A reforma trabalhista, vigente desde 2017 sob a égide da Lei 13.467/17, trouxe consigo importantes alterações legislativas com o intuito de proporcionar maior liberdade aos empregadores e empregados para que pudessem negociar as condições do contrato de trabalho. Assim, modernizou o universo das relações trabalhistas no Brasil e aproximou-o das mudanças estruturais de um mercado com novas dinâmicas de prestação de serviços e colaboração entre profissionais e empresas, entre elas a chamada pejotização.
E, embora esse cenário não elimine, por exemplo, os méritos do vínculo empregatício – conquanto se comprovem os requisitos da não eventualidade, subordinação, onerosidade, pessoalidade e alteridade –, também é fato que as janelas de flexibilização abertas pela Lei 13.467/17 ampliaram os debates em torno da pauta da pejotização que ocorre, quando há algum indício de fraude em um contrato de prestação de serviço, na tentativa de mascarar, justamente, uma relação de subordinação empregatícia.
Isso ocorre porque, em alguns casos, há a abertura de um CNPJ por uma pessoa contratada como prestadora de serviços. Assim, a empresa fica isenta de cumprir os direitos trabalhistas e os custos associados à contratação de um empregado com registro nas condições impostas pela CLT. Deste modo, a Justiça do Trabalho vem analisando até o momento as ações que discutem a possível pejotização. No entanto, sempre houve dúvidas sobre qual órgão seria competente para julgar esses casos.
Tomando-se como base decisões recentes do STF (Supremo Tribunal Federal) e do STJ (Superior Tribunal de Justiça), é da Justiça comum a responsabilidade para analisar as suspeitas de fraude em contratos de prestação de serviço e, somente se comprovada a alegação, o caso deve ser remetido para a Justiça do Trabalho, de modo que seja reconhecido o vínculo empregatício e o trabalhador receba os direitos e indenizações que, eventualmente, lhe possam ser devidas.
Com esse entendimento, magistrados de diferentes tribunais do país têm direcionado casos relacionados à pejotização para a Justiça comum, orientando que, somente anulação de negócio jurídico e da comprovação do vício de consentimento, é que se pode encaminhar a ação para a vara trabalhista. Mas, em termos práticos, o que isso significa para as empresas?
Dentro de uma perspectiva inicial, há benefícios com essa mudança de orientação que altera consideravelmente o cenário trabalhista para as empresas. O primeiro deles envolve o fato de que, quando o debate surge a partir da Justiça do Trabalho, uma característica notória é o da presunção de fraude e nulidade do contrato de prestação de serviços – ou seja, na maioria dos casos, reconhece-se o vínculo empregatício.
Já na vara comum, a tendência, é o do reconhecimento da validade contratual, desde que se respeitem as normas da legislação Cível do país. Ato contínuo, outros ganhos dizem respeito a um reforço do reconhecimento proposto na reforma trabalhista da vontade entre as partes e de uma maior liberdade na negociação de contratos.
Mas há também pontos de atenção: o cenário pode gerar instabilidade e divergência nas conduções dos casos de pejotização entre os tribunais, posto que a Constituição Federal também estabelece, por exemplo, um amplo domínio da Justiça do Trabalho para julgar casos relacionados às relações trabalhistas no país.
E, da parte das empresas, as dúvidas poderão se ampliar, dentro de um ambiente de negociações já complexo, sobre de que modo proceder e que recursos poderão ser acionados em um processo ou ação. Esses pontos só reforçam, por sua vez, a necessidade de orientação jurídica especializada para que as empresas possam se resguardar de eventuais riscos e tomar decisões assertivas. Abre-se, inclusive, uma perspectiva para que novos capítulos dessa discussão avancem no futuro, refletindo o dinamismo de um universo de transformações nas relações de trabalho.
Aislane Vuono, advogada especialista em Planejamento Tributário e Fiscal, e sócia da Ferreira & Vuono Advogados.
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