Em 9 de março, nas entranhas do prédio do Capitólio, ocorreu uma reunião que só seria possível em Washington, D.C. O anfitrião era Jim Jordan, republicano do estado de Ohio, presidente do curiosamente nomeado House Select Committee on the Weaponization of Government [NT: Comitê Seleto da Câmara sobre o Aparelhamento do Governo, em livre tradução]. Os convidados: Matt Taibbi e Michael Shellenberger, quase famosos por revelar, no Twitter Files, a relação profundamente emaranhada entre a plataforma de mídia social e o governo federal dos EUA. O assunto era a liberdade de expressão na era digital.
Os republicanos haviam conquistado recentemente uma pequena maioria na Câmara e estavam ansiosos para ganhar pontos com o governo Biden. Taibbi e Shellenberger foram convidados porque tinham uma história preocupante para contar sobre o abuso de poder — o que Jordan quis dizer com “aparelhamento”.
Segundo Taibbi, entidades federais, da Casa Branca à CIA, desenvolveram um “sistema formal” para transmitir suas demandas às plataformas digitais sobre o que pode ser dito online e quem pode dizer. Um bando de organizações “quase privadas”, muitas delas beneficiárias de financiamento governamental, atuou como multiplicadores da pressão, reiterando as mesmas demandas. Em vez de questionar essas práticas, a mídia noticiosa as imitou, tornando-se “um braço de um sistema de policiamento do pensamento controlado pelo Estado”. Shellenberger chamou isso de “complexo industrial da censura”.
Os dados do Twitter Files pareciam confirmar essas alegações. O FBI teve grande importância nas decisões de moderação de conteúdo do Twitter. A agência dedicou até 80 funcionários para caçar transgressores na plataforma, sobrecarregando os executivos do Twitter com pedidos de ação e, por fim, pagando à empresa US$ 3,4 milhões por seus problemas. Durante as controvérsias em torno da campanha presidencial de 2020, o Twitter se apoiou fortemente no julgamento do FBI e do Departamento de Segurança Interna.
A intervenção federal no discurso digital seguiu um padrão tendencioso. Qualquer opinião que ofendesse as sensibilidades do establishment era alvo de repressão. Isso incluía visões populistas de esquerda e excêntricos como Robert F. Kennedy Jr., mas a maioria das vozes heréticas pertencia a Donald Trump e seus apoiadores republicanos. Durante a campanha de 2020, o alcance das postagens de Trump foi reduzido pelo Twitter – o que significa que ele estava essencialmente falando sozinho. Após os tumultos de 6 de janeiro em Washington, o Twitter o expulsou da plataforma, embora nunca tenha identificado como ele havia violado seus termos de serviço. O pessoal do FBI assumiu empregos no Twitter em número significativo, intensificando a inclinação partidária. James Baker, que desempenhou um papel importante na investigação de Trump enquanto estava no FBI, tornou-se um defensor persistente da expulsão de Trump depois de mudar para o Twitter.
Ao mesmo tempo, a “polícia do discurso” protegeu membros com uma boa posição no establishment de quaisquer críticas, com uma predileção especial por Anthony Fauci. Também fez isso por Joe Biden, antes e depois de sua eleição para a presidência. Não há necessidade de repetir aqui os detalhes sórdidos do fiasco do laptop de seu filho, Hunter Biden, mas, dado que o predicado da censura tem sido a defesa da verdade, os fatos simples da história devem ser anotados: o FBI mentiu para o Twitter e o Twitter passou a mentira adiante para o público. Se foi uma operação de desinformação, teve sucesso total.
Como observaram Taibbi e Shellenberger, essas manobras não tinham precedentes na vida dos presentes à audiência. Até mesmo o frenesi anticomunista de Joe McCarthy encontrou forte oposição de elementos do establishment político e da mídia. A nova censura parecia confiar na conformidade da elite universal. Nenhum debate foi realizado, nenhuma lei de habilitação [NT: normativa que autoriza uma pessoa ou órgão a tomar determinada ação, especialmente para fazer regulamentos, regras ou ordens] foi aprovada. A autoridade legal oficial do governo federal foi usada para silenciar, em segredo, as opiniões online de um número incontável de americanos. Qualquer que seja a motivação dos republicanos, pode-se pensar que este é um assunto digno de conversa para a Câmara.
Os membros do comitê democrata ignoraram amplamente o testemunho apresentado por Taibbi e Shellenberger. Eles não mostraram interesse em discutir os limites da liberdade de expressão. Oscilando de humor entre o tédio e a raiva, eles trataram as duas testemunhas como criminosos de guerra a serem atormentados e insultados sem piedade até que confessassem seus terríveis, embora indeterminados, crimes.
