Todos os dias, no caminho que leva da porta de casa até o portão da escola, os corações de pais e mães espalhados por todo o mundo param de funcionar por alguns centésimos de segundos. Por fora, sorrisos e palavras de incentivo querem convencer crianças e adolescentes das mais diversas idades de que o curso da vida é mesmo esse. Por dentro, culpa, tristeza, dor e a sensação de que todo o tempo do mundo ainda não seria tempo suficiente.
Aliás, não só o tempo. Ter filhos é experimentar constantemente a sensação de insuficiência. Os braços são curtos, os olhos não enxergam tudo o que deveriam, os ouvidos estão frequentemente ocupados com sons desimportantes, o abraço não aperta o bastante, a atenção poderia ser maior. E, ainda assim, bilhões de pais e mães seguem vivendo. Levando seus rebentos à escola, à casa dos coleguinhas, ao futebol, à dança, à capoeira. Como se não andassem por aí com o coração pulsando fora do peito.
Não se culpe, porque os verdadeiros péssimos pais sequer são capazes de se dar conta de que o são.
Péssimos pais, é o que são. Ou, ao menos, é o que sentem que são. Porque trabalham demais, porque não conseguem almoçar ou jantar com os filhos, porque não estão disponíveis 100% do tempo para as necessidades deles. Mas a ciência garante que não é isso que faz um bom pai. Uma pesquisa divulgada há algum tempo pela Universidade de Toronto, no Canadá, ouviu mais de seis mil famílias e chegou à conclusão de que o que determina um crescimento saudável dos filhos não é a quantidade de tempo que eles passam com os pais, mas a qualidade desse tempo.
E, se não é preciso dedicar mais tempo a essa relação, o que é preciso? Dedicar mais atenção. Atenção plena, na verdade, o que agora é chamado “mindfullness”. Ou seja, você não precisa estar com as crianças todo o tempo, mas precisa estar com elas, de fato, sempre que estiver com elas. Nesses momentos, não pode haver celular, trabalho ou problemas externos que sejam mais importantes que a construção conjunta de um relacionamento forte e saudável. Conversas, risadas, brincadeiras, tudo faz parte dessa construção.
Pais ruins de verdade não são os que têm pouco tempo, são os que priorizam qualquer outra atividade, ainda que estejam fisicamente próximos de seus filhos. Aí é que mora o perigo, porque essa é a receita para que os pequenos se sintam preteridos e, muitas vezes, até desamparados. O resultado é irritação, hiperatividade e até mesmo sentimentos mais difíceis que esses: depressão, estresse, frustração e, muitas vezes, enfermidades físicas que não passam de somatizações de todas essas questões emocionais.
Principalmente na primeira infância, o que contribui para o desenvolvimento de seres humanos saudáveis e completos é o afeto. Olhos nos olhos, carinho, escuta ativa e a proposição de momentos exclusivamente separados para essas atividades são fundamentais para garantir também uma evolução cognitiva adequada para cada uma das idades.
Falar e ouvir previnem desentendimentos que são determinantes para as relações entre pais e filhos, principalmente na fase da adolescência, mas não apenas nesse período. Parece óbvio, mas é muito importante repetir. O diálogo é a base do amor. Manter aberto um canal de comunicação direto e claro facilita o exercício da empatia, de colocar-se no lugar do outro e poder lidar com as diferentes situações sem tantos julgamentos e conclusões prévias. Isso funciona para as duas vias dessa relação.
Se você quer criar pessoas capazes de compartilhar suas angústias e alegrias, comece dando o exemplo. Fale sobre seu dia, seus desafios, suas preocupações, respeitando sempre a linguagem e o conteúdo adequados para cada faixa etária. Ao mesmo tempo, pergunte sobre o dia das crianças, os sentimentos que elas vivenciam em suas rotinas e as novidades de seus universos em expansão.
Por fim, saiba estabelecer limites. Não vale a pena tentar compensar a falta de tempo com presentes caros ou liberdade irrestrita. É um ato de amor ensinar que o mundo, em boa parte das oportunidades, sabe dizer “não”. Por outro lado, liberte-se, você também. Saiba que não é possível – ou mesmo saudável – ser perfeito, e que errar é o que te faz parecer mais humano aos olhos dos seus filhos. Não se culpe, porque os verdadeiros péssimos pais sequer são capazes de se dar conta de que o são.
Anderson Leal é consultor pedagógico na Conquista Solução Educacional.
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