixa na linha ideológica?
Nós aperfeiçoamos essa elaboração. Eu vou te dar um elemento simbólico e depois eu explico, tá? O que a gente observa nos últimos 200 anos desde o advento da Revolução Francesa e da sociedade industrial é que nós tivemos um ganho muito grande de competitividade e nunca tivemos tantos produtos à disposição da população. Nós produzimos mais em 200 anos do que nos últimos 200 mil anos. E ao mesmo tempo não existia um cálculo sobre os impactos que essa produção tinha com relação ao meio ambiente e às pessoas. E hoje nós já estamos verificando que esse desenvolvimento desenfreado, se não tiver um limite dado pela natureza e pela própria condição humana, nós vamos entrar em colapso.
Então eu vou te explicar assim: simbolicamente o que é o capitalismo? É o individual se sobrepondo ao coletivo e cada um que, num plano de competitividade, vai oferecer o melhor serviço ou vai ter o melhor desempenho. A ideia é que quanto mais pessoas competirem, mais pessoas produzem o melhor possível. Do ponto de vista ideológico, é como se cada um pegasse um carro e chegasse primeiro aquele que anda mais rápido. Chegar primeiro onde? O que a gente viu é que no fim de onde eles chegam é um abismo, porque no desenvolvimento industrial quanto mais você tiver usinas nucleares, quanto mais petróleo e mineração, mais a natureza vai acabar sofrendo essas consequências e com o aquecimento global ficou evidente.
Muito bem, e qual é a outra opção? É o socialismo? O que socialismo faz? Invés de vir com um carro, as pessoas entram num ônibus para chegarem todas juntas. Chegarem onde? No mesmo abismo. Então a gente conseguiu mostrar que o desenvolvimento industrial levou ao esgotamento da natureza e ao mesmo tempo está sendo entrópico. Ao invés de trazer benefícios, ele está ficando cada vez mais mais caro. Então assim, veja, esse ônibus caminha pela mesma estrada que o liberalismo. A diferença é que vai todo mundo junto, no outro iam os que chegavam primeiro. Só que eles caem na mesma vala comum.
Nós estamos propondo um outro caminho, um desvio nesse processo que é justamente a proposta ecológica, de agenda ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança), que é algo que tenha um desenvolvimento que seja ecologicamente sustentável, socialmente justo e economicamente viável e participativo. Então, a gente não é contra o desenvolvimento, só que não pode ter por padrões e por critério apenas uma questão meramente quantitativa, ele tem que ter qualitativa. E nós vimos que a diferença entre socialismo e capitalismo é o que o (Karl) Marx (filósofo alemão) chamava de modo de produção. É o modo de produção capitalista e o modo de produção socialista, porém eles utilizam o mesmo meio de produção. E nós queremos interferir no meio de produção. Essa é a diferença fundamental que tem.
Para terminar: nós não somos contra qualquer tipo de direita e qualquer tipo de esquerda. A gente está claramente contra uma direita letal, que é o extremismo que tem por padrão a morte. É a política da morte como o Francisco Franco falava no fascismo espanhol: "Viva la muerte" (“viva a morte”). Parece que tem um culto à morte, um culto a torturador, um culto à prisão, à ditadura. Com essas pessoas a gente não quer a relação, a gente tem um combate. Nós chamamos isso de direita letal.
Do outro lado, tem uma esquerda feudal que é uma esquerda que vive da sua burocracia, que vive da ocupação dos espaços de governo e que na realidade acaba beneficiando mais os companheiros do que a sociedade e que a gente viu isso se reproduzir nas escolhas de alguns candidatos, principalmente aqui em Florianópolis. Então, deixa de ser uma esquerda que tenha a transformação e sim a ocupação de espaço dado pelo próprio estado.
E o senhor?
Daí tem um centro, que negocia com um e com outro, por exemplo o presidente da Câmara (Arthur Lira, do partido Progressistas) é o mais acabado, entende? Ele era Bolsonaro, Bolsonaro, Bolsonaro. Depois virou Lula, Lula, Lula. Desde que as emendas por Pix sejam liberadas, ele está abraçado com todo mundo. Então tem um centro que é venal: topa tudo por dinheiro. Nós também estamos longe disso. A gente se coloca numa perspectiva de sustentabilidade, a gente fala de um futuro vital, onde as questões relativas à vida, à manutenção da vida e à diversidade em todos os aspectos, cultural social e ecológico, sejam colocadas na equação econômica e não apenas essa troca de "toma lá, dá cá", recuperando muito do pensamento liberal e mesmo do pensamento conservador.