A delegada das Ilhas Virgens, Stacey Plaskett, membro da minoria democrata, abriu o caso da promotoria mostrando um vídeo de um antigo executivo do Twitter reclamando que teve que vender sua casa por causa dos Twitter Files. Então ela pareceu acusar Taibbi e Shellenberger de terrorismo: “vocês representam uma ameaça direta para as pessoas que se opõem a vocês”. A palavra “ameaça”, conforme deve ser entendida, carrega um significado específico e ameaçador no governo.
Outras acusações se seguiram. Taibbi e Shellenberger eram “os escribas escolhidos por Elon Musk”, comprados e pagos “para promover a narrativa por ele escolhida”. Por serem “testemunhas republicanas”, não podiam reivindicar qualquer credibilidade como jornalistas – eram “os chamados jornalistas de ocasião”. Como serviam de lacaios de Musk, facilitavam o trabalho dos agentes russos. A certa altura, Dan Goldman (democrata de Nova York) insistiu que, como uma espécie de juramento de lealdade, Taibbi endossasse dois dos indiciamentos de Robert Mueller contra entidades russas. Quando Taibbi observou que os indiciamentos são acusações, não provas de culpa, Goldman, que é formado em direito, cortou sua fala imperiosamente: “Deixe-me seguir em frente... É assim que funciona. Você já deveria saber disso”.
As duas testemunhas foram acusadas de se venderem por fama e mais seguidores no Twitter. Eles teriam desencadeado “a postagem incessante de mentiras vinda de Trump e de outros extremistas MAGA” [NT: sigla em inglês do slogan “faça a América grande novamente”]. Seu crime mais terrível, no entanto, foi desrespeitar o establishment. Quando Debbie Wasserman Schulz (democrata da Flórida) proclamou: “Eu apoio o FBI e nossas agências de aplicação da lei”, ela parecia sugerir que o maior dever de todo americano patriota era a devoção à ordem estabelecida.
Por acaso conheço Taibbi e Shellenberger, assim como Bari Weiss, outra autora do Twitter Files. São almas independentes. Nenhum é republicano; todos os três começaram a vida como democratas liberais e agora são, nas palavras de Weiss, “politicamente sem-teto”.
Mas não era esperado que ninguém realmente acreditasse nas acusações lançadas contra eles na audiência, muito menos os acusadores, o que provavelmente explica a indiferença que prevalecia entre as explosões de raiva performativa. Então, o que motivou os democratas da Câmara a um exercício tão determinado de destruição pessoal? Muitas explicações possíveis surgem. O mais gentil seria que eles achassem a questão um fracasso e quisessem mudar de assunto. Uma teoria psicológica poderia propor que eles caíram em um estado de psicose política, atacando descontroladamente aqueles que perfuravam suas fantasias.
O pior cenário, com o qual concordo, é que os democratas agiram por princípios. Seu comportamento refletia, com bastante fidelidade, sua compreensão atual do governo.
Historicamente, a abordagem americana à liberdade de expressão era de espírito jeffersoniano [NT: referindo-se à Thomas Jefferson, terceiro presidente norte-americano]. A suprema ameaça à liberdade, nessa visão, era o poder e o peso do governo, contra o qual o indivíduo deve ser defendido por um muro de direitos invioláveis e inalienáveis. A Primeira Emenda da Constituição dos EUA não tem nada a dizer sobre abusos de pessoas ou grupos privados, mas ordena ao Congresso que “não faça nenhuma lei restringindo a liberdade de expressão ou de imprensa”. Este é o argumento que Jordan estava tentando com sua conversa sobre "aparelhamento".
A esquerda moderna adotou uma versão radical do individualismo jeffersoniano. Nascida no Movimento pela Liberdade de Expressão de Berkeley em 1964, considerava que a principal ameaça à democracia residia nas grandes instituições hierárquicas como a universidade, a corporação e o governo. A luta colocou o indivíduo contra a desumanidade mecânica da era industrial. Mario Savio, o líder do movimento, disse a seus camaradas: “Vocês precisam colocar seus corpos nas engrenagens e nas rodas, nas alavancas, em todo o aparato — e precisam fazê-lo parar”.
