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Liberdade de expressão

Defensor de Natuza Nery, Gilmar Mendes tem histórico de processos contra jornalistas 

Gilmar Mendes: ministro foi ao X prestar apoio à jornalista Natuza Nery, que acusa um policial de ameaçá-la.
Gilmar Mendes: ministro foi ao X prestar apoio à jornalista Natuza Nery, que acusa um policial de ameaçá-la. (Foto: Nelson Jr/STF)

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Supostamente ameaçada por um policial enquanto fazia compras num supermercado, no último dia 30, em São Paulo, a jornalista Natuza Nery rapidamente ganhou um exército de defensores.

Todos prontos para condenar de antemão o agente da lei, chamado de “bolsonarista”, “golpista” e “inimigo do STF” devido ao teor de suas postagens nas redes sociais.

Entre os advogados de primeira hora de Nery, está uma figura que, em tese, só deveria se manifestar nos autos de um eventual processo: o ministro da Corte Gilmar Mendes. 

Mas não. Mendes usou as redes sociais para apoiar a profissional da GloboNews.

“O ataque sofrido por Natuza Nery, em razão do simples exercício diário de seu ofício, exige pronta resposta do poder público, em especial dos órgãos de persecução penal”, afirmou no X.

A defesa da liberdade de expressão é sempre louvável. No entanto, o ministro tem um histórico marcado por intimidações e perseguições judiciais a jornalistas.

Em 2012, ele entrou com uma representação na Procuradoria-Geral da República contra Leandro Fortes e Mino Carta, à época repórter e diretor da CartaCapital, veículo conhecido por seu viés de esquerda.

A ação foi motivada pela divulgação de uma lista que o apontava como beneficiário de caixa 2 na campanha de reeleição do tucano Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais, em 1998. Segundo o ministro, a matéria tentou associá-lo indevidamente ao escândalo do Mensalão.

Dois anos depois, o ministro processou Paulo Henrique Amorim (1942-2019) por publicações em seu blog, o Conversa Afiada, que considerou ofensivas à sua honra. Amorim, outro notório esquerdista, foi condenado a pagar R$ 40 mil por danos morais.

Autor de livro foi condenado a pagar R$ 310 mil ao ministro do STF

Também em 2014, Mendes ajuizou uma ação contra o jornalista Rubens Valente, autor do livro Operação Banqueiro — sobre a Operação Satiagraha, que resultou na prisão do banqueiro Daniel Dantas.

De acordo com o magistrado, a obra era difamatória e questionava sua imparcialidade como juiz, pois sugeria uma ligação entre ele e Dantas.

Sentenciado a indenizar Gilmar Mendes em R$ 310 mil, Valente só não foi parar na cadeia porque conseguiu arrecadar mais de 90% do valor em uma vaquinha organizada por amigos. O ministro Alexandre de Moraes ainda determinou que a íntegra do processo deverá ser incluída em todas as novas edições do livro. 

O caso de Rubens Valente está na Corte Interamericana de Direitos Humanos. Mas chances do caso ir adiante são poucas — o atual vice-presidente do órgão é Rodrigo Mudrovitsch, advogado que prestou serviço para Mentes no processo.

Em 2017, foi a vez de Monica Iozzi, repórter do extinto programa CQC, ser condenada por criticar o magistrado. Quando ele concedeu um habeas corpus ao médico Roger Abdelmassih, indiciado pelos crimes de estupro e manipulação genética irregular, Iozzi declarou toda sua indignação nas redes sociais.

Resultado: teve de pagar R$ 30 mil por danos morais (a ação inicialmente era de R$ 100 mil).

Naquele mesmo ano, uma entrevista de Monica Iozzi ao jornalista Pedro Bial viralizou na internet. No trecho amplamente compartilhado, ela se orgulha de ter recusado o acordo proposto pelo ministro. “Ele pediu para eu fazer uma retratação, mas sei que não falei nada de errado”, disse. 

Aqui vale citar uma informação curiosa: o cacique petista Paulo Pimenta, hoje um apoiador ferrenho de qualquer decisão do STF, foi um dos milhares de brasileiros que compartilharam o vídeo em sua conta pessoal. 

Alexandre de Moraes determinou que jornalista processado por Gilmar Mendes publique a íntegra da condenação nas novas edição de seu livro.Alexandre de Moraes determinou que jornalista processado por Gilmar Mendes publique a íntegra da condenação nas novas edição de seu livro. (Foto: Rosinei Coutinho/ STF)

Livro afirma que Mendes intimidou jornalista e dono da Jovem Pan 

Fora do âmbito judicial, informações de bastidores dão conta de supostas intimidações praticadas por Gilmar Mendes contra jornalistas e donos de veículos de comunicação. Como a relatada no livro “Os Onze” (Companhia das Letras, 2019), de Luiz Weber e Felipe Recondo, sobre o cotidiano do Supremo Tribunal Federal. 

Em uma das passagens da obra, os autores afirmam que Mendes não gostou de um comentário feito por Augusto Nunes, à época na Jovem Pan, acerca de uma briga entre ele o ministro Luiz Fux. E então enviou mensagens para Nunes e o dono da emissora, Antônio Augusto de Carvalho Filho (o “Tutinha”), insinuando que o jornalista estava sob o efeito de drogas durante o programa.

Outra situacão de intimidação aconteceu em 2018, em um seminário organizado pelo Instituto Brasiliense de Direito Público, em Lisboa. Questionado por uma repórter da Folha de S. Paulo sobre quem havia custeado sua viagem para Portugal, ele se exaltou.

“Devolva essa pergunta ao seu editor, manda ele enfiar isso na b*. Isso é molecagem, esse tipo de pergunta é desrespeito, é desrespeito”, disse.

De volta ao caso Natuza Nery: em outra manifestação de apoio no X, Gilmar Mendes afirmou que “as democracias dependem do jornalismo profissional; sem ele, não há liberdade de informação e, por conseguinte, liberdade de expressão”.

Os exemplos emblemáticos citados acima, no entanto, deixam pouca margem para dúvidas: quando “o exercício diário do ofício” do jornalista inclui o questionamento da atuação de Mendes na Corte, é possível que a resposta venha na forma de um processo judicial.

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