Flávio Figueiredo Assis vendeu sua empresa de cartões de alimentação para apostar em um sonho: um carro elétrico brasileiro. O que era uma ideia ganhou traços, forma e nome: Lecar 459 – uma sequência de números que se conectam e homenageiam o cientista Nikola Tesla, fã do 9, diz ele.
O projeto, com investimento estimado em cerca de R$ 1 bilhão, é todo financiado por ele, após a venda da Le Card, de cartões de alimentação. O aporte é para produzir 300 unidades, com cada veículo vendido a R$ 279.459. A previsão de Assis é que a produção comece ainda neste ano, em dezembro.
O modelo começou a ser desenhado em 2022 e a construção do protótipo teve início em 2023. Nesse processo, que reuniu profissionais com experiência em grandes montadoras, o empresário conta que chegou a desmontar um carro da Tesla para entender os detalhes e mecanismo do carro elétrico.
O Lecar 459 está em fase final de desenvolvimento em uma fábrica em Caxias do Sul (RS). Os próximos passos são o lançamento, previsto para abril aqui no Brasil, e a homologação na Inglaterra, no Reino Unido, que dura de sete a oito meses. Depois disso, diz Assis, a produção está liberada.
A homologação consiste em testes e na aprovação de que o veículo está apto para comercialização. O empresário diz que, como o carro elétrico é ainda muito recente, não há empresas que façam o processo no Brasil. Caso diferente de modelos a combustão, em que testes e homologação podem ser feitos aqui mesmo.
“Em abril, serão enviados três carros para Londres, onde serão realizadas as homologações internacionais e testes de impacto, airbag, de freio, de bateria, de segurança, de emissões, entre outros”, explica o diretor-presidente da Lecar.
Segundo ele, o Lecar 459 tem autonomia de 400 quilômetros e bateria LiFeYPO, com capacidade de carregamento de até 80% com 25 minutos de carga.
Empresário tem projeto para carro elétrico de R$ 100 mil
A repercussão do carro elétrico construído por um brasileiro levou o empresário, que gosta de ser chamado de "Elon Musk brasileiro", em referência ao dono da Tesla, a bolar o segundo projeto – bem mais ambicioso em termos de público e risco: a produção de automóveis elétricos de até R$ 100 mil.
“Cem mil cravado. Nem mais, nem menos”, afirma o executivo, que segue viagem na próxima semana para encontrar investidores internacionais interessados no projeto.
Para essa segunda etapa, o empresário afirma que a fábrica de Caxias do Sul é pequena, e busca um espaço maior.
Ele chegou a disputar o terreno onde funcionava a Ford, em Camaçari (BA). A Lecar, porém, ingressou apenas dois dias antes do fim do chamamento público do processo licitátorio que o governo baiano abriu para encontrar um novo dono para o local. A chinesa BYD, que venceu a parada, já estava no trâmite havia meses – inclusive havia anunciado vagas de emprego e início da construção de sua fábrica para esta semana.
Nesta semana, o governo baiano bateu o martelo com a BYD. Assis lamentou e considerou a desclassificação prematura, sem a oportunidade de a empresa apresentar seu projeto de desenvolvimento para a Bahia. Mas garantiu que não vai recorrer na Justiça. Vai em busca de novos terrenos.
“A gente não vai para Justiça, pois levaria muito tempo por algo que não vai favorecer o Brasil e empata as duas empresas”, diz.
Entre as opções no radar está construir a fábrica para produzir carros de R$ 100 mil no norte do Espírito Santo, seu estado natal. Mas, segundo ele, a alternativa está ligada ao fato de que, assim como a Bahia, os incentivos fiscais estaduais e a rede de fornecedores locais são atraentes. Pedro Canário, Soretama e Montanha são as cidades que estão sendo estudadas.
“Temos infinitas possibilidades agora. Não temos uma preferência. Buscamos uma oportunidade de uma planta para iniciar a produção com velocidade do nosso novo modelo Lecar de R$ 100 mil”, conclui o empresário.
Gurgel produziu carros elétricos
O primeiro carro elétrico brasileiro não chegou a ser produzido em série. Foi o Itaipu E150, da Gurgel, apresentado no Salão do Automóvel de 1974, que não passou de protótipo – nessa fase teve apenas 27 unidades fabricadas, segundo reportagem da revista Autoesporte. O tempo de carga era de 10 horas e a autonomia, de apenas 50 quilômetros, com velocidade máxima de 60 quilômetros por hora.
Depois, entre 1980 e 1982, a Gurgel produziu cerca de mil unidades do furgão Itaipu E400, considerado o primeiro elétrico nacional com produção em série. Com tempo de carga de dez horas, tinha autonomia um pouco maior que o antecessor: 80 quilômetros.
A primeira versão desta reportagem afirmava que o Lecar 459 pode ser o primeiro carro elétrico brasileiro. Porém, a Gurgel produziu um veículo elétrico no país entre 1980 e 1982, o furgão Itaipu E400. Nos anos 1970, a empresa havia desenvolvido um protótipo de veículo elétrico, o Itaipu E150, mas ele não chegou a ser produzido em série.
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