Lira era Bolsonaro, Bolsonaro, Bolsonaro. Depois virou Lula, Lula, Lula. Desde que as emendas por Pix sejam liberadas, ele está abraçado com todo mundo.
Ricardo Portanova, candidato do Avante à prefeitura de Florianópolis
Eu trago, por exemplo, Winston Churchill (político britânico que foi primeiro-ministro), que não tem nenhum seguidor que se diz conservador no Brasil. Churchill foi o sujeito que mais combateu o nazismo e a extrema-direita, com valores conservadores. Ou com os liberais tipo John Stuart Mill que trouxe as bases do que é o utilitarismo no desenvolvimento do pensamento liberal. Onde é que estão esses herdeiros?
O que a gente está vendo é uma polarização. De um lado é fascista, fascista, fascista. Do outro lado é comunista, comunista, comunista. E o mundo das ideias acabou. A gente está querendo recuperar esse mundo das ideias, com uma metáfora de Platão para dizer que está na hora de você abandonar a caverna e as suas sombras, ter luz própria e começar a pensar pela própria cabeça. E não só porque na lista do zap do tiozinho ali fica detonando "a", detonando outro. Isso aí na verdade está sendo a morte da política, o que pode levar ao colapso da democracia.
É evidente que se eu explicar tudo isso com o tempo de TV que eu tenho (17 segundos) ninguém entende, ninguém vai votar em mim por causa disso. Então precisa ter um pouquinho mais de paciência, mas entender que nós estamos numa encruzilhada e chegou a hora, eu acho, de recuperar as pessoas que têm o projeto, seja da direita, da esquerda, do centro, e não só interesses individuais. A esquerda feudal está com interesses individuais ou do seu grupo ou dos companheiros e abandonou o grande projeto social. E a gente quer fazer essa recuperação.
Florianópolis teve caso de suspeita de corrupção na prefeitura, inclusive com um secretário preso. A situação traz à tona a necessidade de medidas de combate à corrupção, que passam pela transparência de informações de contratos, licitações, investimentos, uso de recursos pela prefeitura. O que o senhor propõe para ampliar a transparência na prefeitura e evitar casos de corrupção em eventual mandato?
A primeira coisa é dizer que realmente tem um problema sério de transparência. Se você entrar no site da prefeitura para saber de dados, você não consegue a maior parte deles. E os contratos com os fornecedores onde estão? Então a primeira coisa que tem é: tecnologicamente, nós podemos utilizar as mídias sociais, a grande tecnologia, não para produzir fake news, mas para produzir boa informação para a população.
Então a primeira coisa é deixar o quanto se arrecada seja por IPTU, seja através de outras atividades, como turismo ou startups, que estão praticamente abandonadas e é uma das fontes de renda (da cidade). Porque Florianópolis foi eleita entre todas as capitais a cidade mais inteligente, porque utiliza justamente por esses pequenos investidores na área tecnológica soluções que são rápidas, baratas e que trazem recursos para o município.
Então a primeira coisa que tem é deixar muito claro o que se arrecada, pra onde vai o dinheiro. E, como eu falei anteriormente, uma das formas que tem de combater a corrupção é: quer uma rua não coloca um intermediário para negociar, a população que escolhe e vai dizer: “bom, então você vai ter essa rua, agora não vai ter, por exemplo, uma UPA ou não vai dar pra contrata mais médicos”. Vocês topam? Mas isso tem que ser claro e não tem que ter intermediário, o intermediário é a tecnologia que diz: o orçamento da prefeitura é tanto, estamos aplicando assim e no que puder ser manejado vai ser consultada a população. Esse é um exemplo.
