Ouça este conteúdo
Em uma de suas primeiras decisões no retorno à Casa Branca, Donald Trump assinou uma ordem executiva suspendendo temporariamente a emissão de licenças, empréstimos e arrendamento para projetos de energia eólica em terra (onshore) e alto-mar (offshore).
A decisão pode trazer ventos favoráveis para as bandas do Sul da América. O Brasil é um dos países que tendem a se beneficiar com a migração de investimentos em energia renovável que antes seriam destinados para os Estados Unidos.
A decisão de Trump ocorreu dias depois da sanção, aqui no Brasil, do marco regulatório para a geração de energia eólica offshore, em alto-mar. A falta de legislação era um entrave grande para a exploração dessa modalidade. O primeiro leilão de concessão de áreas marítimas federais para esse fim está previsto para este ano.
Ao assinar a suspensão dos incentivos nos EUA, Trump afirmou que as fazendas eólicas matam baleias e criticou a intermitência desse tipo de energia, que segundo ele gera insegurança energética. Disse ainda que turbinas eólicas são "horríveis", só funcionam com subsídios e são “muitas, muitas vezes” mais caras que o gás natural, conforme relato da agência AP.
“Não vamos fazer a coisa do vento. Grandes e feios moinhos de vento. Eles arruínam sua vizinhança. Eles são a forma de energia mais cara que você pode ter, de longe. Eles matam seus pássaros e arruínam suas belas paisagens”, disse Trump.
Em meio a uma forte expansão nos últimos anos, em especial no Nordeste, a energia eólica enfrenta questionamentos também no Brasil. Frequentemente instalados em áreas remotas, os parques podem provocar mudanças significativas no cotidiano da comunidade, com efeitos colaterais que vão desde desmatamento e poluição sonora a problemas de saúde para a população do entorno.
A ordem executiva de Trump também determina a revisão de critérios para avaliar o impacto econômico e ambiental das turbinas eólicas em novos projetos, assim como considerar a intermitência e os efeitos de subsídios federais na viabilidade dessa indústria. As regras passam a valer para futuras licenças, quando houver, e não altera as que estão em andamento.
A energia eólica é hoje a maior fonte limpa dos EUA, produzindo cerca de 10% da energia do país, segundo a AP, com dados da American Clean Power Association.
De acordo com o Departamento de Energia dos EUA, o país tem 92 mil turbinas eólicas, distribuídas por 13 estados. Em quatros deles, a energia eólica é responsável por cerca de 40% do fornecimento de eletricidade.
Em 2023, foram investidos US$ 2,1 bilhões na indústria eólica offshore norte-americana para desenvolver portos, embarcações, cadeia de suprimentos e transmissão. A indústria lá emprega mais de 125 mil trabalhadores.
Trump também criticou seu antecessor, Joe Biden, que aprovou 11 parques eólicos em escala comercial e proibiu a perfuração de petróleo na maior parte da costa dos EUA. O objetivo de Trump é aumentar a exploração de petróleo e gás.
Como a decisão de Trump pode favorecer a energia eólica no Brasil
A decisão de Trump pode trazer ventos favoráveis ao Brasil. Isso porque investimentos que inicialmente seriam destinados aos EUA podem ser redirecionados para cá, onde há incentivos para a expansão desse tipo de geração.
Paulo Pedrosa, presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e Consumidores Livres (Abrace), diz que o posicionamento de Trump acaba sendo uma vantagem ao Brasil, onde as fontes renováveis são mais baratas e incentivadas.
“O Brasil tem recursos naturais, estabilidade e boa relação com mundo. Se não estragarmos nosso potencial de energia barata e limpa, poderemos transformar a nossa sociedade produzindo com bom preço e baixa emissão o que o mundo precisa”, avalia.
Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias (Abeeólica), demonstra preocupação com o fato de uma potência como os EUA se opor se ao crescimento da energia de fontes renováveis e apostar ainda mais no petróleo.
“Não tenho dúvidas de que essa retomada de investimentos de petróleo liderada pelos Estados Unidos vai afetar os investimentos na energia renovável nos países. E essa discussão sobre o clima ficará muito acirrada”, diz Elbia.
Na avaliação dele, o cenário ficará dividido entre os Estados Unidos, em prol do petróleo, e a China, que lidera a tecnologia em renováveis: “Isso vai afetar a produção global. A questão é como essa configuração vai ficar para o Brasil”.
Por outro lado, Elbia concorda que Brasil se beneficiar da recusa de Trump: “O capital [para energia renovável] vai migrar dos Estados Unidos para outras geografias e nesse aspecto acho que o Brasil acaba tendo vantagem".