Pelo menos 17 pessoas morreram nesta terça-feira (25) no Quênia em meio a graves protestos contra um novo projeto de lei que contempla aumentos de impostos.
Os protestos, que estão sendo severamente reprimidos pelas autoridades, culminaram na invasão do Parlamento queniano nesta terça.
Gritando “Ruto deve sair, Ruto deve sair!”, em referência ao presidente do Quênia, William Ruto, e ao seu governo, os manifestantes, em sua maioria jovens, conseguiram entrar no Parlamento através do Senado, apesar da dura resposta da polícia, em um protesto sem precedentes na história recente do Quênia.
Os manifestantes incendiaram um dos prédios do local e alguns deles chegaram até a um dos refeitórios. A polícia tentou primeiro dispersá-los com gás lacrimogêneo e canhões de água, mas, por volta das 14h30 (horário local, 8h30 de Brasília), começaram a disparar munições e vários corpos ficaram caídos em frente ao Parlamento, enquanto pelo menos quatro foram removidos pelos próprios manifestantes.
Segundo detalhou uma fonte do Grupo de Trabalho para a Reforma da Polícia do Quênia (PRWG-Kenya), que inclui organizações como a Anistia Internacional (AI), à Agência EFE, pelo menos 14 das 17 mortes que ocorreram até esse momento foram registradas durante essa invasão ao Parlamento, que fica na capital do país, Nairóbi.
Da mesma forma, as ONG documentaram até agora 86 feridos, bem como 52 detenções, pelo menos 43 delas na capital queniana, acrescentou a fonte do PRWG-Kenya, que preferiu manter o anonimato.
“Apesar das garantias dadas pelo governo de que o direito de reunião seria protegido e facilitado, os protestos de hoje degeneraram em violência. Observadores dos direitos humanos e profissionais da área médica relataram vários incidentes de violações dos direitos humanos”, lamentou o PRWG-Kenya em uma declaração conjunta.
A plataforma afirmou ainda ter registrado pelo menos 21 “sequestros e desaparecimentos” de ativistas nas últimas 24 horas, pelas mãos de agentes “fardados e não fardados”, embora dois dos raptados já tenham sido libertados.
Em um comunicado, a presidente do Supremo Tribunal e chefe do Poder Judiciário queniano, Martha Koome, expressou nesta terça-feira sua “profunda preocupação” com os sequestros, que classificou como “ataque direto ao Estado de direito, aos direitos humanos e ao constitucionalismo”, e pediu que “qualquer ação criminosa seja processada legalmente”.
Na invasão do Parlamento, os manifestantes destruíram móveis, janelas e bandeiras, ao mesmo tempo em que acusavam os políticos de serem “traidores”, depois de 195 deputados terem votado preliminarmente a favor do projeto de lei, contra 106 votos contrários, embora ainda falte a votação final.
Com este projeto, o governo pretende arrecadar US$ 2,7 bilhões em impostos adicionais para reduzir o déficit orçamental e a dívida do Estado. No entanto, os manifestantes sustentam que estas medidas fiscais empurrariam a população para a pobreza.
A Lei das Finanças de 2024 proposta pelo governo prevê também novos impostos, como o IVA de 16% sobre o pão e o de 2,5% sobre os veículos, além do aumento de alguns dos já existentes, como o imposto sobre serviços de transferência de dinheiro móvel.
No entanto, o presidente da Comissão de Finanças e Planejamento da Assembleia Nacional, Kimani Kuria, anunciou na terça-feira passada, após uma reunião presidida por Ruto, antes da apresentação do projeto de lei, que haveria alterações e alguns impostos seriam eliminados.
Entre outros impostos, foi eliminado o IVA que incidiria sobre o pão.
Ao contrário dos protestos antigovernamentais que o Quênia tem vivido historicamente, violentos e promovidos por líderes políticos, estas manifestações foram convocadas por jovens da chamada 'geração Z' (nascidos entre meados dos anos 1990 e a primeira década do século XXI).
Os protestos são promovidos através de redes sociais como TikTok, X e Instagram e costumam ter um tom pacífico.
No começo da tarde o governo acionou o Exército para ajudar a polícia local a conter os manifestantes.
"As Forças de Defesa do Quênia serão mobilizadas em 25 de junho de 2024 em apoio ao Serviço Nacional de Polícia", disse o ministro da Defesa do Quênia, Aden Duale, em breve decreto publicado no "The Kenyan Gazette", o diário oficial do país.
Reação internacional
Os EUA e mais 12 países lamentaram a violência durante os protestos no Quênia. Em uma declaração, eles disseram que estavam “profundamente preocupados com a violência testemunhada em muitas partes do país durante os recentes protestos e estamos especialmente chocados com as cenas presenciadas em frente ao Parlamento queniano”.
A declaração foi assinada pelos EUA, Reino Unido, Alemanha, Dinamarca, Finlândia, Irlanda, Holanda, Estônia, Noruega, Suécia, Romênia, Bélgica e Canadá.
“Lamentamos a trágica perda de vidas e ferimentos sofridos, inclusive pelo uso de munições reais”, citou a declaração, alertando que “a Constituição do Quênia garante o direito ao protesto pacífico”.
Os países pediram “contenção de todas as partes” e encorajaram “todos os líderes a encontrar soluções pacíficas através do diálogo construtivo”.
“Todos os atores têm a responsabilidade de respeitar, defender, promover e cumprir os princípios da democracia e do Estado de direito, em particular garantindo uma resposta de segurança proporcional”, disseram. (Com Agência EFE)
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