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História

Pesquisadores celebram abertura do acervo da Gazeta do Povo como marco para a ciência nacional

Primeira página da Gazeta do Povo de 15 de dezembro de 1925
Primeira página da Gazeta do Povo de 15 de dezembro de 1925 (Foto: Acervo Gazeta do Povo)

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Para historiadores, sociólogos e acadêmicos, o lançamento do projeto Memória Paraná, nesta quarta-feira (17), representa muito mais do que a preservação de um jornal: trata-se da abertura de um dos mais robustos bancos de dados primários do Brasil. Ao disponibilizar para consulta pública cerca de 600 mil páginas da Gazeta do Povo — mais 200 mil páginas serão adicionadas em breve, de 1919 a 2017, o projeto entrega à comunidade científica uma ferramenta poderosa para a compreensão do século XX paranaense.

A iniciativa, viabilizada pela Lei Rouanet e patrocinada pela Companhia Melhoramentos Norte do Paraná (a Gazeta do Povo cedeu os direitos do acervo), não apenas digitalizou imagens, mas aplicou tecnologia de ponta para tornar o "passado pesquisável". Isso significa que teses de doutorado e dissertações de mestrado, que antes exigiriam meses de busca manual em microfilmes ou papéis frágeis, agora podem ter suas fontes levantadas em segundos.

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A fonte mais completa da história do estado

Quem define a dimensão do achado é o imortal escritor Jorge Caldeira, membro da Academia Brasileira de Letras, doutor em Ciência Política e sócio da empresa Mameluco, responsável pelo tratamento histórico dos dados do projeto. Com a experiência de quem mergulhou profundamente no material para estruturar o sistema de busca, Caldeira não economiza nas palavras para descrever a riqueza do acervo.

"Terei a alegria de enfim poder partilhar com o público um privilégio que foi quase somente meu nos últimos cinco anos: ajudar a desenvolver os instrumentos de pesquisa que levam a um conteúdo oceânico", afirma o pesquisador.

Para Caldeira, a continuidade e a abrangência da cobertura do jornal conferem ao material um caráter único para a historiografia regional. "Esta foi, de longe, a mais completa fonte de pesquisa com a qual tive contato nos cinco anos em que me dediquei à história do estado", declara.

A aplicação de inteligência artificial para o reconhecimento de caracteres (OCR) permite cruzar dados de forma inédita. É possível, por exemplo, rastrear a evolução de preços, o surgimento de bairros, a linguagem utilizada em crimes ou a cobertura de eventos políticos ao longo de décadas com precisão cirúrgica.

Democratização do acesso

A coordenação do projeto envolveu uma equipe multidisciplinar, incluindo historiadores, editores e arquivistas, sob gestão da Aurora Projetos. Assahi Lima, sócia e diretora da Aurora Projetos, destaca que o diferencial do Memória Paraná é a quebra das barreiras de acesso que historicamente dificultam a pesquisa acadêmica no Brasil.

"Ao contrário da maior parte das coleções de jornais, digitalizadas sob controle de seus proprietários e com acesso restrito para consulta, esse conjunto de relevante valor histórico será digitalizado para consulta pública e gratuita", afirma Assahi.

Para a pesquisadora, a facilidade de acesso é vital para a preservação da identidade local. "São 98 anos de um acervo fundamental para a compreensão do passado, a identificação do presente e as possibilidades do futuro".

Valorização da ciência local

O impacto da ferramenta também é celebrado no meio educacional como um antídoto contra o esquecimento e a desvalorização da produção científica regional. O professor Wesley Espinosa Santana, Doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e mestre em História Social pela Universidade de São Paulo (USP), reforça a necessidade de iniciativas que coloquem a história local em evidência.

Santana aponta para a importância de superar o que chama de "síndrome de vira-lata" e valorizar o conhecimento produzido aqui. Para ele, projetos como este são essenciais para "divulgar a ciência, a comunicação e a memória do nosso país".

Bastidores da tecnologia

Para tornar tudo isso possível, uma "equipe multidisciplinar" foi mobilizada, envolvendo historiadores, arquivistas e especialistas em tecnologia.

Sob a coordenação de Frederico Maróstica, esse time de historiadores e pesquisadores mergulhou nas páginas do jornal para garantir que a tecnologia de Inteligência Artificial (OCR) capturasse com precisão as informações. Entre os nomes que se debruçaram sobre o material estão Lucas Knabben, Michele Dias, e Lia Emi.

O grupo trabalhou dentro da Biblioteca Pública do Paraná, operando scanners de última geração. O desafio diário desses profissionais foi manusear originais muitas vezes frágeis, garantindo que cada edição, cada anúncio e cada fotografia fossem preservados com a máxima fidelidade.

O resultado é que agora, pesquisadores de qualquer lugar do mundo podem, em segundos, localizar fatos que antes exigiriam meses de pesquisa em microfilmes, garantindo que a história do Paraná seja contada com mais precisão e riqueza de detalhes.

Futuro da pesquisa

Com o acervo online, a expectativa é de um "boom" de novos estudos. O material permite revisitar fatos históricos sob a ótica do cotidiano, analisar discursos políticos da época e entender as transformações socioeconômicas do Paraná. O site memoriaparana.com.br se torna, assim, um laboratório aberto 24 horas para pesquisadores de qualquer lugar do mundo, garantindo que a história do Paraná não fique restrita a arquivos físicos, mas ganhe o mundo através da pesquisa digital.

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