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Expedição Agricultura Familiar / Fazenda de Cafe em Tres Pontas dos Irmãos José Renato Borba, Marco de Oliveira Borba E Mauro de Oliveira Borba
Imagem ilustrativa.| Foto: Gazeta do Povo/Jonathan Campos

Curitiba é frequentemente celebrada como a “República de Curitiba”, um termo que evoca o ufanismo dos moradores da cidade e traduz um conjunto de lógicas culturais e políticas locais que caracterizam tanto seu povo quanto a cidade capital do estado do Paraná, refletindo sua organização urbana, inovação e qualidade de vida que atraem admiração nacional.

No entanto, enquanto a metrópole expõe seu brilho ao país, seguida por outras regiões em pleno desenvolvimento como o sudoeste e o norte paranaense, existe outra “república” dentro do próprio Paraná que permanece nas sombras do esquecimento: a República Caiuá. Situada no noroeste do estado, essa região enfrenta uma realidade contrastante, marcada pela falta de infraestrutura, investimento e atenção que tanto definem sua capital e outras regiões do estado.

É imperativo que os poderes estaduais redirecionem suas políticas e atenção para o arenito caiuá. A região precisa urgentemente de uma abordagem integrada que considere suas potencialidades

A República Caiuá localiza-se entre os rios Ivaí, Piquiri, Paraná e Paranapanema e é formada por mais de 100 municípios que foram fundados sobre o solo do arenito caiuá, representando 15% do território do Estado e que, diferentemente da terra roxa, solo predominante na próspera agricultura do estado, é árido, poroso e pouco fértil, estando sujeito a erosões. O termo arenito caiuá foi cunhado em referência a uma antiga tribo de povos originários que habitavam a região, os Guarani-Kaiowá, e a região foi a última fronteira colonizada no estado a partir da década de 40, na gestão de Moysés Lupion. As influências sociológicas também marcam um diferencial da região, constituída em sua origem em miscigenação por aventureiros, colonos, posseiros, povos indígenas, negros, imigrantes europeus, e trabalhadores paulistas e mineiros, representando uma diversidade cultural não encontrada nas regiões mais tradicionais do Paraná.

A região teve prosperidade com a plantação de café, mas sucumbiu às geadas, tendo sobrevivido pelo trabalho de seu povo, a exploração de monoculturas e agropecuária como cana, mandioca e gado, e um incipiente processo de agroindustrialização liderado por cooperativas e algumas empresas locais.

A República Caiuá, no noroeste do estado, é resultado de uma persistente negligência, ao longo do tempo, por parte das autoridades políticas do estado, que não refletem um pacto federativo, especialmente pelo contraste de investimentos feitos em outras regiões do estado em detrimento desta região.

O primeiro sinal disso é que é a única região do estado que não possui rodovias com pista dupla; aliás, trafegar entre o rio Ivaí e Guaíra é uma aventura tenebrosa entre pistas estreitas remendadas, pouco sinalizadas, com tráfego intenso de caminhões e inseguras, que muitas vidas levaram. Sim, há faz anos a promessa de duplicação, mas o fato é que até hoje nada foi feito e ali se trafega com medo, entre remendos, buracos e promessas.

Outro dado alarmante, inexplicavelmente, é a única região do Paraná que não possui uma universidade pública e gratuita. Existem precárias unidades de braços de instituições públicas, instituições privadas, mas sem acesso universal e gratuito. Apenas para traçar um paralelo, entre Cascavel e Foz, há duas instituições federais e uma estadual; na região do norte, três universidades públicas; na região central, duas instituições públicas; campos gerais, duas; e em Curitiba, a grande UFPR e o Instituto Tecnológico Federal, que tradicionalmente educam a elite econômica do estado. A universidade pública produz avanços científicos e sociais, traz desenvolvimento e progresso cultural e econômico, reduz desigualdades, mas a República Caiuá está condenada à ignorância e ao êxodo de seus jovens para estudar em outros centros.

Indicativo sintomático do abandono da região e falta de investimento em infraestrutura é que é a única região do estado que não possui pistas de pouso atendidas por linhas aéreas, tornando-se uma região de difícil acesso, o que afasta investimentos. Esse dado poderia ser ainda mais complexo se considerarmos, em números comparativos, o IDH, o acesso das pessoas ao saneamento básico e aos projetos de investimento em infraestrutura como retorno dos impostos pagos pela região.

Diante desse cenário, é de se questionar a efetividade dos representantes políticos que deveriam pensar estrategicamente a região e levar ao governo estadual e federal as suas reivindicações, mas o que se percebe é que a República do Caiuá serve apenas de curral eleitoral. Durante as campanhas, diversos candidatos fazem visitas, colhem votos, prometem benefícios e somem. Este ciclo vicioso, facilitado pela conivência de vereadores e prefeitos locais, ilude eleitores com promessas de desenvolvimento que raramente chegam. A falta de compromisso deixa os moradores presos em estado de esperança e abandono, enquanto políticos, desfrutam de sua lealdade temporária anunciando, por meio das “emendas”, entregas de ambulâncias, obras e outros cacarecos.

Existe ausência de um projeto de desenvolvimento para a região levando em conta suas peculiaridades regionais e sua vocação, um plano de infraestrutura e desenvolvimento econômico e social, um projeto agrícola. Iniciativas locais para fomentar o turismo têm sido adotadas; existem belezas naturais pouco exploradas, como a iniciativa solitária do “Geoparque Caiuá”, cujo sítio paleontológico é único no mundo, mas que esbarram na indiferença das autoridades.

Nesse contraste entre o Paraná desenvolvido representado pela pujante República de Curitiba e a esquecida República Caiuá, ao que parece, para as autoridades da capital, a região do arenito caiuá é constituída por cidadãos paranaenses de segunda classe.

É imperativo, portanto, que os poderes estaduais redirecionem suas políticas e atenção para o arenito caiuá. A região precisa urgentemente de uma abordagem integrada que considere suas potencialidades. A questão central permanece: até quando o arenito caiuá continuará a ser a parte esquecida do Paraná? O debate está aberto e a resposta a essa pergunta definirá não apenas o futuro da região, mas também o compromisso do estado com a equidade e a inclusão de todos os paranaenses.

Wagner Menezes, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, é paranaense, nascido na República Caiuá.

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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