Uma notável transvaloração ocorreu desde aquela época idealista. Em essência, a esquerda pós-moderna inverteu os termos do ideal jeffersoniano. A ameaça à democracia agora é a sociedade — um reino de injustiça e opressão, no qual os lobos humanos devoram perpetuamente os fracos. Trump e Musk são arquétipos do predador. Eles representam o impulso autoritário e podem manipular as massas de mente obtusa, até mesmo para a insurgência, espalhando falsidades e fakes news. A pandemia os mostrou dispostos a matar com suas mentiras, a minar a autoridade da ciência.
Só um governo poderoso e vigilante, nas mãos do Partido da Verdade, pode impor a democracia a uma sociedade conturbada, controlando as palavras ditas ao público, bem como os meios de comunicação que as veiculam. Uma sábia classe guardiã, assessorada por especialistas, deve ser mobilizada para assumir o controle da política e da cultura. Nesse quadro, a oposição nunca pode ser legítima — ela pertence ao Partido da Mentira. Aqueles que seguem a exortação de Sávio e se jogam nas engrenagens das grandes instituições serão transformados em polpa — para seu próprio bem.
A ideologia do controle tem uma longa história, remontando à República de Platão e aos partidos de vanguarda do Marxismo-Leninismo. A versão americana, absorvida pelos democratas da Câmara e pelo establishment da esquerda em geral, emergiu da Era Progressista do início do século XX e foi melhor articulada por Walter Lippmann.
Lippmann era um verdadeiro platonista. Sua experiência com propaganda na Primeira Guerra Mundial o convenceu de que a opinião pública poderia ser fabricada por nefastas “hierarquias invisíveis”. O cidadão comum, acreditava ele, era irremediavelmente crédulo e ignorante. O governo moderno deve, portanto, depender de especialistas “especialmente treinados”, possuidores de “conhecimento técnico”, que representam não apenas os eleitores, mas “as pessoas que não são eleitores, as funções de eleitores que não são evidentes, os eventos que estão fora da vista, as pessoas mudas, as pessoas não nascidas, as relações entre as coisas e as pessoas”.
Como essa classe guardiã seria reconciliada com a democracia, Lippmann nunca elaborou. Fatalmente e com mais do que uma pitada de desespero, ele escreveu: “Os problemas que atormentam a democracia parecem ser incontroláveis por meios democráticos.” A implicação era clara. Para salvar a democracia, elites “especialmente treinadas” tiveram que controlá-la.
O espetáculo do "aparelhamento" do governo se desenrolou sob a sombra da tempestade digital. A informação rompeu seus limites institucionais e escapou do controle da elite. Presumivelmente, os predadores poderiam se banquetear, sem problemas, com vítimas indefesas. De longe, o evento mais catastrófico associado a tudo isso foi a ascensão, queda e o potencial retorno de Donald Trump.
Para a classe guardiã de hoje, Trump era o problema por excelência da democracia que só poderia ser resolvido por meios antidemocráticos. Três meses após sua eleição, ele estava sob investigação por conspirar com agentes russos. De acordo com o jornalista Jeff Gerth, meio milhão de notícias foram produzidas sobre o assunto do conluio Trump-Rússia — um volume que, se for verdade, sugere um nível patológico de compulsão obsessiva. O fracasso em encontrar a culpa apenas confirmou os poderes de supervilão de Trump. Uma enxurrada de acusações, impeachments e indiciamentos tem como alvo Trump desde 2016; o pensamento parece ser que, mais cedo ou mais tarde, alguém o considerará culpado de alguma coisa. Isso provavelmente está correto.
Mas o establishment da esquerda enfrentou um segundo e mais complexo problema da democracia: como controlar a mídia social, que eles acreditavam ter levado Trump ao poder, e que tem o potencial de fazer o mesmo por outros perigosos carnívoros do Partido da Mentira. A nova censura começou com certas afirmações dogmáticas ouvidas em cantos opacos da burocracia federal. O conceito-chave era “desinformação”, definido como mentir deliberadamente para algum adversário. As operações de influência foram confundidas com tentativas de jogadores estrangeiros de hackear os sistemas de informação do governo dos EUA, como registros eleitorais; os russos pairavam como fantasmas sobre a cena. Muito rapidamente, contar mentiras online transformou-se em uma crise de segurança nacional sob a alçada da Segurança Interna.
Organizações não-governamentais (ONGs) forneceram os “especialistas” para justificar esse esforço. Muitas das ONGs que trabalham com a questão, como o Aspen Institute e o Atlantic Council [Instituto Aspen e Conselho Atlântico, respectivamente, em livre tradução], receberam fundos federais — mas todas semearam o pânico sobre a desinformação e exigiram regulamentação governamental das mídias sociais. Aqui está Renée DiResta, do Observatório da Internet de Stanford, testemunhando perante o Senado em um exemplo típico de alarmismo de ONG: “Na última década, a desinformação e os boatos da mídia social evoluíram de um simples incômodo para uma guerra de informações de alto risco... Esta será uma das ameaças definidoras da nossa geração”. DiResta também recomendava uma “estratégia de defesa para todo o governo” que incluía uma “estratégia internacional de detecção e dissuasão”, que soava como a Guerra Fria.
As ONGs desenvolveram os conclaves guarda-chuva, onde funcionários de agências federais como a Homeland Security [Agência de Segurança Interna], o FBI e o Departamento de Estado introduziram seus “parceiros” de mídia social nos mistérios da ortodoxia digital. As instruções do governo ocorreram tanto pessoalmente quanto por meio de canais de mensagens confidenciais. Entre os grupos mais influentes estavam a Election Integrity Partnership e o Virality Project [Parceria para Integridade Eleitoral e Projeto Viralidade, respectivamente], ambos gerados pelo Observatório de Internet de Stanford, que monitoraram milhões de postagens em plataformas e foram responsáveis por duas expansões específicas nesse campo.
Primeiro, abandonaram a pretensão de proteção contra conspiradores estrangeiros para se concentrar no conteúdo doméstico. “Atores de ameaças domésticas”, cujas postagens fraudulentas foram consideradas um ataque a “instituições democráticas”, substituíram os fantasmas russos nas prioridades da Agência de Segurança Interna. Em segundo lugar, eles passaram da desinformação — isto é, a cereja do bolo do combate à falsidade — para a censura de verdades incômodas. Críticas precisas a Anthony Fauci que pudessem “exacerbar a desconfiança”, “histórias verdadeiras que pudessem alimentar a hesitação” sobre a vacina contra a Covid-19, juntamente com opiniões heréticas, embora viáveis, sobre a guerra na Ucrânia e as eleições nos EUA, foram vistas como passíveis de contestação.
Agora havia boas verdades e más verdades. Em casos como o do laptop de Hunter Biden, mentiras nobres tiveram que ser contadas para resolver os problemas da democracia. A nova censura contornou as velhas sutilezas legais: mandados, juízes, investigações formais. Foi um processo burocrático. Como tal, era autojustificado, secreto e sem uma finalidade determinada.
A cronologia é significativa. A maioria das peças do sistema ganhou vida no início do governo Trump. A pandemia provou ser uma incubadora e aceleradora do controle governamental sobre o discurso digital. Relatos pessoais de efeitos colaterais de vacinas, conversas sobre imunidade natural e, claro, qualquer sugestão de que o vírus havia “vazado de um laboratório” foram examinados: esse foi o momento em que a verdade se tornou relativa. Na campanha eleitoral de 2020, como vimos, Trump, o presidente em exercício, tivera suas postagens com alcance reduzido no Twitter. Os distúrbios de 6 de janeiro levaram essa tendência um passo adiante — finalmente, como as elites sempre acreditaram, o “trumpismo” poderia ser equiparado a traição.
Com a ascensão de Joe Biden à presidência, o sistema atingiu algo como a maturidade. Biden era um crente — e um praticante. Ele acusou as plataformas digitais de “matar pessoas” com desinformação e exigiu, com sucesso, que o Twitter exilasse críticos e opositores políticos. Os burocratas puderam finalmente sair do armário, mas ainda havia incerteza sobre o quão centralizado e visível para o público o sistema deveria ser.
ONGs como o Virality Project e a Information Disorder Commission do Aspen Institute [Projeto Viralidade e Comissão de Desordem da Informação do Insituto Aspen, respectivamente] defenderam duramente uma “estratégia de resposta nacional centralizada”, com “papéis e responsabilidades claramente definidos em todo o Poder Executivo”. Depois de alguma hesitação, o governo concordou. Em abril de 2022, Alejandro Mayorkas, secretário da Agência de Segurança Interna, anunciou a criação do Conselho de Governança de Desinformação, chefiado por Nina Jankowicz. Incrivelmente, Jankowicz, uma criatura do mundo das ONGs, havia promovido o jogo de desorientação sobre o hackeamento russo durante a controvérsia do laptop. Ela pode ser encontrada no TikTok alegando ser “a Mary Poppins da desinformação” e em outros lugares online cantando músicas obscenas.
O Conselho de Governança de Desinformação de Biden se autodetonou e é instrutivo entender o porquê. A mídia culpou a oposição republicana. A ridícula Jankowicz desempenhou um papel no desastre. Mas o conselho falhou principalmente porque o governo imaginou que tal agência teria um valor evidente, mas estava totalmente despreparada para a torrente de críticas que a inundou. Poucos americanos querem a governança federal da informação. O establisment da esquerda, por outro lado, não pode sobreviver politicamente sem o controle da web — e habita em uma bolha institucional obscura onde o interesse próprio é confundido para sempre com a salvação da democracia.
Enquanto o caos digital e a turbulência gerada por Trump formavam o pano de fundo do circo do "aparelhamento" do governo, a eleição presidencial de 2024 parecia um acerto de contas a curta distância.
Desesperados para quebrar o controle dos democratas sobre nossa cultura, republicanos como Jordan pretendem seguir a Primeira Emenda para escapar de seu gueto de mídia e alcançar as grandes maiorias necessárias para ganhar um cargo nacional novamente. Essa é uma estratégia razoável — mas nossa época é irracional. Os republicanos estão presos em um dilema circular: eles precisam que a presidência seja ouvida acima da censura, mas a censura diminui radicalmente suas chances de chegar à Casa Branca. Até Trump, apesar de sua extraordinária capacidade de prender a atenção da mídia, acabou sendo punido com o botão mudo.
O Partido Democrata é o lar natural do establishment de esquerda. Para esse arranjo, a esquerda traz vantagens aparentes como o aplauso reflexivo do New York Times, mas também, menos evidentemente, uma pesada carga de bagagem ideológica. Suas doutrinas tendem a ser impopulares mesmo entre os democratas. A maioria dos negros se opõe ao corte de recursos para a polícia, por exemplo. A maioria dos hispânicos desaprova as fronteiras abertas. A maioria dos democratas não acredita que a reclamação deva prevalecer sobre o mérito. Se colocadas em votação, essas proposições perderiam. A esquerda deve, portanto, transformá-las em mandamentos morais, fora do alcance da política. Na era digital, isso só pode ser feito policiando e controlando a Web — e uma censura dessa magnitude só é possível se Biden ou algum outro democrata ocupar a presidência após 2024.
Do ponto de vista dos democratas, os presságios parecem sombrios. A perda do Twitter para Elon Musk foi um golpe terrível. A condenação da defesa da liberdade de expressão que acompanhou a venda do Twitter surpreendeu muitos de nós; agora podemos ver que esse movimento foi impulsionado pelo pressentimento de que a nova censura, tão discretamente implementada, estava prestes a ser exposta. A perda da Câmara lembrou aos democratas o eterno problema da democracia. Outros meios de controle serão preferidos, com os processos em série de Trump servindo de modelo. O Internal Revenue Service [NT: Receita Federal], portanto, fez uma visita surpresa à casa de Taibbi em Nova Jersey enquanto ele testemunhava em Washington. A Federal Trade Commission [Comissão Federal de Comércio] atingiu Musk com “mais de 350 demandas específicas” por informações, incluindo todos os detalhes suculentos das negociações do Twitter com jornalistas como Bari Weiss, Matt Taibbi e Michael Shellenberger. À medida que entramos no modo de campanha eleitoral, devemos esperar um aumento de criatividade nessa frente.
Ambos os partidos, por boas razões, temem um desastre eleitoral. Nenhum dos dois lembra que já enfrentamos essa escolha antes. A Lei de Sedição de 1798, elaborada durante a presidência de John Adams, tornou ilegal “escrever, imprimir, proferir ou publicar qualquer escrito ou escritos falsos, escandalosos e maliciosos contra o governo dos Estados Unidos” — um preceito que o Partido da Verdade pode achar adequado hoje. Mas Jefferson, com o passar do tempo, derrotou Adams, declarou em seu discurso de posse que “o erro de opinião pode ser tolerado onde a razão é deixada livre para combatê-lo”, e dominou a política americana com sua visão pelo século seguinte e além.
É doloroso e possivelmente injusto colocar Jefferson e Adams lado a lado com Trump e Biden. Sob qualquer perspectiva, os últimos são muito velhos, muito pequenos, muito fracassados. Além dos inerentes "pecados" de nossa humanidade política, no entanto, chegamos a uma disputa de princípios: a tradição jeffersoniana está sendo desafiada por uma nova visão de supervisão governamental do discurso digital. Americanos poderosos e influentes, como os democratas da Câmara, insistem na superioridade do princípio do controle e levaram nossas instituições muito longe nessa direção. A próxima eleição presidencial determinará se o resto da nação concorda.
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© 2023 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês: The New Censorship
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