A "paciência estratégica" é a denominação habitual para a política do Irã no Oriente Médio. No entanto, o recente ataque de drones e mísseis contra Israel, seguido poucos dias depois pelos israelenses, parece sugerir que não se deve descartar um confronto direto, algo que nunca havia acontecido antes (pois a república islâmica utilizou seus aliados, milícias armadas em diversos países, para fazer valer seu propósito de ser uma potência influente no Oriente Médio).
No entanto, parece que os iranianos não vão modificar radicalmente sua estratégia. Seu principal objetivo é a sobrevivência do regime, fruto da simbiose perfeita entre nacionalismo e religião introduzida pela revolução iraniana. Uma estratégia e política externa ativas e ambiciosas são indispensáveis para uma certa estabilidade e coesão internas, apesar das dificuldades econômicas e da falta de liberdades.
Uma estratégia além da religião
Alguém poderia questionar se o regime iraniano leva em conta o caráter minoritário da fé xiita no mundo muçulmano. Apenas entre 10% e 13% da população islâmica são xiitas, embora essa religião seja majoritária no Irã (96%) ou no Iraque (60-63%). Dados esses percentuais, a exportação da revolução islâmica iraniana teria um efeito limitado no conjunto do Oriente Médio. Por outro lado, o regime islamista nunca se propôs a criar um bloco político-religioso xiita, entre outras coisas porque nem todas as populações xiitas simpatizam com o Irã. Por exemplo, o líder religioso iraquiano, o aiatolá Al Sistani, é a favor da separação entre Estado e religião, ao contrário do regime teocrático iraniano.
Pensar que o regime iraniano busca alianças exclusivamente com grupos ou países de religião xiita é errôneo. Isso é demonstrado pelo forte apoio do Irã aos palestinos sunitas do Hamas, o que permite ao Irã exercer influência no conflito palestino-israelense e no conjunto do Oriente Médio, além de tentar ganhar a simpatia da "rua árabe", muitas vezes incomodada e desapontada com o escasso apoio prático de seus governos à causa palestina. Também são sunitas as monarquias do Qatar e de Omã. Ambas mantêm boas relações com Teerã, pois os interesses geopolíticos do Irã no Golfo Pérsico e o confronto entre o Qatar e a Arábia Saudita, rival do Irã na região, pesam mais do que as diferenças religiosas.
O regime iraniano, apesar de seu caráter teocrático, se reveste das características de um regime "progressista" e revolucionário em relação aos regimes árabes e muçulmanos aliados dos Estados Unidos. Salvando as distâncias, podem-se estabelecer certas semelhanças com os regimes nacionalistas árabes laicos, socialistas e progressistas das décadas de 1950 e 1960, liderados pelo Egito de Nasser e aliados dos soviéticos, em sua oposição às monarquias conservadoras árabes, alinhadas com Washington.
Objetivo: sobreviver. Meio: guerras por procuração
O principal objetivo do Irã é a sobrevivência de seu regime, e o nacionalismo desempenha um papel aglutinador nisso. Sua oposição frontal aos Estados Unidos, cujos interesses estratégicos passavam por um forte apoio ao xá, coincidente com os de Israel, leva-o a considerar os americanos, o "grande Satã", como o principal inimigo de seu sistema político e a principal ameaça à sua integridade territorial.
Em segundo lugar, está o fortalecimento do status do Irã como uma grande potência do Oriente Médio. O fracasso da administração Bush em estabelecer um regime amigo em Bagdá, uma suposta "cabeça de ponte democrática" que deveria alterar a seu favor o mapa geoestratégico do Oriente Médio, resultou em um vácuo favorável ao regime dos aiatolás e gerou desconfiança entre os aliados tradicionais de Washington, como a Arábia Saudita.
No entanto, consciente da fraqueza de suas forças armadas convencionais que não lhe permite uma guerra aberta com Israel ou os Estados Unidos, o Irã desenvolveu na região uma estratégia que, por um lado, busca dotar-se da segurança de possuir armamento nuclear, embora sempre tenha reiterado que seu programa de enriquecimento de urânio seja para usos civis; e por outro, concede apoio a grupos armados em países-chave da região como Palestina, Líbano, Síria, Iraque ou Iêmen. Alguns são de origem xiita e outros não, mas têm em comum serem inimigos de Israel e dos Estados Unidos.
