Desde que iniciou sua invasão à Ucrânia em 2022, a Rússia vem intensificando suas operações de sabotagem e espionagem contra países do ocidente, informaram no começo deste ano autoridades de inteligência dos EUA e da Europa. Agora, o regime russo passou a utilizar uma nova estratégia: a aliança com redes criminosas e o recrutamento de cidadãos de diversos países para executar ações de sabotagem e outras atividades desestabilizadoras, como incêndios criminosos e manipulação de informações, disse nesta semana Ken McCallum, diretor do serviço de contraespionagem britânico MI5.
McCallum afirmou que essa nova abordagem de Moscou visa criar “caos nas ruas tanto da Grã-Bretanha quanto da Europa”.
O diretor do MI5 explicou que, após a expulsão de mais de 750 diplomatas russos de todo o continente europeu — muitos dos quais identificados como espiões do Kremlin —, as operações de inteligência da Rússia sofreram um impacto significativo. No entanto, longe de desistir de suas atividades, os serviços secretos do ditador Vladimir Putin começaram a formar parcerias com membros de redes criminosas e a recrutar cidadãos de diversos países para manter sua missão de causar instabilidade no Ocidente, especialmente nas nações que apoiam a Ucrânia com ajuda militar. Essa mudança de tática já se reflete em uma série de incidentes suspeitos, como incêndios, ataques e explosões em instalações militares e industriais na Europa, conforme relatado por McCallum.
Não é de agora que os serviços de inteligência ocidentais têm alertado sobre a crescente ousadia das operações russas, especialmente no que diz respeito à sabotagem de infraestruturas críticas. Um exemplo recente foi a suposta tentativa de assassinato de Armin Papperger, CEO da Rheinmetall, uma importante fornecedora de armas e munições para a Ucrânia. De acordo com relatórios da inteligência dos EUA, citados pela emissora CNN, agentes vinculados à Rússia estavam conspirando para tentar matar Papperger, uma ação que foi frustrada graças a uma operação conjunta de autoridades alemãs e americanas.
O uso de sabotagem também não é uma novidade para a Rússia. Como destacam os jornalistas Andrei Soldatov e Irina Borogan, pesquisadores do think tank Centro de Análise de Políticas Europeias (Center for European Policy Analysis - CEPA), em um artigo escrito para a revista Foreign Affairs, o país tem uma longa tradição de operações desse tipo, remontando ao período soviético, onde, durante a Guerra Fria, a KGB e a GRU (ambos da inteligência militar soviética) mantinham planos para realizar sabotagens no Ocidente.
O atual contexto de guerra na Ucrânia proporcionou a Moscou uma nova oportunidade para intensificar suas operações de desestabilização em países ocidentais. A parceria com redes criminosas que operam nas sombras desses países, aliada ao recrutamento de mercenários e até cidadãos comuns, pode ocultar ainda mais as atividades invasivas do Kremlin. No artigo, Soldatov e Borogan relatam que, desde o início deste ano, a Rússia tem lançado uma série de ataques coordenados contra infraestrutura vital na Europa, incluindo redes de transporte e instalações industriais.
Em março, os autores citam que um depósito em Leyton, no leste de Londres, vinculado à Ucrânia foi incendiado – após este ato, criminosos britânicos foram presos sob acusação de estarem vinculados à inteligência russa -, enquanto em maio, uma fábrica de metais para fabricação de armas em Berlim sofreu um ataque semelhante – com a inteligência alemã também vinculando o ato à agentes criminosos infiltrados. Tais operações seguem um padrão consistente, com alvos estratégicos que parecem serem escolhidos a dedo para dificultar o apoio logístico e militar de países ocidentais à Ucrânia.
Outro exemplo da sabotagem russa, segundo os autores, foi o ataque ao sistema ferroviário da França em julho, que deixou milhões de passageiros paralisados no dia da abertura dos Jogos Olímpicos em Paris. Embora nenhuma organização tenha reivindicado o ataque, analistas de inteligência sugerem que a Rússia poderia estar envolvida, devido ao apoio da França à Ucrânia.
Além dos ataques diretos, a Rússia também tem utilizado o disparo de informações falsas para influenciar a opinião pública nos países ocidentais. Este ato tem o potencial de causar pânico e incerteza, o que, em última instância, pode enfraquecer tanto o apoio europeu quanto o americano à resistência ucraniana.
Segundo Soldatov e Borogan, países ocidentais tem lidado com esses incidentes de forma fragmentada, sem uma resposta coordenada. Os autores citam que a ausência de uma estratégia conjunta do Ocidente e, principalmente da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) contra as ações de inteligência da Rússia, dificultam uma resposta eficaz contra as possíveis operações em curso do Kremlin, que, embora não desencadeiem, neste momento, uma guerra aberta, têm potencial para causar grandes danos.
Por sua vez, Moscou nega categoricamente qualquer envolvimento em atos de sabotagem. Dmitry Peskov, porta-voz da Rússia, classificou as alegações recentes do diretor do MI5 como “infundadas” e acusou o Ocidente de fomentar uma “histeria anti-Rússia”. O regime de Putin também negou estar envolvido no ataque contra o sistema ferroviário francês. No entanto, está claro que causar caos nas ruas da Europa e minar o apoio à Ucrânia são objetivos centrais do Kremlin, que está testando neste momento os limites da paciência ocidental.
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