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Muçulmanos se reúnem e rezam em uma mesquita turca para marcar o feriado religioso muçulmano de Eid al-Adha [Festa do Sacrifício], nos subúrbios ao norte de Paris, França, 31 de julho de 2020.
Muçulmanos se reúnem e rezam em uma mesquita turca para marcar o feriado religioso muçulmano de Eid al-Adha [Festa do Sacrifício], nos subúrbios ao norte de Paris, França, 31 de julho de 2020.| Foto: EFE/EPA/Mohammed Badra

O que está acontecendo na França e como a imigração islâmica está desfigurando a Cidades das Luzes? Para responder a isso, a Nuova Bussola Quotidiana (site conservador italiano parceiro da Gazeta do Povo) entrevistou Pierre Vermeren. O historiador francês, professor de História Contemporânea na Sorbonne e especialista no Magreb e no mundo árabe-islâmico, sustenta que o Islã político continua a progredir na França. Autor de uma dúzia de obras notáveis, ele está convencido de que o terrorismo islâmico causou um choque na sociedade francesa e enfraqueceu a capacidade de resistência coletiva do país.

La Nuova Bussola Quotidiana — Nos últimos 12 meses, a França enfrentou novamente ameaças de ataques e tentativas de assassinato bem-sucedidas. Outro professor foi morto aos gritos de Allahu Akbar; houve muitos episódios de pressão do islã em escolas, universidades e empresas para impor seu modus vivendi. Até mesmo o Ramadã que terminou há pouco foi um pretexto para a mobilização identitária e comunitária. O Islã não tem mais medo de mostrar sua cara e de se impor no espaço público?

Pierre Vermeren — A ação da Irmandade Muçulmana e dos salafistas, que são menos numerosos, é de fato coordenada e se manifesta especialmente em determinadas épocas do ano (o Ramadã, o início do ano letivo) e em determinadas ocasiões (eleições municipais, guerra em Gaza, etc.). É claro que nem todos os muçulmanos na França são observantes. Mas é preciso dizer que uma grande parcela de fiéis e a maioria das mesquitas (há pelo menos 3.000) se referem a três países: Argélia, Marrocos e Turquia.

Os dois primeiros tentam manter uma barreira com a Irmandade Muçulmana e os salafistas, e não empurrar seus fiéis para uma escalada islâmica: para eles, é importante manter contato com seus cidadãos de origem. Para os turcos, isso é muito menos claro, já que o Islã turco, que é bastante controlado por Erdogan, é uma variante da Irmandade Muçulmana, com um componente nacionalista que luta contra a assimilação dos turcos na Europa.

Isso afeta a vida cotidiana e o relacionamento entre muçulmanos e não muçulmanos na França?

A Irmandade Muçulmana e os salafistas concentram sua ação nos jovens, por meio de suas 300 mesquitas, mas especialmente por meio de redes sociais, clubes esportivos, na escola e nas prisões, e com a economia halal. Seu objetivo é fazer com que a geração jovem de muçulmanos cresça em separatismo com relação à República, à língua francesa, ao imaginário nacional e à vida pública.

Eles querem que os jovens se sintam mais muçulmanos do que franceses. E isso pode ser visto, e é organizado, por meio de burquíni, abaya [Nota da tradução: vestimenta tradicional usada principalmente por mulheres muçulmanas em países do Oriente Médio e de maioria islâmica. Ela é uma espécie de manto longo, que cobre o corpo inteiro, exceto a cabeça, as mãos e os pés], absenteísmo escolar por motivos religiosos, boicotes a certas matérias escolares, orações na rua para pressionar os prefeitos, salafização de certos bairros (até mesmo pela força, se necessário), e pressão para que todos as muçulmanas se cubram e as outras não usem vestidos curtos.

Sempre falamos sobre os muçulmanos. Mas na França, muitas vezes são os estudantes menores de idade, ou aqueles com vinte e poucos anos, que se encontram no centro das dinâmicas, dos ataques e das ameaças terroristas. O que você pensa sobre isso?

É verdade. Há uma forte pressão que os muçulmanos exercem sobre os jovens por meio da mídia social, mas também nas ruas e nas escolas. No entanto, há uma geração que deseja uma vida ordenada, respeito às normas islâmicas e sucesso social para seus filhos. Nada mais. Eles criam crianças que não têm desejo de cometer atos terroristas, ou seja, de se colocar em perigo.

Com quem, então, os muçulmanos conseguem abrir espaço?

Certamente, com todos os jovens que representam as minorias nacionais pouco integradas e instrumentalizadas. Os que não falam francês, os criminosos – especialmente os condenados, mas também os arrependidos que gostariam de se purificar com a jihad – e, por fim, os convertidos, geralmente muito isolados e em ruptura com seu ambiente ou família. É entre aqueles que estão à margem e mal integrados que os recrutadores invisíveis das redes sociais encontram ouvidos atentos.

É assim que surge o terrorismo?

O terrorismo no Ocidente mostrou sua periculosidade porque acabou fazendo com que o Estado francês reagisse. É por isso que, mesmo que haja efeitos sobre a massa de fiéis (como o aumento do uso do véu entre as mulheres desde 2015 na França), a Irmandade Muçulmana prefere o trabalho de proximidade e de educação de jovens muçulmanos e o controle sobre as mulheres.

O aumento repentino do uso do véu islâmico na França e as pressões crescentes, como ameaças de morte àqueles que não querem contratar mulheres com véu, é uma consequência da influência, inclusive política, que a Irmandade Muçulmana tem no país?

O véu é uma obsessão imposta. Na França, a lei proíbe o uso do véu na escola, mas muitas jovens muçulmanas voltam a usá-lo na saída do ensino médio para que possam ir para casa sem serem repreendidas ou atingidas por cuspes pelos “guardiões” da ordem islâmica do bairro. A Irmandade tem uma influência enorme que passa por muitos canais, não apenas pela mesquita. Ela se infiltra nas instituições para tentar orientá-las e controlá-las: do conselho municipal ao clube esportivo, das associações islâmicas à mídia. Ela tem objetivos políticos (influenciar prefeitos prometendo seus votos); objetivos econômicos (desenvolver atividades halal reservadas e levantar fundos para o culto); e objetivos sociais (controlar a ordem social por meio de jovens e mulheres).

Isso está mudando a cara de muitas cidades francesas?

Um bairro controlado pela Irmandade Muçulmana é aquele em que as lojas não halal desapareceram e onde a maioria das mulheres muçulmanas usa véu. Esse é um indicador muito claro que permite traçar uma linha entre o que é frequentável (puro) e o que não é (impuro): é o separatismo em ação. E isso afeta centenas de bairros.

Você concorda com a ideia de que se tornou muito caro organizar ataques e que a nova fase é o que Kepel chama de “jihadismo de atmosfera”? Isso diz respeito apenas à França ou a toda a Europa?

A Irmandade Muçulmana e os fundamentalistas islâmicos sonham em conquistar a Europa: não com armas, porque isso sempre fracassou, mas por meio do assentamento de populações grandes e férteis. Esse é um milenarismo muito entusiasmante para eles, e eles tentam envolver os muçulmanos da Europa nessa aventura. Muitos não se importam, porque não saíram de seu país para isso, mas muitos outros veem nisso uma ambição ao seu alcance e trabalham com seriedade. Os atentados são vistos, dessa forma, como contraproducentes, por isso preferem o trabalho invisível em escolas, bairros, famílias e mesquitas para estabelecer áreas, ou ilhas, a partir das quais o Islã se desenvolverá na Europa.

Naturalmente, a conversão de cristãos é um objetivo muito procurado.

Nos últimos dez anos, a França mudou muito. É como se o limite de tolerância em relação ao Islã tivesse aumentado consideravelmente e as novas gerações gostassem disso. A França não lutará contra a imigração que muda sua identidade?

A França está passando por uma crise política, econômica, cultural, religiosa, intelectual e moral muito profunda. É uma sociedade “de cabeça para baixo” e, há décadas, não consegue encontrar uma classe política que represente seus interesses. Os franceses nunca votaram a favor da imigração, mas em três gerações, a França possui 17 milhões de imigrantes (com seus filhos). Eles nunca votaram a favor da desindustrialização, mas o país está sendo desindustrializado. Eles nunca votaram a favor do colapso do sistema educacional nacional e, no entanto, foi isso que aconteceu. Os franceses já não olham para o seu futuro.

E para o que eles olham quando votam?

Ao pequeno capital pessoal. Eles ainda são muito ricos e são incentivados pelas elites culturais e políticas a não fazerem muitas perguntas.

Infelizmente, apenas as classes populares e médias – empobrecidas – perceberam o que está acontecendo e estão se rebelando: elas não votam, ou votam cada vez mais na Reunião Nacional – um voto indigno para os habitantes das metrópoles. Questionar a imigração e o crescimento do Islã é visto como um apoio dado à família Le Pen (que vem dizendo isso há 40 anos), portanto, não se pode discutir. Os jovens das metrópoles se tornaram muito tolerantes, mas os dos subúrbios já estão fartos e agora votam na RN.

É difícil dizer o que vai acontecer, mas a crise é tão grave, em todas as frentes, que a situação poderia evoluir rapidamente.

Lorenza Formicola é ensaísta e jornalista, e analista do mundo árabe e islâmico. Especialista em islamismo na Europa, concentrou a sua investigação nas atividades de organizações e estruturas inspiradas na Irmandade Muçulmana.

© 2024 La Nuova Bussola Quotidiana. Publicado com permissão. Original em italiano: “Vermeren: ‘Gli islamisti puntano alla conquista dell'Europa’”.

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