Esses grupos praticam guerras por procuração (proxy wars) e os iranianos os apoiam porque combatem seus rivais estratégicos, principalmente Israel e a Arábia Saudita. Seu principal instrumento é a Força Al Quds, pertencente ao Corpo dos Guardiões da Revolução, conhecidos como pasdaran, uma organização militar paralela ao exército iraniano, e que conta com forças terrestres, navais e aeroespaciais próprias.
É preciso ter em mente que os revolucionários islâmicos dividem o mundo em duas categorias: de um lado, o mostazafin — os oprimidos — e, do outro, o mostakberin — os opressores. É uma opressão entendida em termos existenciais, que tenta deixar de lado as diferenças entre sunitas e xiitas. Por isso, os pasdaran não limitam suas ações armadas ao território iraniano, pois se consideram representantes políticos da Umma, o conjunto da comunidade muçulmana. Isso explica a presença da Força Al Quds no Líbano, Síria e Iraque.
Mísseis e esforços diplomáticos
Os pasdaran também controlam o programa de mísseis balísticos com alcance máximo de 2.000 km. Embora sejam mísseis convencionais, têm capacidade de carga suficiente para transportar dispositivos nucleares se for necessário. Além disso, fornecem a seus aliados, como o Hezbollah ou os houthis do Iêmen, mísseis de curto alcance, que foram usados contra israelenses ou sauditas. Vale ressaltar, por fim, a guerra cibernética, o uso de drones de baixo custo ou lanchas rápidas no Golfo Pérsico como exemplos de meios de dissuasão iranianos.
Esses meios fazem parte de uma estratégia, que foi complementada pela via diplomática, onde se destaca a retomada das relações diplomáticas com a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos em março de 2023. Assim, as tensões no Golfo Pérsico foram atenuadas, embora isso não tenha impedido que as monarquias petrolíferas se aproximassem de Israel por meio dos acordos de Abraão (2020), aos quais também poderia ter aderido a Arábia Saudita, até que o ataque do Hamas em Gaza frustrou essa iniciativa. Pode-se prever que, se esse ataque tinha como objetivo sabotar esses acordos, o Irã não se beneficiará com isso, pois as monarquias valorizam mais a estabilidade regional, favorável a seus interesses econômicos, do que a formação de blocos ideológicos ou sectários.
De qualquer forma, o Irã deve continuar com sua "paciência estratégica", pois é incapaz de mudar substancialmente o tabuleiro do Oriente Médio, por mais que pareça ser o grande defensor da causa palestina, abandonada pelos países árabes. Um erro de cálculo com Israel ou os Estados Unidos teria graves consequências para um Irã, militarmente inferior, que não receberia ajuda substancial de potências como China e Rússia, com as quais estabeleceu laços estratégicos nos últimos anos.
A projeção internacional do Irã anti-imperialista
Além disso, é preciso destacar que a república islâmica do Irã, desde seus primórdios, nunca deixou de lembrar que durante os séculos XIX e XX, o país esteve sujeito à influência da Rússia czarista, do Império Britânico e dos Estados Unidos, embora não tenha sido diretamente colonizado. Daí a dimensão anti-imperialista da revolução iraniana, que assume os valores de independência, diversidade e descolonização, próprias da ideologia do terceiro-mundismo. Vale ressaltar que este é o fundamento da diplomacia ativa do Irã na América Latina, onde são especialmente significativas as relações com a Venezuela chavista.
Também é importante ressaltar que, em julho e agosto de 2023, o Irã passou a fazer parte da Organização de Cooperação de Xangai, uma associação da China com outros países asiáticos, e principalmente do fórum de economias emergentes representadas pelos BRICS. Em ambos os casos, a adesão do Irã serviu para reforçar o caráter antiocidental dessas instâncias internacionais, onde China e Rússia desempenham um papel importante.
Além disso, o caráter anti-imperialista da revolução de Khomeini atraiu simpatias de alguns destacados intelectuais do Ocidente. Este foi o caso de Michel Foucault, filósofo pós-moderno que visitou o Irã em 1978, poucos meses antes da revolução. Foucault chegou a apresentar a revolução islâmica como um exemplo para um Ocidente que desde o Renascimento havia esquecido da "espiritualidade" política. O fato é que, apesar de quase meio século desde a revolução iraniana, o populismo ocidental de esquerda não a questiona abertamente. Não é uma revolução marxista, mas é anti-imperialista e antissionista, e isso parece pesar mais do que a situação dos direitos humanos no Irã dos aiatolás.
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