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A COP 30 e o fiasco da “Diplomacia Verde” de Lula

Lula durante a COP 30, em Belém: divisor negativo para o Brasil.
Lula durante a COP 30, em Belém: divisor negativo para o Brasil. (Foto: EFE/ André Coelho)

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A COP 30, realizada em Belém, era anunciada com pompa pelo governo brasileiro como o evento que recolocaria o Brasil no centro da política climática global. A promessa era ambiciosa: a “COP da Amazônia”, como se repetia em Brasília, deveria simbolizar liderança ambiental, capacidade diplomática e competência organizacional. O que emergiu, porém, foi o oposto: um fiasco político, diplomático, logístico e simbólico que, para além das deficiências estruturais, expôs vulnerabilidades profundas – de gestão, de posicionamento estratégico e de coerência ambiental. Ou seja: o governo petista de Lula, um fracasso retumbante tanto na política interna quanto na externa. 

Num momento em que a crise climática exige ambição, clareza e credibilidade, o Brasil entregou improviso, contradição e perda de prestígio. Belém não se tornou vitrine de liderança: tornou-se um espelho das fragilidades nacionais, revelando um país que buscou projeção, mas não entregou substância.

A baixa estatura diplomática

O primeiro sinal de fracasso veio antes mesmo da abertura: o reduzido número de chefes de Estado e de Governo. Apenas 28 líderes estrangeiros compareceram, um dos quóruns mais baixos da história das COPs e menos da metade do registrado na última edição, em Baku, no Azerbaijão.

Estados Unidos, China, Índia e Rússia, responsáveis por grande parte das emissões globais, enviaram apenas representantes de escalões inferiores. O presidente da África do Sul, outro membro do BRICS, também não deu as caras. Quatro das cinco maiores economias poluentes simplesmente não enviaram seus líderes. Os presidentes dos países do Mercosul ignoraram solenemente o evento, justo quando Lula ocupa a presidência rotativa do bloco. A marginalidade do atual governo brasileiro é explicitada pela inviabilidade de sua agenda. O Brasil, sob Lula, é uma anomalia geoestratégica.

Esse esvaziamento diplomático não é mero detalhe: reflete, simultaneamente, a percepção internacional de que a conferência não seria palco de decisões ambiciosas e de que o anfitrião brasileiro não inspirava confiança suficiente para mobilizar compromissos relevantes. Se a intenção era projetar poder diplomático, o recado foi o contrário, pois tratou-se, explicitamente, de um voto de desconfiança tanto na capacidade organizacional do Brasil quanto na consistência de sua agenda climática. A retórica não bastou. A simbologia amazônica não convenceu. E a ausência dos grandes emissores reduziu drasticamente o alcance político da COP. 

Falhas estruturais: infraestrutura improvisada, segurança precária e logística colapsada

A infraestrutura para sediar o evento foi outro desastre, previsível e denunciado previamente pela própria ONU. Muito antes do início da conferência, a ONU já havia enviado uma carta formal alertando o governo brasileiro sobre falhas de infraestrutura e segurança. As críticas viraram realidade: falhas frequentes no sistema de ar-condicionado sujeitavam as pessoas a calor extremo, vazamentos de água, inclusive nos banheiros, instalações improvisadas e superaquecidas, um ambiente físico que não suportou o volume de participantes, problema amplificado pelo colapso no sistema de hospedagem, com preços extorsivos em hotéis, flats, motéis e até barcos utilizados para abrigar participantes.

O zênite (ou seria o nadir?) da desordem lulopetista ocorreu no penúltimo dia da COP, quando um incêndio atingiu a Zona Azul – área central das negociações – obrigando evacuação emergencial e gerando pânico entre delegados. A isso somaram-se episódios de invasão da área reservada às negociações por manifestantes indígenas, expondo falhas graves no esquema de segurança. Em vez de projetar competência logística e capacidade de acolher a governança global do clima, o Brasil se viu associado a improviso, descoordenação e riscos evitáveis.

A hipocrisia institucionalizada: obras polêmicas, impactos ambientais e o discurso verde

A escolha de Belém carregava peso simbólico poderoso, já que o governador do estado é um aliado do presidente Lula. Contudo, a preparação da cidade para a COP produziu paradoxos inexplicáveis. Obras de expansão viária para atender à precária logística do evento, como a controversa Avenida da Liberdade, um corredor de 13 km cortado diretamente da floresta, implicaram desmatamento, destruição de vegetação nativa, deslocamento de comunidades e impacto direto em ecossistemas locais.

A cidade que deveria simbolizar preservação acabou entregando ao mundo o oposto: destruição ambiental para viabilizar um evento ambiental, símbolo perfeito de uma conferência que destrói enquanto diz proteger. A imagem de “guardião da floresta” desmoronou diante de decisões que priorizaram o improviso descartável em detrimento de conservação real.

Somam-se relatos de especulação imobiliária e preços exorbitantes de hospedagem, que tornaram a participação inacessível para delegações de países menos ricos e para parcelas da sociedade civil, o que resultou em representatividade reduzida, participação desigual e mais um golpe à legitimidade do evento, além do aumento exponencial do custo de vida local. A “COP amazônica” correu o risco de se tornar uma COP elitista, exatamente o oposto do que se anunciava como uma governança global “inclusiva”.

Mas o pior ainda estava por vir. As incoerências – e hipocrisia – do governo brasileiro foram ditas e repetidas por observadores estrangeiros durante toda a conferência. No exato mês da COP, o Ibama autorizou novas pesquisas de petróleo na Foz do Amazonas, uma decisão frontalmente incompatível com o discurso de transição energética que Brasília vinha promovendo. Lula, qual bem se vê, é uma criatura circense que posa para fotos diante de líderes estrangeiros e arruína o meio ambiente na condução da política doméstica.

