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Na minha visão, como empresário e CEO, a Inteligência Artificial não vai destruir o trabalho, mas sim a mediocridade. O problema não é o desemprego: é o espelho que ela devolve a quem parou de evoluir. A cada nova versão de uma ferramenta de IA, ressurge a histeria coletiva: “acabaram-se os empregos!”. É uma narrativa conveniente, afinal, o medo vende. Mas a IA não vai eliminar o trabalho humano; vai eliminar o trabalho indolente.
O tear mecânico não acabou com o tecelão, acabou com o tecelão que se recusava a aprender. O computador não extinguiu o contador, substituiu o que só sabia digitar números. Agora, a IA ameaça não o advogado, o jornalista ou o professor, mas sim os que repetem em vez de pensar.
Sim, muitos empregos desaparecerão, mas o trabalho continuará. O emprego seguro, previsível e rotineiro morreu. O que sobrevive é o que exige criatividade, empatia e estratégia. A IA não veio para desempregar. Veio para desmascarar
A revolução em curso não é o fim do emprego. É o fim da mediocridade confortável. Durante anos, a pauta corporativa foi humanizar o trabalho, e com razão. Mas, nesse processo, criamos uma cultura de acomodação institucionalizada. Gente que acredita que diploma é escudo contra a irrelevância. Empresas que confundem estabilidade com inércia.
A IA desmonta esse teatro. Ela não se cansa, não falta, não se ofende e, principalmente, não mente produtividade. A tecnologia devolve ao mercado um tipo de meritocracia que muitos gostariam de enterrar: aquela em que o resultado volta a valer mais do que o discurso.
Poucos percebem que a IA está criando uma nova classe trabalhadora: o humano aumentado. O programador que usa prompts para gerar código em segundos, o designer que cria dez campanhas em minutos, o gestor que analisa mercados com modelos preditivos, todos são exemplos dessa geração híbrida, meio homem, meio algoritmo.
Esses profissionais não são substituíveis; são exponenciais. Quanto mais dominam a tecnologia, mais escassos se tornam. Enquanto isso, há quem ainda discuta “se” a IA vai substituir o humano, quando a pergunta real é: qual humano ela vai substituir? O grande dilema não é o desemprego, é o desalinhamento de valor. Se antes tempo de trabalho equivalia a valor, agora o que importa é o impacto. Um analista que entrega em duas horas com IA vale mais do que dez que demoram o dia inteiro.
Mas muitos executivos e RHs ainda medem produtividade por presença, não por entrega. A IA chega impondo uma objetividade cruel e, talvez, justa às métricas de desempenho. O mercado não tem empatia por quem não entrega. A próxima revolução trabalhista não virá dos sindicatos, mas dos algoritmos de performance.
Outro setor condenado é o educacional. O modelo baseado em memorização e provas não sobrevive num mundo em que a IA faz isso melhor. O que se valoriza agora é interpretação, curadoria e criatividade. Um estudante que usa IA para formular perguntas inteligentes aprende mais do que aquele que copia respostas. Mas escolas e universidades ainda tratam isso como trapaça. Repetem o erro da indústria que ignorou o e-commerce e da imprensa que desprezou as redes sociais.
A IA não é o inimigo, é o novo idioma. E quem não aprender a falá-lo será o analfabeto funcional do século XXI. Há, sim, um custo social. A tecnologia amplia desigualdades porque acelera os extremos. Quem tem educação, curiosidade e acesso dispara; quem tem medo, resistência e discurso se afunda.
Governos não conseguirão regular essa revolução cognitiva. Podem tentar proibir, limitar, taxar, mas não podem desinventar a inteligência artificial. Não se trata de controlar, mas de compreender. A IA não é boa nem má: é um amplificador moral. Ela potencializa a inteligência de quem pensa e a estupidez de quem repete.
Eu não sou doido a ponto de achar que a IA é uma pessoa. Mas confesso: eu converso com ela. Quando estou no carro, em inglês, pergunto coisas, escuto respostas e treino o idioma. É meu exercício diário de curiosidade e, convenhamos, existe professor mais barato, paciente e sempre disponível para manter o inglês em dia? Essa convivência cotidiana mostra o que muitos ainda não perceberam: a IA não é uma ameaça, é um espelho da nossa disposição de aprender. A diferença entre medo e vantagem competitiva está em uma palavra: diálogo.
Sim, muitos empregos desaparecerão, mas o trabalho continuará. O emprego seguro, previsível e rotineiro morreu. O que sobrevive é o que exige criatividade, empatia e estratégia. A IA não veio para desempregar. Veio para desmascarar. E talvez essa seja sua maior contribuição: mostrar quem realmente cria valor e quem apenas preenche planilhas.
Fabio Ongaro, economista e empresário no Brasil, CEO da Energy Group e vice-presidente de finanças da Câmara Italiana do Comércio de São Paulo – Italcam.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos



