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O ministro Luís Roberto Barroso deixou o STF como entrou: ignorando a Constituição. A Carta Magna não é citada uma vez sequer no voto em que Barroso defendeu a legalização do aborto no Brasil.
Com argumentos superficiais, já vistos em campanhas feministas e de ativismo pró-aborto, o magistrado não trouxe uma sustentação jurídica para atender o pedido do PSOL, que entrou com a ação no Supremo Tribunal Federal.
O caso não estava em pauta. Mas, em uma manobra, Barroso acionou o “plenário virtual” da corte para registrar o seu voto na última sexta-feira e, assim, ajudar a causa abortista no Brasil. Foi o último ato de uma carreira marcada pelo ativismo judicial e pelo desprezo pela lei.
Veja sete trechos do voto de Barroso que se apoiam em falácias — ou simplesmente em mentiras.
1) "Ninguém é a favor do aborto em si."
Faria sentido dizer que alguém a favor da descriminalização da tortura não é a favor da tortura?
Ainda assim, algumas pessoas são a favor do aborto, sim, porque lucram com isso financeiramente ou politicamente. Além disso, muitas mulheres escolhem abortar os próprios filhos sem que haja qualquer complicação de saúde, sem terem sido estupradas e mesmo tendo boas condições financeiras. Como não dizer que elas são a favor do aborto?
2) “A discussão real não está em ser contra ou a favor do aborto. É definir se a mulher que passa por esse infortúnio deve ser presa”.
O número exato de mulheres atualmente presas (em regime fechado, semiaberto ou provisório) no Brasil por terem realizado aborto em si mesmas é impreciso. Os dados disponíveis indicam que, de janeiro a junho de 2025, foram presos 149 homens e 12 mulheres por aborto. As informações estão no Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen).
O relatório não diferencia autoaborto do aborto feito por terceiros. Mas o fato de que a lista tem muito mais homens que mulheres já é um indício de que os presos são médicos ou pessoas que fazem abortos em terceiros. No Brasil, quem vai para a cadeia pelo crime de aborto foi punido por fazer um aborto em outra pessoa, e não em si mesma.
Barroso sabe que a ADPF não trata apenas da mãe do bebê abortado: ele próprio quer que médicos e enfermeiros e técnicos de enfermagem não sejam presos, e que os hospitais possam oferecer abortos livremente.
Ainda na sexta-feira, o magistrado proferiu uma decisão liminar que autorizava profissionais de enfermagem a auxiliarem a realização de abortos nos três casos em que não há punição para quem pratica. O STF formou maioria e derrubou a decisão no dia seguinte.
3) “A interrupção da gestação deve ser tratada como uma questão de saúde pública, não de direito penal.”
Uma coisa não exclui a outra. As áreas do direito penal e da saúde pública frequentemente se cruzam, especialmente em contextos onde uma condição ou prática tem implicações tanto para a saúde coletiva quanto para a legislação que tipifica crimes.
Vários temas de saúde pública também aparecem na legislação penal, como a negligência médica, a eutanásia e a venda de substâncias nocivas ao organismo.
Outro exemplo é a contaminação alimentar. Se uma empresa causar a morte de alguém por descumprir as regras sanitárias, o caso será um problema de saúde pública e ao mesmo tempo um assunto de direito penal.
4) “Pesquisas endossadas pela Organização Mundial da Saúde documentam que a criminalização não diminui o número de abortos, mas apenas impede que ele seja feito de forma segura.”
Um argumento comum aos defensores do aborto é que a legalização diminuiria a ocorrência dessa prática, mas a tese esbarra em um problema incontornável: como é possível saber quantos abortos aconteciam antes da legalização, se eles ocorriam de forma clandestina? Com frequência, ongs pró-legalização inflam os números de abortos ilegais para criar um senso de urgência em torno do tema.
E, ainda assim, há estatísticas mostrando um cenário diferente do apresentado por Barroso.
Na Espanha, os abortos aumentaram a cada ano após a legalização. Já no Uruguai os índices aumentaram cerca de um terço nos dois anos seguintes à vigência da legalização.
Nesse quesito, um indicador mais confiável é a taxa de natalidade. Recentemente, dois países que ampliaram os casos legais de aborto tiveram uma redução abrupta no número de nascimentos. Isso indica que o número de abortos aumentou. Na Colômbia, o número de nascimentos caiu 7,1% entre 2021 e 2022. Na Cidade do México, a mudança reduziu o número de nascimentos entre 2,3% e 3,8%.
5) “A criminalização penaliza, sobretudo, as meninas e mulheres pobres, que não podem recorrer ao sistema público de saúde para obter informações, medicação ou procedimentos adequados. As pessoas com melhores condições financeiras podem atravessar a fronteira com o Uruguai, Colômbia, ir para a Europa ou valer-se de outros meios aos quais as classes média e alta têm acesso.”
Mesmo que isso seja verdade, o papel do Estado é cumprir a lei e impedir, por exemplo, o funcionamento de clínicas clandestinas de aborto. Além disso, criminosos encontram formas de desobedecer a lei. Disso não se segue que o crime precise deixar de ser crime.
O crime “além da fronteira” também é uma justificativa frágil: criminosos em melhores condições financeiras vão para outros lugares, independentemente do delito. É só imaginar o mesmo argumento sendo aplicado à sonegação fiscal, à lavagem de dinheiro ou ao homicídio.
6) “As mulheres são seres livres e iguais, dotadas de autonomia, com autodeterminação para fazerem suas escolhas existenciais. Em suma: têm o direito fundamental à sua liberdade sexual e reprodutiva. Direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas.”
Mentira. O acesso ao aborto não é um direito fundamental. Não está na Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, tampouco na Constituição Federal do Brasil. Pelo contrário. A Constituição diz que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida”.
Mulheres e homens devem ser livres e ter autonomia. Mas também devem responder pela consequência de suas escolhas e não simplesmente descartar quem não lhes convém.
7) “A tradição judaico-cristã condena o aborto. Mas será que a regra de ouro, de tratar o próximo como desejaria ser tratado, é mais bem cumprida atirando ao cárcere a mulher que passe por esse drama?”
Falácia dupla. Aplicando-se a regra de ouro, obviamente a decisão deve ser a de proteger a vida do bebê. Além disso, é possível manter o aborto ilegal sem jogar as mães na prisão. Bastaria atuar com rigor contra quem realiza abortos ou vende medicamentos abortivos.