Enquanto o presidente denunciava os combustíveis fósseis na abertura da COP 30, tentando “vender” ao mundo um país ambientalmente comprometido, o próprio governo, internamente, ampliava a aposta nos fósseis. A mensagem enviada ao mundo foi clara: o protagonismo climático brasileiro é mais retórico do que prático. Uma operação de marketing climático, não de liderança. A contradição central ficou evidente: como liderar a luta global contra os combustíveis fósseis defendendo exploração petrolífera na Amazônia? A resposta é simples. Não lidera.

Da mesma forma, o governo prometeu uma “COP da implementação”, mas apresentou um mapa de transição energética sem cronograma, sem metas vinculantes e sem instrumentos claros de execução. As organizações da sociedade civil notaram: muita falação, pouca política pública concreta.

Resultados diplomáticos tímidos: uma COP sem impacto, sem cronograma e sem força

No conteúdo, o resultado foi igualmente decepcionante. Apesar do discurso de que seria a “COP da implementação”, o acordo final, o chamado “Mutirão Global”, falhou em entregar compromissos robustos e foi considerado tímido, genérico e incapaz de responder à emergência climática. O diplomata que chefiou a Conferência, embaixador André Aranha Corrêa do Lago, viu-se na contingência de explicar o inexplicável e fazer com que Lula parecesse menos ridículo do que é. Mas Corrêa do Lago, conquanto seja um diplomata competente, não pôde desfazer as bobagens lulistas.

No plano dos combustíveis fósseis, o Brasil não conseguiu articular nenhum compromisso concreto ou cronograma para sua redução ou eliminação, sem metas vinculantes claras ou, sequer, mecanismos de implementação. 

A proposta brasileira de um “mapa do caminho” para a transição energética estruturada, antes apoiada por dezenas de países, simplesmente não entrou no texto final, tendo morrido nas negociações. As metas de financiamento climático ficaram aquém. Parecia que a conferência até tinha certo arremedo de ambição, até o momento em que se precisou colocá-la no papel. Não por acaso, a União Europeia e outros atores chegaram a cogitar vetar o texto final por considerá-lo fraco e insuficiente. E os grandes emissores, ausentes, não se sentiram compelidos a assumir qualquer responsabilidade.

Comparada a edições históricas como a COP 21, que gerou o Acordo de Paris, a COP 30 aparece como um fracasso da diplomacia lulopetista. Paris produziu consenso, metas, compromissos juridicamente vinculantes. Belém produziu mais retórica que mudança. O Brasil buscou projetar estatura diplomática, mas a incapacidade de transformar discurso em entrega concreta gerou um contraste gritante. A comparação é cruel: Paris 2015 legou o mais importante acordo climático da história; Belém 2025 legou um texto diluído, insípido, e uma lista de pendências.

A COP 30 será lembrada como um divisor de águas negativo para o Brasil. Não apenas pelos erros logísticos ou pela ausência de líderes estrangeiros, mas pelo mais grave dos problemas, a distância entre o discurso e a realidade. E também pela egolatria nemésica de Lula, no que terá sido assistido por seus asseclas.

Ao final, tornou-se claro que o Brasil vive uma tensão esquizofrênica entre desejo e capacidade: deseja protagonismo global, mas hesita em assumir compromissos difíceis; reivindica liderança ambiental, mas convive com contradições energéticas; aspira organizar grandes eventos, mas luta com carências estruturais básicas. O que deveria ser um momento de orgulho nacional transformou-se em um retrato incômodo da megalomania diplomática de Lula: grande na retórica, precária no planejamento, sofrível na execução e medíocre nos resultados.

A COP 30 não entrará para a história como o renascimento climático que o Brasil tentou vender. Entrará como um sinal amarelo pulsante, um lembrete incômodo de que a distância entre o Brasil que promete e o Brasil que entrega é muito maior do que o governo admite.

A conferência expôs sem anestesia as falhas logísticas, as fragilidades diplomáticas, as contradições políticas e a insignificância prática dos resultados obtidos. O que deveria ser demonstração de protagonismo transformou-se em um inventário público de limitações reais, estruturais e inescapáveis, uma combinação que projeta mais decepção e incerteza do que liderança.

O país que ansiava por se apresentar como potência verde emergente acabou revelando, aos olhos do mundo, suas vulnerabilidades mais profundas. Se quiser recuperar credibilidade e exercer influência concreta na governança climática, o Brasil terá de abandonar encenações e abraçar a dureza da execução: trocar espetáculo por coerência, holofotes por estratégia e retórica por compromissos verificáveis.

Aliás, se o Brasil deseja, de fato, ocupar um papel minimante relevante no cenário internacional, precisará menos de estética e mais de estrutura; menos de discursos inflamados e mais de capacidade real de entrega; menos de vaidade simbólica e mais de coerência entre palavra e prática, o que não se afigura possível nesta atual gestão, performática e desconectada da realidade. 

Enquanto isso, COP 30 permanecerá como um espelho estilhaçado, refletindo não apenas a superficial ambição do país, mas também a extensão de sua fragilidade, de sua ausência de direção e de sua incapacidade de transformar aspirações em realidade. Belém poderia ter sido um marco histórico. Acabou sendo, mas do que um alerta, um vexame internacional.

Marcos Degaut é doutor em Segurança Internacional, ex-secretário especial adjunto de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, ex-secretário de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa e ex-secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior do Brasil (CAMEX).

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