O segundo exemplo que eu geralmente trago é que nós vamos ter um negócio revolucionário, que ninguém falou ainda e que eu, como não tenho nenhum preconceito ideológico com direita, com esquerda, posso falar isso, os outros não conseguem, porque têm umas limitações mentais mesmo. Eu vou fazer um conselho, com todos os prefeitos vivos desde o (Edison) Andrino, passando por Esperidião Amin, Ângela Amin, César Júnior, Gean (Loureiro), Dário (Berguer) até o Topázio. Todo mundo que foi prefeito. E o (Sérgio) Grando, que já morreu, vai ter o vice dele que é o Afrânio (Boppré), que é vereador. De tudo quanto é ideologia, eu vou botar eles numa mesa, essa é a minha primeira ação de governo, e vou dizer o seguinte: "Me fale qual foi a melhor ação que vocês tiveram no governo de vocês em quatro anos?" E vai ter a minha equipe lá anotando.
O Andrino fez coisas muito interessantes na cidade, o Grando trabalhou numa outra direção. A Ângela Amin trabalhou muito com a questão das crianças, creches, ganhou prêmio com isso. O Dário aumentou o número de UPAs. Então,eu vou escutar todo mundo. Como é um conselho consultivo, e a gente vai recuperar (o que foi feito de bom). O que faz hoje o prefeito? "Ah, o prefeito é meu inimigo, então tudo que ele fez esconde, tira o nome e não continua a obra". Nós vamos dizer ao contrário: toda obra boa vai ser dada continuidade e ainda vamos dar o crédito para dizer “isso foi feito pelo fulano, pelo beltrano, pelo sicrano”.
Se a direita e a esquerda nacional tivessem pessoas como o Pedrão e o Marquito, o país seria outro.
Ricardo Portanova, candidato do Avante à prefeitura de Florianópolis
O outro (ponto): dos candidatos que hoje então aqui, eu podia espinafrar todos eles e eu faço isso educadamente nos debates. Mas eu costumo dizer que Florianópolis é uma cidade muito peculiar, porque nós temos talvez o melhor representante da direita, que vem da área ambiental como eu, que trabalhou na limpeza de praia, que trabalhou com o esporte, que é o Pedrão. Há muito tempo não tinha um jovem com esse perfil na direita e com um discurso um pouco diferente. E do lado da esquerda nós temos o Marquito, que tem uma característica clara de trabalhar com questões ecológicas, com a Revolução dos Baldinhos (modelo de gestão comunitária de resíduos orgânicos). Ele vem da área da agronomia e luta contra os agrotóxicos. Em 30 anos é o melhor candidato que a esquerda pode apresentar aqui. Talvez melhor até que o Grando, mas certamente melhor do que todos que foram apresentados até aqui.
Então, eu digo que se a direita e a esquerda nacional tivessem pessoas como o Pedrão e o Marquito, o país seria outro. E eu tenho alegria de participar de um pleito do qual nós iniciamos essa luta ambiental com Partido Verde, depois com a Rede, u sempre trabalhei com movimentos ecológicos, minha tese e minha dissertação foi tudo na área desse pensamento ambiental que hoje está sendo traduzido para o nosso programa de governo. Então, eu tenho esse afastamento da direita, da esquerda e do centro, E ao mesmo tempo eu posso reconhecer boas ações e pessoas que efetivamente estão trazendo novidades. Quem pode fazer isso? Eu.
Mas para combater a corrupção dentro da prefeitura, que medidas do senhor pretende adotar?
A primeira delas é ter clareza sobre a arrecadação que tem, os compromissos que a prefeitura já tem, do dinheiro carimbado, e deixar isso muito claro. A segunda naquilo que diz respeito ao investimento é decidir junto com a população. Terceiro: captação de recursos para além da arrecadação. Por exemplo, a agenda 3050 da ONU tem financiamento internacional para atividades que estejam ligadas ao meio ambiente e ao combate das mudanças climáticas, coisa que eu não vi ninguém, para ser bem sincero, nem os candidatos ecológicos que eu falei aqui, de ter um plano de combate às mudanças climáticas. Nós estamos numa ilha, superfrágil e que as pessoas são vulneráveis e continuamos com uma larga especulação imobiliária, como se isso não tivesse nenhuma relação.
Porque os recursos são muito limitados, se você não tiver criatividade e não trouxer recurso de fora, com projetos de onde possam ser investidos. Hoje, o grande investimento internacional respeita a questão ambiental. E do ponto de vista privado, por exemplo turismo ou mesmo startups, a agenda ESG, que é feita para os investimentos privados e que tem um fundo internacional muito grande. Então é possível ter bons investimentos, trazer mais recursos que possam ser melhor distribuídos e ter total transparência, sem corrupção.
A primeira coisa pra não ter corrupção é eleger um prefeito que não seja corrupto. A gente brinca que a corrupção é a poluição da política e a poluição é a corrupção da natureza. Então a gente já entra com um outro tipo de espírito. Por fim, você tem uma equipe de secretários técnicos e funcionários que estejam no mesmo padrão que tem a administração, porque o exemplo vem de cima.
Na sua síntese de plano de governo, o senhor fala em saúde holística. Mas o SUS não inclui entre suas terapias a holística. De que forma o senhor pretende implementar isso na cidade e quais os custos para efetivar essa proposta?
Algumas coisas de saúde holística o SUS já inclui, tipo a acupuntura que não era uma técnica reconhecida. Depois foi feito só por enfermeiros, depois por médicos e aí radicalizaram e hoje é um ato médico, quando tem técnicos que conhecem muito mais do que médico, que é um semestre que dão na universidade.
A primeira coisa que tem é observar o que existe de mais avançado no mundo com relação à saúde. Então o que é essa saúde holística, integrada e sistêmica que também é chamada de saúde funcional? É o que os médicos brincam: é a saúde que funciona, não é a saúde através de medicamentos e de remédios. Então assim parece que saúde hoje é na verdade depósito de doentes e tratar as pessoas para que elas continuem doentes. É necessário mudar esse conceito.
Eu tive essa experiência, morei seis anos em Paris, quando eu fiz doutorado, dois anos na Itália depois de aposentado, e eu tenho até hoje uma carteira de saúde que tem um médico de família. Esse médico de família te acompanha a cada seis meses, tem que ter todos aqueles exames de sangue e exames básicos, que lá no computador e com a equipe dele, ele vê que aumentou o colesterol, aumentou não sei o que, e ele te chama e diz que você está tendo tal coisa.
Veja bem, se você ficar doente, vai ficar muito caro para o município te tratar. Fica mais barato para o município quando você tem um médico de família que faz uma saúde preventiva do que fazer do posto de saúde um depósito de doença. Médico de família de uma forma preventiva que tenha todo o cadastro das pessoas dentro do bairro, dentro do próprio sistema que existe hoje de funcionários da saúde, não precisa fazer nenhum concurso, talvez só precisaria especializá-los nesse tipo de atividade.
Segundo, uma vez feita essa triagem, vai lá para ponta. Tem gente que está com câncer, precisa de um exame super sofisticado. Tem que ir para o Albert Einstein lá em São Paulo para fazer o exame. A gente vai implementar também o que tem de mais moderno seja em Berlim, seja em Pequim, que eu também conheci, que é a telemedicina para exame de alta resolução que ficam muito mais baratos, são feitos quase que em tempo real e o laudo é dado por um médico daqui que viu o exame.
Então essa saúde holística não é focada apenas nas terapias holísticas mais alternativas, mas é uma saúde mais completa de prevenção, médicos mais capacitados, telemedicina, seria isso?
Isso, é dizer que hospital e posto de saúde não são depósitos de doentes. A primeira coisa que tem é isso. A gente está tratando com saúde ou está tratando com doença? O conceito tradicional trata com doença. Nós temos um problema de epidemia de obesidade infantil, aumentou o colesterol, a pessoa passa mal, não consegue mais ir para escola, joga para onde? Para o posto de saúde. Quando uma boa alimentação, exercício físico e um outro conceito de como organizar a sociedade pode ser orientação do médico de família, que é um generalista e que vai dizer: "Não, não tem que ir para posto de saúde, tem é que parar de comer bala, não pode mais comer gordura hidrogenada”. Um segundo momento: quais são as terapias que mesmo não reconhecidas dão certo? Por exemplo, o canabidiol, uma grande discussão, mas está comprovado que, para tratamento de autismo, o canabidiol é o melhor medicamento que existe, sem nenhum efeito colateral.
O seu plano de governo fala em “educação de qualidade”. Quais ações o senhor pretende adotar para desenvolver uma educação de qualidade na cidade?
