O regime de Daniel Ortega, na Nicarágua, encontrou uma maneira lucrativa de se beneficiar com a crise migratória que afeta atualmente os Estados Unidos.
Em meio a severas sanções econômicas impostas por Washington, a ditadura nicaraguense transformou o fluxo de imigrantes que atravessam seu território rumo ao norte em uma fonte substancial de receita.
Conforme informações do portal independente Confidencial, somente nos primeiros três meses de 2024, a Direção de Migração e Estrangeiros (DGME) da Nicarágua arrecadou 311 milhões de córdobas (a moeda local) em taxas imigratórias, cerca de US$ 8,4 milhões. Esse valor corresponde a 53% da meta anual de arrecadação, que é de 586 milhões de córdobas (cerca de US$ 15,9 milhões).
De acordo com denúncias analisadas pelo portal, a maior parte dessas taxas provém de multas que o regime sandinista tem cobrado de forma obrigatória dos imigrantes que chegam ao país com o objetivo de seguir até a fronteira entre o México e os EUA.
Grande parte desses imigrantes são de países como Cuba, Haiti e Venezuela. Alguns também são originários de diversas regiões da Europa, Ásia e África.
De acordo com análises de portais independentes, cada um desses imigrantes são obrigados a pagar ao regime sandinista multas no valor de US$ 150 e US$ 200. Ao pagarem tais valores, eles conseguem uma espécie de “salvo-conduto” do da ditadura de Ortega, que os permite transitar livremente pela Nicarágua e atravessar as fronteiras do país sem enfrentar problemas pelo prazo de 96 horas.
A arrecadação do regime sandinista com esse procedimento tem sido significativa. Em 2023, o pagamento dessas multas por parte dos imigrantes rendeu cerca de 1,6 bilhão de córdobas (cerca de US$ 43,4 milhões) aos cofres da ditadura de Ortega, de acordo com o Confidencial.
Em maio deste ano, os Estados Unidos aplicaram novas sanções contra a Nicarágua que visavam justamente conter a imigração irregular. Os americanos, que acusam o regime de Ortega de estar facilitando a entrada de imigrantes em seu território, acreditam que a Nicarágua tem sido um dos pontos de partida para aqueles que desejam tentar entrar ilegalmente no seu território.
Especialistas em imigração e refugiados têm acusado a ditadura sandinista de estar utilizando os imigrantes como arma contra o governo dos EUA.
"[...] Ortega sabe que tem poucas ferramentas políticas importantes para enfrentar os Estados Unidos, então usa a migração como uma arma de ataque”, disse Manuel Orozco, diretor do programa de migração, remessas e desenvolvimento do Inter-American Dialogue, à Associated Press (AP), em 2023.
O subsecretário de Estado dos EUA para Assuntos do Hemisfério Ocidental, Brian Nichols, enfatizou no ano passado que "ninguém deveria lucrar com o desespero dos migrantes vulneráveis".
Não é o que pensa o ditador sandinista, já que o fluxo de imigrantes que chegam à Nicarágua tem aumentado constantemente e contam ainda com a atuação clandestina de diversas companhias aéreas.
Neste mês, o governo do presidente Joe Biden, que acusa Ortega de estar lucrando com a crise que afeta o seu país, anunciou que sancionou um executivo de uma companhia aérea de voos fretados, que não teve seu nome revelado, por estar facilitando o transporte de imigrantes até a Nicarágua.
"Continuaremos tomando medidas para impor restrições de visto aos proprietários, executivos e funcionários do alto escalão de empresas de transporte sem escrúpulos", disse o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Matthew Miller, em um comunicado.
Dados do Banco Central de Nicarágua, divulgados pelo Confidencial, mostram que, entre janeiro e março de 2024, aproximadamente 198.500 novos passageiros desembarcaram no aeroporto internacional Augusto C. Sandino, em Manágua, um aumento de 50 mil em relação ao mesmo período observado no ano passado, que pode estar sendo impulsionado pela chegada daqueles que querem ir para o norte.
De acordo com veículos de comunicação americanos, a maior parte dos imigrantes estão escolhendo a Nicarágua como ponto de partida para chegar aos EUA por ser considerada uma rota mais segura quando comparada a perigosa travessia pela selva de Darién.
“Ortega tem tido, historicamente, um ódio profundo pelos Estados Unidos. Ele considera o país um império maligno que precisa ser enfrentado”, disse Orozco em entrevista concedida à National Public Radio (NPR) em janeiro deste ano. O especialista afirmou que o regime sandinista tem flexibilizado os requisitos de visto para países como Cuba e Haiti, de onde saem um alto número de imigrantes, desde novembro de 2021.
“[...] Há dinheiro a ser ganho [pela Nicarágua] em cada voo que chega, nas taxas cobradas das companhias aéreas e nas taxas aeroportuárias cobradas de cada indivíduo que entra no país”, afirmou Orozco à NPR, acrescentando que a “Nicarágua é responsável por pelo menos 10% de toda a migração que chegou à fronteira México-EUA”.
As autoridades dos EUA têm manifestado preocupação com as políticas migratórias permissivas do regime nicaraguense, afirmando que elas também têm contribuído para o aumento das operações de tráfico humano.
Métodos diversos
De acordo com as informações, o regime sandinista parece não se limitar apenas à cobrança de multas dos imigrantes que usam o país para chegar nos EUA.
Segundo o Confidencial, o DGME também tem gera receita significativa através da emissão de vistos de turismo. O portal afirma que essa ação já rendeu 21 milhões de córdobas (cerca de US$ 572,730) para os cofres do regime sandinista somente nos primeiros três meses de 2024.
Além dos cartões, o regime cobra ainda por taxas de utilização do terminal aéreo, agilização de passaportes, trâmites de residência e prorrogações de estadia.
Ditadura da Nicarágua foi apoiada pelo PT e relativizada por Lula
O PT já manifestou apoio a Ortega. Em 2021, o partido, em nota, classificou a vitória do sandinista nas eleições presidenciais, onde praticamente todos os seus opositores estavam presos, como uma “grande manifestação popular e democrática”. Fortemente criticado pela ação, o partido retirou a nota do ar pouco tempo depois de publicá-la, citando que a mesma “não havia sido submetida à direção partidária”.
Em entrevista ao El País em 2021, antes de ser eleito presidente, Lula minimizou a permanência controversa de Ortega na liderança da Nicarágua, comparando-o à ex-chanceler federal da Alemanha Angela Markel.
“Por que Angela Merkel pode ficar 16 anos no poder e Daniel Ortega não? Qual é a lógica?”, disse naquele momento o petista.
Durante o debate presidencial de 2022, ao ser questionado sobre seu apoio ao regime de Ortega pelo então presidente Jair Bolsonaro, seu adversário, Lula disse que sentiu “muito orgulho de no dia 19 de julho de 1980 ir participar da comemoração do aniversário da Revolução Sandinista [da Nicarágua] que derrubou um ditador chamado Somoza, de 30 anos”.
“Agora o regime político da Nicarágua é uma coisa que depende deles e o Daniel Ortega sabe, você sabe, o Chávez sabe – que se eu quisesse acreditar em mandato perpétuo, eu teria feito um terceiro mandato quando me propuseram”, afirmou o petista naquela ocasião.
No ano passado, já liderando o governo, Lula não assinou uma declaração da Organização das Nações Unidas (ONU) - apoiada pelos EUA, Alemanha, França e mais de 50 países - que condenava os crimes do regime sandinista, acusado de perseguir opositores e religiosos. Também em 2023, o governo petista pediu que a ONU estabelecesse um “diálogo construtivo” com o regime esquerdista.
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