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Análise de especialistas

Trump pode ajudar Bolsonaro a se livrar de uma condenação e voltar ao poder?

O presidente dos EUA, Donald Trump, ao lado do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, após reunião na Casa Branca, em 2019 (Foto: EFE/ Jim Lo Scalzo)

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A denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) contra o ex-presidente do Brasil Jair Bolsonaro, apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (18), repercutiu na imprensa internacional e trouxe novamente ao debate público a hipótese de um envolvimento mais direto do governo americano no cenário político brasileiro. No ano passado, Bolsonaro já havia dito ao Wall Street Journal que espera um apoio claro de Donald Trump para protagonizar no Brasil uma “virada de jogo” semelhante à que o republicano alcançou no Estados Unidos.

Nesta quarta-feira (19), outro episódio envolvendo a justiça americana e o ministro do STF Alexandre de Moraes deu eco à tese. A empresa Trump Media and Tecnhology Group Corp, ligada ao presidente, acionou a Justiça americana contra Moraes, argumentando que decisões judiciais dele censurando o Rumble (plataforma de vídeo que é autora do processo junto com a Trump Media) interferiram em seus negócios. Moraes é acusado em um tribunal federal dos EUA de "violar a soberania" do país.

A nova ação indireta de Trump contra um magistrado do STF - que também enfrentou disputas legais com o bilionário Elon Musk e sua rede social X no ano passado - abriria mais uma possibilidade de envolvimento da administração republicana na política brasileira.

A Gazeta do Povo ouviu especialistas em relações internacionais, para avaliar as chances de o mandatário americano ajudar Bolsonaro a se livrar de uma condenação e a chegar novamente à presidência em 2026.

Apoio indireto

Para o economista Igor Lucena, doutor em Relações Internacionais e CEO da Amero Consulting, o apoio de Trump a Bolsonaro deve seguir de forma indireta nos próximos anos.

O especialista citou como exemplo a expectativa de uma atividade mais livre das big techs no país, sem regulação forte do Estado. "Esse apoio indireto ocorre, por exemplo, com as big techs tendo mais liberdade no Brasil, sem amarras do ponto de vista de esquerda e direita. Havia uma visão muito clara de que posicionamentos mais alinhados à direita eram mais cerceados do que os alinhados à esquerda", pontou.

Na opinião do analista, ainda é cedo para concluir qual será a posição do governo americano sobre uma possível condenação de Bolsonaro. No entanto, Lucena destaca que, atualmente, "há uma visão compartilhada pelo secretário de Estado Marco Rubio e outros integrantes do governo Trump de que o Brasil vive um momento em que agentes políticos não estão totalmente abertos em suas posições".

O especialista aponta que, baseado nessa visão da gestão republicana, "há possibilidade de que uma ação do Supremo ou do governo federal tentando implementar regulamentações sobre as big techs e redes sociais possa ser encarada pelos EUA como um cerceamento de direitos fundamentais, como a livre expressão, e até mesmo resultar em sanções".

A partir disso, a candidatura do ex-presidente para as eleições de 2026, poderia ser impulsionada, em sua análise. Atualmente, Bolsonaro está inelegível até 2030. "O governo americano pode fazer críticas abertas e até impor sanções ao Brasil. Tudo isso poderia beneficiar Bolsonaro. Do meu ponto de vista, nada vai ser feito pelo governo Trump de uma forma ativa, mas sim de uma maneira reativa às ações do que pode acontecer aqui no Brasil", disse Lucena.

Outra alternativa é que o governo Trump considere Bolsonaro um político perseguido em seu país. Lucena citou o próprio caso do presidente americano, que enfrentou diferentes processos na Justiça e conseguiu se reeleger.

"Da mesma maneira que, no caso do presidente Trump, tentaram impedir sua candidatura, mas isso não avançou nos EUA, e ele acabou sendo eleito, pode existir uma visão no governo Trump de que Bolsonaro está sendo perseguido".

Apoio simbólico

Para Eduardo Galvão, professor de Direito das Relações Internacionais do Ibmec Brasília, a influência real de Trump em uma possível candidatura de Bolsonaro em 2026 depende de algumas variáveis que vão além do simbolismo e do alinhamento retórico.

Segundo o analista político, apesar de Trump voltar ao cenário internacional "com mais poder", até o momento não há qualquer mecanismo institucional ou jurídico que permita aos EUA interferirem diretamente no processo eleitoral brasileiro, por isso, a reversão da inelegibilidade, por exemplo, não é cabível.

Para Galvão, a principal fonte de influência do presidente republicano em apoio a Bolsonaro seria o apelo público, simbólico. "Isso poderia fortalecer a narrativa de Bolsonaro e ajudá-lo a manter sua base engajada, mas, na prática, não muda o cenário jurídico que o impede de concorrer."

Citando o caso da PGR, o analista pontua que Trump pode até condenar as investigações e ecoar o discurso de perseguição política contra Bolsonaro, mas seu apoio "não mudará as provas reunidas pelo Ministério Público brasileiro". Segundo Galvão, "o paralelo entre os dois ex-presidentes é evidente, mas, juridicamente, cada caso segue sua própria trajetória".

Desgaste da imagem de Lula

Para o professor do Ibmec, a forma mais concreta de Trump colaborar com o ex-presidente brasileiro seria por meio do desgaste da imagem do governo Lula no cenário internacional.

Uma possibilidade nesse sentido seria a da investigação que tramita na Organização dos Estados Americanos (OEA) sobre violações de direitos e liberdade de expressão no Brasil. Segundo o analista político, "uma condenação agressiva do governo americano poderia desgastar a imagem do Brasil no exterior e criar constrangimentos diplomáticos". No entanto, historicamente, Washington só adota essa postura quando há interesses estratégicos em jogo, como segurança regional ou grandes acordos comerciais.

Em novembro do ano passado, Bolsonaro concedeu entrevista ao jornal americano The Wall Street Journal, na qual afirmou que espera um apoio claro de Trump.

Na ocasião, ele declarou que enxergava a reeleição do republicano como uma "virada de jogo" para seu futuro e para os políticos de direita na América Latina. “Trump está de volta, e é um sinal de que nós também voltaremos”, disse em novembro, acrescentando que aliados, incluindo seu filho Eduardo Bolsonaro, deputado federal, estavam em "contato direito" com o novo governo dos EUA.

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