A primeira questão é a valorização do capital humano que já existe e que infelizmente quando se fala também de educação se fala em fazer em escola, pintar em escola. É tudo muito algo que seja visível e que não seja mais profundo. E eu sou muito tranquilo para falar isso, porque eu sou professor há 40 anos e eu conheço. E eu também não tenho preconceito, eu conheço o método Paulo Freire, eu conheço Darcy Ribeiro e conheço o Anísio Teixeira, que é um pensador de direita e que tem excelentes planos de educação. Então a questão tem que estar voltada para a valorização do capital humano em primeiro lugar. Ou seja, pagar bem os professores, fazer concursos e que as escolhas de diretores passem sempre pelas pessoas que estão envolvidas.
Um exemplo capitalista que deu certo foi a Coreia do Sul, que era uma sociedade rural e que investiu em educação. Mas quem investiu em educação não foi a escola privada, foi o público. Eles resolveram que seriam uma nação tecnológica, uma nação educada. Então acabar com analfabetismo, fazer com que seja zero, quando a gente fala no alfabetismo não é só saber ler e escrever e falar "vovô viu a uva," mas é saber como se mexe nessas maquininhas (celular, computador, tablet).
De maneira que se dê uma educação voltada para o futuro das novas profissões e também que as pessoas, desde cedo, saibam economia, por exemplo, como tratar financeiramente, que as coisas não caem de uma árvore do céu. Essa é uma ideia de educação voltada, principalmente, para as pessoas mais do que para as obras físicas, como parece ser um padrão que nós temos atualmente.
Um dos principais problemas da cidade é a mobilidade urbana. Quais são as propostas do senhor para otimizar a mobilidade na cidade?
Essa daí é complicada, porque eu também falo diferente de todo mundo. Está todo mundo alargando avenida, ligando aqui com não sei onde, vai fazer mais uma ponte... A física explica: se você tiver um atrativo, as pessoas vão para aquele atrativo, então quanto mais estradas, mais carros vai ter e mais as pessoas vão ficar dependentes do transporte individual. A grande maioria tem um carro que cabe cinco pessoas, mas transporta só uma. Isso não é racional e, ao aumentar as estradas, vai aumentar esse tipo de investimento.
Eu escutei muita gente dizendo que vai fazer até uma segunda pista por cima (de avenida). Quero saber de onde vem o dinheiro, sabe? Quanto é que vai ficar o IPTU para fazer esse tipo de obra? Ninguém fala de onde vem. Então a primeira coisa é saber os recursos que se tem e o queestá dando certo no resto do mundo, para educação, saúde, transporte.
E qual seria a sua opção para melhorar a mobilidade urbana?
Transporte público de qualidade com combustíveis que sejam ecologicamente sustentáveis. Eu morei seis anos em Paris, eu vi a transição do automóvel para bicicleta, mas começou com ônibus e metrôs. Aqui não tem metrô, mas aqui pode ter trólebus, que é o metrô de superfície, há espaço para isso. Hoje os horários (dos ônibus) são ruins, o ônibus às vezes não tem ar-condicionado, não serve para um idoso. Então, assim, é de fato o transporte público ser um substituto do transporte individual.
Com faixa exclusiva para ônibus?
Com certeza, com faixa exclusiva com trólebus também. A outra coisa mais importante que nós vamos investir e muito é o transporte individual de massa, que são as bicicletas. Eu recebi muito amigo, empresário de alto coturno, que tinha carro blindado e só andava de carro. Eles vão para Paris, a primeira coisa que fazem é alugar uma bicicleta e ir de parque em parque, deixar a bicicleta no estacionamento, pegar uma outra para voltar para casa e ficam felizes da vida. Esse sistema é feito para transporte. As pessoas se locomovem dessa forma.
Eu me lembro quando eu fui para Copenhague, na Dinamarca, o reitor da universidade estava chegando de bicicleta. Quem tinha carro eram os operários mais pobres que moravam muito longe. E aqui o carro é uma coisa de status. E hoje nós temos bicicletas assistidas que podem ter baterias solares ou baterias elétricas. As pessoas podem ser mais velhas, não precisa ser um atleta para ter uma bicicleta.
E por fim os ônibus como existem nas principais capitais do mundo, que possam transportar bicicletas também, sem aumentar o custo da passagem. Com isso você vai poder fazer longas distâncias ou subir uma ladeira de transporte público e, depois, você usa o seu transporte individual.
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