A saída do sócio de uma sociedade (limitada ou anônima), se não resolvida consensualmente, pode custar caro a todos os envolvidos e levar anos até que chegue a uma solução. Uma pesquisa realizada anualmente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) (Justiça em Números 2024) indicou que, em média, um processo tramita 2 anos e 8 meses no primeiro grau de jurisdição e leva mais 7 meses para ser julgado em segunda instância. Isso sem contar o tempo necessário para execução da sentença, correspondente, em média, a 5 anos e 7 meses.
A arbitragem, apesar de ser reconhecidamente um procedimento mais rápido de solução de controvérsias, tende a demorar quase 2 anos para o seu encerramento. Em relatório publicado pelo Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC), concluiu-se que o tempo de tramitação dos processos arbitrais da Câmara em 2023 foi, em média, de 21 meses. A execução da sentença arbitral – que ocorrerá perante o primeiro grau de jurisdição do Poder Judiciário – tende a observar o mesmo tempo de 5 anos e 7 meses acima indicado.
Tratando-se de litígios societários, a duração dos processos tende a ser ainda maior, dada a complexidade da matéria e a natureza da relação entre as partes, chegando ao ponto de não ter fim (casos que duram décadas, acompanhados do ajuizamento de várias demandas consecutivas etc.), salvo se houver solução consensual.
Não fosse isso suficiente para frear qualquer interesse em litigar no Brasil, no caso de instauração de uma demanda judicial ou arbitral destinada à apuração de haveres, são exigidos despesas processuais, honorários advocatícios, honorários de árbitros, honorários periciais, custo de avaliações e por aí vai. E esses são apenas os custos ditos “materiais”, pois concretamente mensuráveis. Outros são os custos “imateriais”, que envolvem (i) a incerteza durante anos a respeito do montante a ser pago pela sociedade em benefício do sócio retirante ou excluído, influenciando as decisões de investimento das sociedades; (ii) a incerteza quanto aos critérios que serão utilizados para o cálculo dos haveres; e (iii) a oscilante jurisprudência sobre a temática, que constantemente altera seu posicionamento.
E, independentemente do valor a ser apurado a título de haveres ao sócio, a sociedade sempre sai perdendo: é obrigada a gastar tempo e recursos financeiros elevados para, ao final do processo, descapitalizar-se ao pagar, à vista e em dinheiro, os haveres do sócio retirante ou excluído.
Para tornar o encerramento definitivo da relação societária mais rápido e barato, é preciso recorrer ao contrato, estatuto social ou acordo de sócios/acionistas. Nesses instrumentos, devem estar previstas, com o maior detalhamento possível, as regras relativas à apuração do valor devido ao sócio retirante ou excluído e à forma de pagamento desse montante. Engana-se quem pensa que a economia de tempo e dinheiro decorre apenas da inclusão de cláusula contendo o método de apuração dos haveres (se mediante balanço patrimonial ou econômico, qual a data de referência do balanço, se incluído ou não o fluxo de caixa descontado, se incluídos ou não os intangíveis da sociedade, se o cálculo será feito como se liquidação total fosse, se deve ser feita alguma provisão, etc.). A sociedade beneficia-se igualmente da definição, em contrato social, estatuto ou acordo de sócios, da forma de pagamento dos haveres apurados.
1) Período de carência e parcelamento:
Se não houver previsão distinta em instrumento específico, o pagamento dos haveres deve ser feito em noventa dias da data da definição do valor, à vista e em dinheiro (art. 1.031, §2º, do Código Civil).
Abre-se, assim, espaço de ampla liberdade para a definição, pela sociedade, de uma forma de parcelamento do valor dos haveres e de eventual período de carência até que seja iniciado o pagamento. Menciona-se como exemplo a definição do início de pagamento em 120 dias do término da apuração do valor devido — período durante o qual vale a pena estabelecer que não incidem juros de qualquer natureza ou correção monetária —, em 36 parcelas de igual valor. Embora o exemplo seja simplório, em comparação ao que as especificidades concretas das sociedades podem exigir, garante a redução do impacto dos haveres no bolso da sociedade.
2) Pagamento em dinheiro ou em dação de bens:
No contrato, estatuto ou acordo de sócios, pode ser definida a modalidade de pagamento dos haveres, incluindo eventual previsão de que a sociedade, a seu critério, pode optar por pagar a integralidade ou parte do valor devido ao sócio retirante com bens imóveis ou móveis da sociedade.
Uma cláusula dessa natureza reduz o impacto da descapitalização na sociedade, evitando que tenha que repassar ao sócio elevada quantia em dinheiro ou liquidar seus bens no mercado a fim de que realize o pagamento. Se inexistir previsão dessa natureza, a alteração da modalidade de pagamento dependerá, necessariamente, da concordância do sócio retirante ou excluído, podendo não ser fácil de obter.
3) Juros e correção monetária:
Por fim, o instrumento social ou parassocial deve prever a utilização de determinado índice de correção monetária e da taxa de juros que melhor convier à sociedade (até por força da entrada em vigor da Lei n.º 14.905/24, que estabelece critérios de correção monetária e juros na ausência de convenção entre as partes).
A jurisprudência é uníssona em aplicar como termo inicial da taxa de juros moratórios o fim do prazo de noventa dias da liquidação, a partir do qual deve ser realizado o pagamento dos haveres (à vista e em dinheiro). Prever uma solução distinta — como a incidência de juros de mora somente após ultrapassado o prazo total de parcelamento dos haveres — será favorável aos interesses da sociedade.
Em síntese, com o objetivo de evitar a demora e o custo do litígio envolvendo apuração de haveres ao sócio retirante ou excluído, bem como reduzir o impacto da saída do sócio nas finanças da sociedade, o contrato social, estatuto ou acordo de sócios devem prever não só a forma de cálculo dos haveres, mas também o método de seu pagamento.
Por Mariana Hofmann Fuckner– OAB/PR no114.271
Assis Gonçalves, Nied e Follador Advogados
Graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Mestranda em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo. Integrante do Grupo de Pesquisa em Direito Societário Aplicado da Universidade Federal do Paraná. Membro Efetivo da Comissão de Direito Cooperativo e da Comissão da Recuperação Judicial e Falências da OAB/PR. Vencedora do prêmio “Professor Teixeira de Freitas”, de honra ao mérito, por obter a primeira classificação geral do curso de direito diurno, na turma de graduandos de 2021. Associada do Instituto Prof. Assis Gonçalves.