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Dizer que vivemos tempos estranhos é pouco. Por mais fascinante que seja a tecnologia, o mundo da inteligência artificial está tornando a vida moderna ainda mais surreal.
No mês passado, a música no topo da parada de vendas digitais de músicas country da tradicional revista Billboard (que acompanha o desempenho de canções e álbuns nos EUA) não foi escrita nem cantada por uma figura de botas e chapéu de cowboy.
“Walk My Walk”, do artista Breaking Rust, foi 100% gerada por inteligência artificial (IA).
É uma melodia cativante, com batidas pop e uma profundidade lírica que rivaliza com a maioria das canções country das paradas — ou seja, não muito profunda. O refrão desafia: "You can kick rocks if you don’t like how I talk, I’m gonna keep on talking and walk my walk" ("Você pode 'chutar pedras' se não gosta de como falo, eu vou continuar falando e seguir meu caminho).
Não tenho certeza se “chutar pedras” é considerado um insulto real em algumas regiões ou apenas uma alucinação da IA, mas a mensagem de independência é transmitida.
Sendo honesto, não é de todo ruim, especialmente se comparado ao restante do mercado musical. Parece que o prompt (comando inicial dado à IA) foi algo como: “Escreva uma música country cativante no estilo dos sucessos das paradas nos últimos dois anos”.
"Laboratório de Música Falsa"
Não é apenas o country que recebe o toque da IA. Um grupo chamado Fake Music Lab (“Laboratório de Música Falsa”) — pelo menos é honesto — lançou um vídeo chamado “Reimaginando ‘Ice Ice Baby’ como uma canção soul”, que transforma o hit dos anos 90 do rapper Vanilla Ice em algo que o próprio artista poderia chamar de “bem legal”.
Curiosamente, Vanilla Ice gostou tanto da versão gerada por IA que a repostou em seu canal oficial no YouTube.
Outros gêneros também são alvos fáceis. O Fake Music Lab produziu uma versão bluegrass de “Bad Romance”, de Lady Gaga. Já um grupo chamado ReGrooved criou uma versão country e melancólica de “In The Air Tonight”, de Phil Collins.
Como todas essas músicas têm vozes robóticas, nenhum cantor humano foi prejudicado na produção — exceto os que poderiam ter ocupado a vaga.
Robôs que louvam
A IA também está criando letras, melodias e vocais para músicas cristãs.
Um exemplo é o canal do YouTube Bible Folk, que lançou nos últimos meses vídeos com dezenas de canções inspiradas em livros da Bíblia. “Se o apóstolo Paulo cantasse Romanos em folk, soaria assim”, é o nome de uma dessas músicas.
Como “Walk My Walk”, a canção não é ruim, especialmente se comparada à concorrência na música cristã contemporânea. Embora as letras do Bible Folk sejam simples, algumas são teologicamente mais robustas do que muitas canções do gênero.
O problema é que nenhum humano escreveu ou cantou essas músicas, e qualquer aplauso seria para uma IA. No fundo, são apenas arranjos automatizados de material existente, sem nada realmente errado — e tudo isso, claro, pode ser divertido.
Sensação de algo errado
Há, porém, algo na música de IA — especialmente a cristã — que não parece certo. Existe um certo “fator de repulsa” ao perceber que a máquina escreveu, cantou e produziu tudo sozinha.
O falecido intelectual Leon Kass, especialista em ética, chamou essa reação de "sabedoria da repugnância", ao discutir sentimentos semelhantes sobre clonagem humana.
Ee disse: "A aversão não é um argumento. Algumas repugnâncias de ontem são aceitas hoje — nem sempre para melhor. Mas, em casos cruciais, a repulsa é a expressão de uma sabedoria profunda, além do alcance da razão para articulá-la plenamente".
Máquinas podem ser brilhantes e inovadoras, mas não são coroadas por Deus com glória e honra. Inverter essa ordem cria, talvez, a sensação de algo errado.
Suspeito que a diferença duradoura entre a música de IA e a música humana será justamente a longevidade. As faixas de IA desaparecerão em meses, lembradas apenas por futuras máquinas que aprenderem com elas.
©2025 The Daily Signal. Publicado com permissão. Original em inglês: Artificial Music for Artificial Ears: AI Rocks the Jukebox
Conteúdo editado por: Omar Godoy



