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A Europa vive uma escalada de tensões que ameaça transformar a guerra na Ucrânia em um conflito de dimensões ainda maiores. Na semana passada, três caças MiG-31K da Força Aérea Russa violaram o espaço aéreo da Estônia, integrante da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). A incursão durou cerca de 12 minutos, até que aeronaves F-35 italianas, destacadas para a missão de policiamento aéreo na região, foram acionadas e obrigaram os russos a recuar.
O episódio não é isolado. Dias antes, a Polônia registrou a entrada de 21 drones russos em seu território, o que levou à mobilização imediata de caças F-16 poloneses e de um F-35 holandês. Oficialmente, Moscou afirma que tais violações seriam erros de rota durante ataques contra a Ucrânia. Entretanto, governos europeus têm outra leitura: tratam-se de testes calculados para avaliar a capacidade de resposta da Otan em diferentes pontos de sua fronteira leste. A Romênia também já havia relatado incursões semelhantes, durante ofensivas russas próximas a Odessa.
O Ocidente precisa compreender que, diante da postura de Moscou, a dissuasão tradicional pode não ser suficiente. A guerra híbrida promovida por Putin, que combina agressões militares limitadas, ataques cibernéticos e pressão econômica, exige respostas coordenadas, firmes e rápidas
Mais um ataque por parte da Rússia à Otan, agora na Estônia, um país que, no passado, foi uma ex-colônia ou uma ex-área de influência da União Soviética, teve seus céus invadidos por jatos russos, e não drones. Foi necessário esperar alguns minutos até que caças italianos fossem acionados para repelir a invasão. Isso mostra que Vladimir Putin, na prática, está testando todas as capacidades de resposta da Otan no chamado Flanco Leste (Eastern Flank), onde a organização já anunciou que pretende aumentar seus investimentos.
Obviamente, trata-se de uma invasão a um território soberano e, portanto, de uma situação muito mais séria. Nas últimas semanas, Polônia, Romênia e, agora, Estônia tiveram seus céus violados. No caso da Estônia, a resposta da Otan levou aproximadamente 12 minutos. Do ponto de vista prático, a Rússia está verificando quanto tempo a Otan demora para dar respostas militares a possíveis ataques futuros.
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Esse cenário corrobora a avaliação da União Europeia de que, nos próximos cinco ou até oito anos, pode haver um conflito direto entre a Rússia e países da Otan, muitos deles também membros da União Europeia. Por outro lado, a UE deve ampliar as sanções econômicas contra Moscou, e essas ações podem ser vistas também como uma forma de pressão para impedir a adoção de novas medidas punitivas.
De forma prática, o episódio evidencia que as negociações lideradas pelos Estados Unidos, com o objetivo de encerrar o conflito na Ucrânia, não têm surtido efeito. Um ponto importante é que essas novas ameaças russas, uma clara violação de territórios soberanos que pode acionar o Artigo 4º ou até mesmo o Artigo 5º da Otan, também testarão a coesão da aliança militar. A questão é como os países europeus irão responder e, principalmente, qual será o posicionamento do presidente Donald Trump em relação a Vladimir Putin.
Durante sua recente visita ao Reino Unido, Trump afirmou estar desapontado com as posições do líder russo e demonstrou solidariedade aos britânicos no apoio à Ucrânia. Assim, o episódio representa não apenas um teste militar, mas também um desafio geopolítico de primeira ordem.
O Ocidente precisa compreender que, diante da postura de Moscou, a dissuasão tradicional pode não ser suficiente. A guerra híbrida promovida por Putin, que combina agressões militares limitadas, ataques cibernéticos e pressão econômica, exige respostas coordenadas, firmes e rápidas. Caso contrário, o risco de um conflito aberto no coração da Europa deixará de ser apenas uma previsão distante para se tornar uma realidade concreta.
Igor Lucena é economista, doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Lisboa e CEO da Amero.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos



