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Imagem ilustrativa.| Foto: Brunno Covello/Arquivo Gazeta do Povo/Arquivo

Esta semana foi comemorado o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza (17/10), uma data que lembra sobre o desafio que persiste ao longo do tempo e ainda assola milhões de pessoas no Brasil e no mundo. Embora avanços tenham sido feitos ― como a redução da extrema pobreza no Brasil, que passou de 5,8% em 2021 para 3,5% em 2022, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em abril deste ano ― ainda enfrentamos um abismo profundo entre as oportunidades oferecidas a diferentes segmentos da população. 

No Brasil, a desigualdade social está profundamente enraizada e, muitas vezes, perpetua-se por gerações. Estudos recentes mostram que são necessárias, em média, nove gerações para que os mais pobres alcancem a classe média no país. Esse dado revela uma realidade preocupante: para milhões de brasileiros, a pobreza não é apenas uma fase, mas um legado. Neste contexto, é fundamental adotar ações concretas que promovam a mobilidade social como estratégia central para a erradicação da pobreza, garantindo que as gerações futuras não apenas sobrevivam, mas prosperem.

A mobilidade social não é apenas um objetivo social; é uma ferramenta poderosa para transformar a vida de milhões de pessoas

Promover mobilidade social significa criar condições para que indivíduos e famílias possam ascender economicamente, rompendo o ciclo de pobreza que frequentemente é transmitido de uma geração para outra. Isso envolve não apenas políticas de redistribuição de renda, mas ações concretas que ofereçam oportunidades reais de inclusão produtiva, educação de qualidade, saneamento básico e acesso ao mercado de trabalho formal. 

Um dos caminhos mais promissores para promover a mobilidade social ― e que a Fundação Grupo Volkswagen tem como estratégia de atuação ― é a inclusão produtiva. Essa abordagem busca formar pessoas para o mercado de trabalho, oferecendo condições dignas de emprego e incentivando o empreendedorismo. O processo começa com a elaboração de um plano de vida, segue com a qualificação profissional e culmina na inserção no mercado de trabalho formal. Além disso, o suporte contínuo é essencial, seja por meio de bolsas de estudo, acesso a microcrédito ou outras formas de apoio que reduzam as barreiras ao aprendizado e à inclusão efetiva.

A educação se apresenta como um dos pilares centrais para a promoção da mobilidade social. Segundo levantamento feito por Marcelo Neri, diretor da Fundação Getúlio Vargas Social e ex-ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, com base em dados do IBGE, o filho de alguém com diploma de ensino superior tem 78% de chances de também chegar ao ensino superior, enquanto o filho de uma pessoa com apenas três anos de escolaridade tem apenas 15% de chance. No entanto, a educação, por si só, não é suficiente. O mercado de trabalho precisa absorver esses indivíduos qualificados, criando oportunidades reais de ascensão. Sem emprego digno, a mobilidade social fica limitada, perpetuando a pobreza.

Outro aspecto essencial é o incentivo ao empreendedorismo, especialmente nas comunidades vulneráveis. Pequenos negócios têm o potencial de transformar realidades locais, gerando emprego e renda. Mas, para isso, esses empreendedores precisam de apoio para formalizar suas atividades e crescer de maneira sustentável. Isso inclui desde a qualificação empreendedora até o acesso a formas não tradicionais de financiamento como doação filantrópica, via capital semente ou microcrédito.

Além disso, as políticas públicas devem ser desenhadas para combater as desigualdades raciais e de gênero que afetam a mobilidade social. Grupos como negros e indígenas enfrentam barreiras adicionais que limitam suas oportunidades de ascensão. Ainda com base em dados do IBGE, a mobilidade social entre negros no Brasil é 5% menor em comparação aos brancos, enquanto mulheres têm 12% menos chances de mobilidade social em relação aos homens. Ações afirmativas, combinadas com a criação de ambientes inclusivos e a promoção da diversidade, são cruciais para superar essas barreiras.

O impacto das mudanças climáticas também não pode ser ignorado nessa discussão. Segundo estudo recente publicado na Nature, as previsões indicam que, nos próximos 26 anos, a renda global pode ser reduzida em até 19% devido aos efeitos da crise climática. Esse cenário afeta desproporcionalmente as populações mais pobres, que já sofrem com a falta de infraestrutura adequada e oportunidades econômicas. O custo da inércia frente à mudança climática pode chegar a 38 trilhões de dólares até 2050, superando os 6 trilhões de dólares necessários para cumprir o Acordo Climático de Paris. A mobilidade social, portanto, também deve ser abordada em um contexto de justiça climática, garantindo que as populações mais vulneráveis tenham resiliência para enfrentar os desafios ambientais e econômicos do futuro.

Para promover a mobilidade social de forma efetiva, é necessária uma ação coordenada de governos, setor privado e sociedade civil. Iniciativas como o Bolsa Família, por exemplo, que redistribuem renda e proporcionam segurança econômica a milhões de famílias, são fundamentais para oferecer condições mínimas de sobrevivência às famílias em situação de pobreza e extrema pobreza. No entanto, é essencial que essas ações sejam complementadas por investimentos em assistência social, educação básica e profissional, saúde, saneamento e infraestrutura básica, permitindo que as pessoas possam crescer e prosperar.

A mobilidade social não é apenas um objetivo social; é uma ferramenta poderosa para transformar a vida de milhões de pessoas e construir um Brasil mais inclusivo, sustentável e próspero para todos.

Vitor Hugo Neia, diretor-geral da Fundação Grupo Volkswagen e mestre em História Social pela Universidade de São Paulo.

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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