Em 27 de outubro, a população do Uruguai, além de votar no primeiro turno da eleição presidencial, também decidirá nas urnas um tema que tem gerado muita preocupação: uma modificação no artigo 67º da Constituição do país, proposta pela maior central sindical uruguaia para alterar as regras previdenciárias locais.
O texto prevê o fim das Administradoras de Fundos de Poupança Previdenciários (Afap, na sigla em espanhol, órgãos de previdência privada), a fixação da idade mínima para aposentadoria em 60 anos (hoje é de 65 anos para os nascidos a partir de 1977, com faixas de transição para os nascidos antes disso) e a equiparação das pensões e aposentadorias mínimas ao salário mínimo nacional.
A proposta vai a plebiscito nacional porque a Plenária Intersindical dos Trabalhadores - Convenção Nacional dos Trabalhadores (PIT-CNT) conseguiu reunir 430.023 assinaturas para que a decisão sobre ela seja tomada nas urnas.
“Há uma questão central: privilégios versus direitos humanos. É bom conceber a seguridade social em termos de direitos humanos como uma esfera dedicada à proteção das pessoas e não ao lucro financeiro. Por isso, é positivo que o povo decida sobre a possibilidade de erradicar o lucro financeiro da seguridade social”, afirmou o presidente da PIT-CNT, Marcelo Abdala, em comunicado divulgado pela central sindical.
A proposta vai na contramão do que a maioria dos países do mundo tem decidido sobre a previdência, ante o crescimento da porcentagem de cidadãos idosos na população, e gera incertezas sobre o futuro das contas públicas e da economia do Uruguai.
Um relatório da corretora de valores Nobilis, cujos números foram divulgados pelo jornal uruguaio El País, apontou que, se aprovada, a mudança constitucional produziria instabilidade fiscal, aumento do risco-país, diminuição dos investimentos privados e insegurança jurídica, entre outras consequências.
O estudo apontou que as perdas decorrentes da medida podem somar até US$ 10 bilhões, um valor exorbitante para um país cujo PIB em 2023 foi de US$ 77,24 bilhões, segundo dados do Banco Mundial.
Álvaro Delgado, candidato do conservador Partido Nacional na eleição para a presidência (o atual presidente, Luis Lacalle Pou, da mesma legenda, não pode concorrer à reeleição porque a lei uruguaia não permite mandatos consecutivos), vem fazendo forte campanha para que a proposta seja rejeitada.
“Não se trata apenas de uma mudança no sistema, mas de uma alteração que poderá desestabilizar completamente o equilíbrio econômico do país”, declarou no final de agosto, durante um ato de campanha no departamento de Salto.
O principal rival de Delgado na eleição de 27 de outubro, Yamandú Orsi, da esquerdista Frente Ampla, dos ex-presidentes Tabaré Vázquez e José Mujica, se vê numa posição constrangedora: embora ele pessoalmente não concorde com a reforma proposta pela PIT-CNT, partidos da sua coalizão, como o Comunista e o Socialista, apoiam a medida.
A Frente Ampla deu liberdade para seus partidos se posicionarem sobre o tema como preferirem.
No mês passado, durante a inauguração das obras do data center que o Google vai construir no parque científico do departamento de Canelones, Orsi deu uma coletiva de imprensa e falou sobre o tema.
Perguntado sobre a reforma previdenciária, o esquerdista disse que será mais difícil presidir o Uruguai caso a proposta seja aprovada.
“Se isso acontecer, teremos que sentar e analisar como continuaremos e quais serão as consequências”, disse Orsi, segundo declarações publicadas pelo jornal El Observador. “Temos que analisar. Teremos uma dificuldade extra”, acrescentou.
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